Chapman parou o carro assim que saíram de New Shore. A chuva voltara a cair e, pelo retrovisor, Sophia via o farol da cidade erguendo-se solitário contra o céu cinzento. A praia estava vazia, exceto pelos pássaros que se amontoavam sob as rochas atrás de abrigo dos pingos gelados. Batiam suas asas e estalavam seus bicos para a tempestade e o mar agitado. Sophia pensou nas vezes em que caminhara naquela areia de mãos dadas com Pietra, debaixo do sol escaldante. Em certos dias, tiravam os calçados apenas para sentir os grãos fervendo contra as solas de seus pés. Uma tarde, enquanto catavam ostras ao longo do litoral, Pietra achou uma concha imensa, maior que a palma da mão de Sophia.
- Olha só isso – Pietra ergueu a concha que lembrava um cone pontiagudo e arroxeado. Levou-a à orelha e sorriu.
- O quê? – perguntou Sophia. Estavam ambas de pé na areia molhada, com as ondas do mar batendo em seus calcanhares.
- Dá para ouvir a voz do oceano – os olhos de Pietra brilhavam e ela pressionava a concha contra o ouvido. – Aqui, escuta.
Pietra aproximou a concha do ouvido de Sophia, que arregalou os olhos diante do som que saía dela. Era como se aquele cone pontudo tivesse engolido o mar. De seu estômago vinha o barulho de vento soprando, ondas batendo, e Sophia podia jurar ter escutado uma gaivota gritar. Afastou o rosto, assustada.
- Como ela faz isso? – perguntou Sophia.
Pietra deu de ombros, girando a concha nas mãos.
- Não sei. Ela só faz. Mamãe diz que os marinheiros usavam conchas para conversar com as pessoas que amavam. Eles passavam meses em alto-mar, com saudades de casa, e então sussurravam dentro de conchas como esta antes de jogá-las no oceano. E as ondas carregavam a mensagem até os entes queridos que eles tinham deixado para trás em terra.
- E isso funcionava?
Pietra envolveu a concha com ambas as mãos e sussurrou algo dentro dela. Depois, colocou-a outra vez no ouvido de Sophia. A garota franziu a testa. Tudo o que escutava era o bater das ondas e as rajadas de vento.
- Não escuto mensagem nenhuma.
E Pietra afastou a concha, tocando a orelha de Sophia com os lábios.
- Eu amo você – sussurrou.
Chapman fechou os dedos na mão de Sophia e a garota voltou do passado. Tinha os olhos marejados de lágrimas e enxugou-os nas mangas da jaqueta.
- Não se preocupe – disse Chapman. – Pietra vai ficar bem.
- Estamos demorando demais aqui. E se ela...
Calou-se. Viu um táxi parando atrás do carro, a porta traseira abrindo e Grimmes pulando para fora. Ele apertou o sobretudo em torno do corpo, pagou o motorista e caminhou até a janela de Chapman, dando um tapinha no vidro.
- Você demorou – disse Chapman, abrindo a janela.
- Da próxima vez, chefe, peça para outra pessoa arranjar armas para vocês – ele disse, enfiando a cabeça dentro do carro. Havia uma atadura branca no topo de seu crânio, grudada por montes de esparadrapos, o que lhe dava uma aparência um tanto ridícula. O rapaz olhou para o rosto cansado de Chapman, para sua mão envolvida em curativos e, depois, para a face esquerda e queimada de Sophia. Franziu a testa. – Meu Deus, onde vocês se meteram enquanto eu estive naquele hospital? Na guerra?
- Mais ou menos – disse Chapman.
- Trouxe as armas? – Sophia debruçou-se na direção dele.
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A Voz da Escuridão.
Paranormal[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de Fallpound, no interior dos Estados Unidos: o primeiro de uma série de assassinatos que assolou a região em 2009, cometida por uma seita satâ...