A primeira coisa que Chapman fez ao chegar à delegacia de New Shore naquela manhã de quarta-feira foi ligar para David Noble, que não era apenas o melhor desenhista da Seção de Retrato-Falado do FBI de Boston como também o melhor que Chapman já conhecera, com exceção de Sophia. O cara só podia ter memória fotográfica ou algo assim. Ele atendeu no segundo toque e foi logo dizendo:
- Fiquei sabendo o que aconteceu com Watson. Sinto muito.
Chapman foi até a máquina de café da recepção da delegacia, segurando o celular de encontro à orelha com o ombro.
- Obrigado, David. Como ficou sabendo disso tão rápido?
- As notícias voam, senhor. Grimmes nos informou, e todo mundo aqui está abalado.
- Então vou precisar que você entre nos eixos e largue tudo o que estiver fazendo. Tenho um trabalho para seu lápis.
- Se isso ajudar a pegar o filho da puta que matou Watson, pode contar comigo.
- Vai ajudar. Mais do que qualquer outra coisa, se quer saber – Chapman pegou seu café de máquina e sentou-se em uma cadeira estofada e velha, o copinho de plástico em suas mãos soltando fumaça e cheiro de cafeína em seu rosto. – Consegui gravar o depoimento de uma testemunha que viu o rosto do suspeito. Vou encaminhar o áudio para o seu e-mail.
- Tudo bem. Estou esperando.
Chapman desligou, bebeu o café com um só gole e perguntou à policial loira e rechonchuda da recepção se havia algum computador que ele pudesse usar. Ela olhou-o com um pouco de desconfiança, a boca crispada.
- Não posso deixar você usar os computadores daqui sem a autorização do chefe Cohen. E ele ainda não chegou.
- É importante.
A policial – Ronda, segundo o crachá – estudou-o por mais alguns instantes, então suspirou e pediu para Chapman segui-la. Levou-o até uma salinha que parecia ser usada para reuniões e ligou o Mac que repousava sobre uma mesa de vidro. Colocou a senha e indicou o assento para Chapman.
- Seja rápido – ela pediu antes de se retirar e deixar Chapman sozinho.
Ele conectou o celular ao Mac com o cabo USB, procurou pela gravação em áudio que fizera do testemunho de Jéssica Shepard e, assim que a encontrou, anexou-a no e-mail. No corpo, digitou: "Obrigado, David. Você está salvando a Pátria. Faça sua mágica". E então enviou.
Consultou o relógio e ficou surpreso ao ver que o dia sequer chegara às oito da manhã. Chapman tinha a sensação de estar acordado há séculos. Depois que Grimmes ligara para dar a notícia da morte de Watson, nem ele nem Sophia haviam pregado os olhos. Simplesmente sentaram-se no sofá do quarto de hotel, Sophia fumando e Chapman encarando o vazio, e esperaram o amanhecer sem trocar uma palavra, escutando o vento soprar contra as calhas e o morador de rua no estacionamento chacoalhar sua latinha de moedas. O silêncio fora quebrado apenas uma vez, quando Sophia levantara-se para ir até a janela e gritar:
- Se não parar com essa merda, vou enfiar essa lata tão fundo no seu rabo que você vai cagar moedas pelo resto da vida!
O morador de rua parara com o barulho.
Chapman suspirou fundo e recostou-se na cadeira da sala de reuniões da delegacia. Fechou os olhos e esfregou as pálpebras. Uma parte dele queria pegar mais um café da máquina; outra parte sentia-se cansada demais para ficar de pé, e foi essa que levou a melhor. Chapman apenas esperou os minutos passarem, mordendo as unhas e tamborilando com os dedos na mesa de vidro, até que o Mac emitiu um apito de notificação. O e-mail de Chapman, aberto na tela, dizia que ele tinha uma nova mensagem.
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A Voz da Escuridão.
Paranormal[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de Fallpound, no interior dos Estados Unidos: o primeiro de uma série de assassinatos que assolou a região em 2009, cometida por uma seita satâ...