Sophia Manning achava que nada, nunca, superaria a dor de cabeça que sentira depois de acordar de porre naquela manhã, ao lado de Melanie. Tinha se enganado: a agonia em seu crânio agora era dez vezes pior. Seu cérebro parecia inchar contra paredes revestidas de agulhas. A garota ficou deitada de costas na cama, sem saber direito onde estava ou o que acontecera, fitando o ventilador girar devagar no teto branco. Lembrava-se apenas de Grimmes saindo com ela nos braços da tenda, e então... Escuridão.
Com cuidado – achava que, se se movesse muito rápido, seus miolos iriam sair voando por suas orelhas – Sophia virou a cabeça no travesseiro para ver quem estava no quarto com ela. Esperava encontrar Chapman, mas quem viu foi Daniel. O garoto dormia na poltrona, os óculos empoleirados na ponta do nariz e com um livro no colo.
- Dani? – Sophia chamou. – Daniel?
Com um pulo, Daniel despertou: o livro caiu no chão e os óculos foram parar em seu colo.
- Quê? Quê? – ele olhou para Sophia. – Ah, ei!
Sem jeito, ele pegou o livro e arrumou os óculos. Sophia viu-se com um sorriso no rosto e teve que se controlar para não ler os pensamentos de Daniel naquele instante. Ela apoiou-se nos cotovelos e sentou na cama, sentindo uma pontada de dor bem na boca do estômago. Alguém a vestira com um agasalho do FBI.
- Aqui, eu te ajudo – Daniel levantou-se, mas Sophia fez um gesto com a mão para ele ficar onde estava.
- Estou bem – ela disse. – Mas aceito um copo d'água. Parece que o Saara decidiu tirar férias na minha boca.
- Claro.
Uma jarra d'água estava na mesinha que ficava perto da janela. Daniel encheu um copo e entregou-o para Sophia, que bebeu devagar, apesar da sede. Sentia o estômago machucado por causa do chá que a mulher de olhos rosa lhe dera e, se tomasse o líquido todo de uma vez, vomitaria de novo. Depois do que acontecera na tenda, ela nunca mais queria vomitar na vida.
Terminou de beber e sentiu a dor de cabeça diminuir. Ah, bem melhor assim.
- Obrigada – ela colocou o copo no chão, ao lado da cama. – O que aconteceu?
- Me diz você – Daniel respondeu. – Grimmes voltou com você nos braços, Sophia. Achei que você estava... – ele engoliu em seco. – Saímos correndo com você para o hospital.
- Me levaram para o hospital? – a simples ideia de pessoas cutucando-a com agulhas a fazia ter vontade de gritar. Já fora cutucada demais por agulhas em sua vida. Em sua infância.
- Não – Daniel sentou-se no pé da cama. – Você melhorou enquanto dirigíamos de volta a Fallpound. Quando chegamos à cidade, parecia só estar dormindo. Então a trouxemos de volta para o hotel. Watson tem experiência médica e cuidou de você. O que aconteceu na tribo?
Sophia balançou a cabeça.
- Não sei direito – e contou para ele. Quando terminou, Daniel encarava a noite pela janela, de testa franzida e um ar que o fazia parecer anos mais velho. Naquele instante, Sophia Manning viu o homem bonito e bondoso que ele se tornaria.
Claro: ela não tinha como saber que, em pouco mais de 24 horas, Daniel estaria morto. Clarividência não era um dos seus dons. Ainda não.
- O que foi? – ela perguntou.
- Você acredita nessa mulher? – ele perguntou. – Acredita mesmo que estamos enfrentando um demônio? Um... – Daniel estalou os dedos, procurando a palavra.
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A Voz da Escuridão.
Paranormal[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de Fallpound, no interior dos Estados Unidos: o primeiro de uma série de assassinatos que assolou a região em 2009, cometida por uma seita satâ...