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O estacionamento do Days Inn New Shore possuía aquelas lâmpadas acionadas por censor. Assim que Sophia parou em uma das vagas, a luz se acendeu sozinha no alto de um dos postes, e a garota piscou incomodada diante da súbita iluminação. Ela saiu do Sedan para a noite quente, mochila nos ombros e mãos enfiadas nos bolsos da jaqueta de couro, o cabelo imenso amarrado de qualquer jeito em um rabo de cavalo. Havia um morador de rua sentado ali na calçada, todo vestido de trapos e fumando um cigarro com cheiro de merda. Quando viu Sophia, o homem chacoalhou para ela uma latinha de moedas. Clank-clank-clank.

- Tem um trocado, passarinho? – perguntou.

A garota congelou. Foi como se seu coração decidisse bombear gelo ao em vez de sangue por suas veias, e ela virou-se na direção do morador de rua: à luz do poste, o rosto barbudo e coberto de crostas de sujeira do homem parecia pela metade, com um lado iluminado e o outro comido pelas sombras. Então a lâmpada se apagou e tudo ficou escuro.

- O que foi que você disse? – perguntou Sophia.

- Perguntei se você tem um trocadinho para me dar.

- Não, não isso. Do que você me chamou?

Mesmo na escuridão, Sophia conseguiu ver os dentes estragados e carcomidos do morador de rua quando ele abriu um sorriso obsceno.

- De gracinha – ele disse. – Você gosta de ser chamada de gracinha?

- Não, eu não gosto.

Deu as costas para ele e voltou a caminhar pelo estacionamento até a porta do hotel. Atrás dela, o morador de rua gritava:

- E meu trocado, putinha? Gosta de ser chamada assim? Vá para o inferno, sua putinha.

Sophia deixou-o se esguelhar. De qualquer modo, putinha era mil vezes melhor que passarinho.

***

Entrou no Days Inn, achando graça no pequeno sino que tocou acima de sua cabeça quando passou pela porta. Havia uma senhora atrás do balcão da recepção, com óculos de lentes quadradas equilibrados na ponta do nariz e um cabelo branco que se espalhava como uma nuvem. Sophia achou graça nisso também e, quando a velha desviou os olhos da revista de palavras cruzadas para fixá-los em Sophia, encontrou a garota dando-lhe o melhor sorriso simpático que tinha em seu repertório.

- Oi – disse Sophia, aproximando-se do balcão.

- Olá – a senhora ajeitou os óculos e, ainda assim, parecia não conseguir enxergar Sophia direito. Franziu tanto os olhos para a garota que eles praticamente desapareceram em seu rosto cheio de rugas. – Pois não?

- Meus amigos estão hospedados aqui. A senhora pode passar o número do quarto deles, por favor?

- Não posso fazer isso, mocinha – pelo visto, chamá-la por diminutivos tinha virado um consenso geral. – Mas posso ligar para o quarto e avisar que você chegou. Vou precisar dos nomes deles. E do seu também.

- O que a senhora vai fazer é me passar o número do quarto onde Bernard Chapman está hospedado.

Ideias eram como pregos. Bastava Sophia cravar a sugestão firme e forte o suficiente na mente de alguém para que a pessoa fizesse o que ela mandasse. E, geralmente, ela era muito boa com um martelo.

A Voz da Escuridão.Onde histórias criam vida. Descubra agora