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O que se seguiu no apartamento de Jéssica Shepard durou menos de três minutos.

A bala errou a cabeça de Bernard Chapman por pouco mais de um centímetro, passando tão rente ao seu ouvido esquerdo que ele escutou-a zunir e sentiu na bochecha o deslocamento quente de ar. Alguém gritou atrás dele – Grimmes ou Watson, não deu para saber – e então Chapman também começou a atirar.

Cerca de seis metros o separavam do homem vestido de negro – a distância do corredor que ligava o banheiro à sala, onde Chapman, Grimmes e Watson estavam – e Chapman tinha a mira livre de qualquer obstáculo. Conseguiu cravar duas balas no peito do assassino de Danny Straub e Ashley Morgan, as outras varando a porta do banheiro mais atrás, e Grimmes ou Watson – de novo, não deu para dizer qual – colocou-se ao lado de Chapman e também disparou. Três vezes, uma seguida da outra, a Glock soando ensurdecedora no corredor pequeno e apertado do apartamento – boom! BOOM! BOOM!

O homem com a máscara negra pareceu dançar enquanto era alvejado em cheio no peito: seus braços e pernas balançaram como os membros de um boneco velho de trapos, e as balas o atingiram com força suficiente para lançá-lo de costas para trás, de encontro à porta do banheiro. Aquilo teria sido o bastante para derrubar qualquer um, mas não a ele. Seus olhos de íris amarelas nunca deixaram o rosto de Chapman. Ele sequer piscou enquanto era atingido, e em momento algum deixou de atirar com sua calibre .45.

Chocou-se contra a porta do banheiro – Jéssica Shepard gritava lá dentro, embora Chapman sequer registrasse direito o som –, com os buracos de bala em seu peito soltando fiapos de fumaça. Depois meio que caiu para frente, capengou e, antes de atingir o chão, conseguiu colocar-se de pé e atirou outras duas vezes.

Uma bala atingiu a parede, produzindo uma nuvem de poeira e concreto que se misturou à fumaça de pólvora que tomava conta do corredor. A outra estilhaçou a lâmpada fluorescente no teto e fez chover vidro e faíscas no rosto de Chapman. Ele xingou e recuou um passo por puro reflexo, e foi quando seu calcanhar colidiu com algo. Chapman caiu para trás, balançando os braços, bateu no chão com um barulho pesado e sua nuca atingiu o piso. Uma bomba pareceu explodir dentro de seu crânio: por um instante desesperador, todos os seus pensamentos voaram para longe como pássaros diante da porta aberta de uma gaiola, e ele achou que fosse desabar na inconsciência.

- Chapman! – Grimmes, era a voz de Grimmes. Então quem gritara antes fora Watson.

Grimmes virou o rosto apenas um segundo para olhar Chapman no chão, mas isso bastou. O homem de máscara negra correu os seis metros do corredor em uma velocidade que pareceu a Chapman quase sobrenatural, impossível de ser atingida por uma pessoa normal – mas, àquela altura, Chapman já desconfiava de que o assassino não era humano. Não podia ser, não depois de ser baleado repetidamente no peito e continuar de pé. Caído em cima de Yuri Watson – fora nas pernas do amigo que Chapman tropeçara – Chapman apontou e gritou para Grimmes:

- Cuidado!

O garotou virou-se, mas o homem com a máscara negra já pulava em cima dele: por um momento, o assassino que se achava um artista pairou lá no alto, suspenso no ar cinzento de fumaça e que rescendia à pólvora, e Chapman pôde jurar que a sombra dele na parede cravada de balas do corredor possuía asas pontudas de demônio. Chapman chegou a disparar do chão contra aquela coisa não-humana, errou, e então o homem caiu sobre Grimmes.

Durante um instante, eles ficaram colados feito amantes, o homem da máscara negra abraçando Grimmes e o garoto lutando para se desvencilhar, ambos dando passinhos para frente e para trás como se ensaiassem dançar valsa no baile de formatura do colégio. Só que Grimmes não podia vencer: o homem da máscara negra era um tanque de guerra feito de músculos e com dois metros de altura, no mínimo. Chapman ficou de pé, a cabeça ainda zunindo como se abelhas tivessem feito uma colmeia dentro de seu crânio, e tentou mirar, mas o risco de atingir Grimmes por acidente era grande demais.

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