My Wild Heart Bleeds With Yours - VIII

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30 de junho

Diário de Kat

- Deixa eu adivinhar, seus pais a mandaram para cá? – Perguntei, com a voz quase abafada sob o som das máquinas.

Tatiana era uma garota calada. A mais calada que eu já vira em toda a minha vida. Nos primeiros dias eu achei que ela sequer sabia falar. "Ah, ótimo, dez anos inteiros de preparação perdidos." Foi o que pensei, antes que ela murmurasse um "Olá" envergonhado e voltasse ao trabalho com cuidado.

Aos poucos e por meio de uma observação descarada e sem escrúpulos, percebi exatamente como ela era: tímida, mas curiosa. Feita para observar tudo e todos à distância. Fora criada em um lugar onde era melhor para a sua segurança que não visse, não ouvisse e principalmente não falasse. Mas isso não quer dizer que não fosse sagaz. Isso era óbvio em seus olhos "Extremamente escuros. Do tipo que sugavam a luz de qualquer sala e atraíam a atenção só para eles.". Tudo que eu precisava fazer era quebrar a barreira que ela havia criado ao redor de si, aos poucos.

Os documentos que o detetive conseguira tinha as seguintes informações: nome: Tatiana Matrikov, data de nascimento: 31/10/1938, local de nascimento: São Petersburgo e nome da mãe: Elizaveta Matrikov - O nome do pai não constava nos registros. Junto com isso vinha uma ficha com as informações do trabalho dela: ter só 14 anos não a impediu de ter que ajudar em uma fábrica de vestimentas (não necessariamente roupas) aqui mesmo, em São Petersburgo.

Por isso eu dei um jeito de ir parar na fábrica. Trouxe Anika, as gêmeas e Naomi comigo, como se fossemos irmãs. Sabia que eu correspondia ao tipo de garota que eles queriam que trabalhasse na fábrica e bastou que eu dissesse que queria ajudar em casa para que eles arrumassem trabalho para mim. Dei um jeito de ficar próxima a Tatiana, que desde o primeiro dia transmitia uma espécie de aura que envolvia o lugar, chamando atenção mesmo quando tentava não fazer isso.

- Eu vim porque quis. – Ela respondeu, claramente mentindo. – Assim como você. – Insinuou como uma professora dando uma bronca.

Revirei os olhos.

- Eu quis dizer que você veio para ajudar sua casa. Como todas as garotas aqui. Bem, a maioria delas.

Eu vi suas sobrancelhas se franzirem por um momento, pensando no que eu disse, mas logo depois desistiu do que pensava. Ela parece ser o tipo de garota que cumpre ordens com convicção e sem questionamentos – uma qualidade que parece ter aprimorado de Ellie.

- Sim. – Ela respondeu com calma - Vim ajudar em casa.

- Quantos irmãos você tem?

Ela olhou bem para mim. Eu podia ver as engrenagens de seu cérebro tentando descobrir porque diabos eu estava fazendo perguntas. Esse mundo onde responder perguntas era perigoso me deixava cansada.

- Eu só queria conhecer você melhor. – Disse suspirando e voltando ao trabalho. - Não precisa responder se não quiser.

Por um instante, ela não voltou a usar sua máquina de costura para terminar o vestido que fazia. Senti o olhar dela em mim e precisei conter o sorriso que mostrava que eu estava satisfeita por causar fascinação.

- Não tenho irmãos. – Ela respondeu, antes de voltar ao trabalho. Notei que dessa vez ela queria que o som da máquina ocultasse sua voz. – Em casa somos só eu e a minha mãe.

Balancei a cabeça, mostrando que havia entendido, mas sem tirar os olhos do trabalho.

Depois disso, ela começou a confiar em mim.

13 de julho

Diário de Kat

Começando do fim de forma a dar um nó na cabeça de qualquer um: Tatiana é uma vampira agora.

Depois que o gelo quebrou as coisas nunca mais voltaram a ser as mesmas. Não fiz mais perguntas pessoais para ela e nós começamos a conversar sobre livros, música, arte e discutir nossos gostos. Ela me fez uma ou duas perguntas sobre mim, especialmente sobre minha origem, mas eu não quis responder e ela não insistiu. Depois brincamos de adivinhar as verdades uma sobre a outra, mas ela não conseguiu acertar nada sobre mim. Aos poucos, acredito, fui cativando-a, apesar de não ter certeza, já que ela não mantinha um diário como as outras.

O processo que levou a sua morte começou aos pouquinhos. Uma vez ela me disse sem querer sua opinião sobre o governo, mas desconversou assim que eu insisti na história. De outra vez ela me disse que sua mãe detestava ter que viver naquelas condições, justo ela que poderia ser uma condessa, não fosse aquela maldita revolução. Fiquei sabendo depois sobre o gênio de sua mãe e o quanto ela lutaria para conseguir o que queria.

Acordei na manhã de ontem com a notícia de que a casa de Tatiana havia sido invadida e que todos que moravam ali – Tatiana, sua mãe e alguns inquilinos, no andar de cima – haviam sido assassinados. A notícia estava correndo na rua, mesmo que ninguém falasse sobre abertamente, por medo. Na forma de gato, eu fui correndo até a casa dela, torcendo para que desse tempo de fazer alguma coisa.

Encontrei seu corpo sozinho na sala. Ela ainda respirava, mas estava desacordada e perdera tanto sangue que seria uma questão de tempo até ir embora de uma vez por todas. Me transformei para a forma normal outra vez e cortando meu pulso, forcei um pouco de sangue entre os lábios dela. Com um suspiro vi seu corpo aceitando o sangue e me dei conta de que havia muito tempo que eu não trocava sangue com ninguém.

Saí da casa com cuidado e fui até a minha me trocar. Depois voltaria para a casa de Tatiana e esperaria que acordasse. Enquanto esperava, me perguntava como explicaria para as meninas o que tinha acontecido, e se havia alguma forma de elas aceitarem aquilo. Eu havia jurado que nunca transformaria alguém que não tivesse escolhido ser vampira, o que não era o caso de Tatiana. Foi um ato desesperado, porque eu não podia perdê-la, principalmente não para algo tão sem sentido quanto um governo autoritário. Eu precisei transformá-la, para salvar uma peça importante do meu Exército.

Quando ouvi os sons na casa de Tatiana, entrei com cuidado. Encontrei-a de pé, atenta, mas meio atordoada. Expliquei de forma animada o que ela precisava entender. Falar demais, de jeito nervoso sempre faz com que o ouvinte relaxe e se torne protetor a meu respeito. Tatiana não surpreendeu nesse aspecto, tentou me acalmar e quando conseguiu, ouviu e acatou cada uma das coisas que eu disse. Quando chegamos até a frente de minha casa, eu estava explicando a ela sobre o Exército. Sophie abriu a porta antes que eu pudesse fazer isso.

- Você tem muito a explicar. – Ela disse com os braços cruzados. – Especialmente a Ellie.

- Sophie, Tatiana. Tatiana, Sophie. – Apresentei as duas com um suspiro, entrando em casa.

Antes de entrar, vi os olhos de Sophie crescerem e sua voz sussurrando:

- Nossa! Você realmente é parente dos dois.

Lá dentro fui recebida por uma comitiva. Até Pierre esperava fora de seu quarto, ansioso para receber sua bisneta.

- Ellie, eu... – Comecei, antes que Tatiana entrasse.

- Calada. – Ela interrompeu. Seus olhos faiscaram por um momento e eu me perguntei que diabos ela estava pensando. – Deixe-me vê-la.

Sophie abriu espaço com cuidado e Tatiana entrou junto com ela. Todos os olhos da sala se viraram dela para Ellie e de repente, todas nós prendemos a respiração. Com passos suaves Ellie andou até ela e os olhos de Tatiana reconheceram a antepassada. As duas pareciam estar frente a um espelho. Ellie então me surpreendeu com um gesto: sorriu.

- Acho que devemos começar com a escolha de uma pedra preciosa. – Ela disse, para todas nós. Então se virou outra vez para Tatiana. - Qual sua cor preferida? 

As Crônicas de Kat - A História CompletaOnde histórias criam vida. Descubra agora