A verdade

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* Ps: a foto representa a cor dos olhos do Felipe

"Nem todos os dias são bons, mas há algo bom em cada dia"

Maju on 

  Era incrivel a velocidade com que as coisas mudavam, em que os fatos eram deixados pra trás e substituídos por outros, e era inacreditável como o trem da minha vida mudava de direção minuto após minuto, eu nunca fui de ter muitas certezas, sempre joguei no escuro, trabalhando com mil e uma possibilidades, eu era a garota insegura que nunca soube o que realmente era real, até conhecer Felipe... Porque com ele tudo era verdadeiro, o sentimento, o toque, o medo tudo era intensamente real, não havia espaço pra mentiras, pra incertezas e insegurança, não era possivel viver no escuro quando o sol batia em sua porta... E com ele eu sempre sentia tudo da forma mais real, o nosso primeiro beijo, a primeira vez que dissemos que nos amávamos, tudo com ele foi intenso, e então sem ser diferente a dor de tê-lo perdido também era intensamente real, as pessoas costumam se questionar até que ponto é possivel aguentar uma dor, os seres humanos se dão limites, mas nada nunca foi tão real como o que senti quando achei que o tivesse perdido, era como se eu assistisse meu coração sendo arrancado de mim e sendo esmagado logo em seguida, mas então do nada o trem desgovernado mudou de destino, e agora eu encarava um par de olhos azuis confusos sentado no imenso sofá branco da minha sala, seus olhos vagavam sem direção nunca pousando em algo por mais de alguns segundos, seu rosto estava perdido e ele estava exposto, poucas vezes Felipe deixava seu lado fraco a mostra, mas a expressão em seu rosto e o cansaço em seus olhos entregavam o quão frágil ele estava. Eu queria sentar ao seu lado, queria sentir o conforto do seu toque, sentir sua pele quente na minha, mas eu não fiz, ao invés disso eu sentei ao lado da unica pessoa que eu sabia que iria me proteger, que iria enfrentar isso comigo.
 Os olhos castanhos esverdeados de Vitor pousaram em  mim assim que eu me aproximei, um sorriso fraco brilhou em seus lábios enquanto ele se movia pra me dar espaço, sorrio pra ele e então me sento ao seu lado, seus braços me envolvem em um abraço e eu aproveito pra deitar minha cabeça em seu ombro, eu não sabia o que nos aguardava essa noite, mas Vitor estaria ali comigo.
__Você está bem?__Sua voz soa baixa como um sussurro, mas mesmo assim eu consigo sentir a preocupação nela. Apenas concordo com a  cabeça, mas a verdade era que eu não fazia a mínima ideia de como eu estava. Seus olhos esverdeados estudaram os meus, e então eu pude ver que ele sabia a verdade. Sem saber o que dizer ou fazer desvio meus olhos dos dele, e os deposito na imagem perfeita de Felipe, ele esta nos analisando, seus olhos grudados em nós, seu rosto esta ilegível, mas um pequeno sorriso brilha em seus lábios quando Vitor afaga meu cabelo. Os olhos de Felipe continuavam presos em mim,  como a lua estava presa a noite, seus olhos nunca desgrudaram dos meus, nem mesmo quando seus pais sentaram ao seu lado. Sua mãe segurava sua mão como se tentasse protege-lo, ou talvez ela só tivesse com medo de perde-lo novamente.
__Belo apartamento ursinha.__ A voz arrastada do meu pai era incrivelmente aconchegante, olho pra ele parado ao  lado da minha mãe, seus braços entorno da cintura dela, ambos olhando o local.
__Obrigada.__ Digo com um sorriso__ Fizemos o nosso melhor.
__Eu sei que sim.__ Meu pai diz caminhando até a poltrona aconchegante que ficava do outro lado da sala. Seus olhos vagam de mim pra Felipe. Ele coça a nuca e então com um suspiro longo e profundo ele olha pra mim novamente.__ Eu acho que vocês querem uma explicação.
 Mas uma vez naquela noite eu não fazia ideia do que tinha que ser dito, eu estava sem palavras, e eu odiava me sentir assim, sinto o abraço de Vitor se afrouxar e olho em sua direção, ele  me lança um breve sorriso e então responde meu pai, seus  olhos viajando pra imagem do seu melhor amigo sentado na sua frente. Os olhos de Felipe encontram os de Vitor, a profundeza azul brilha em uma mistura completa de confusão e euforia.
__Eu sei que vocês devem estar achando que isso tudo é loucura, ou um sonho, mas não é, isso é real, esse cara sentado aqui na frente de vocês é real.__ Meu pai aponta pra Felipe, e então todos nós olhamos em sua direção.__Pode parecer loucura, como alguém que vocês juraram estar morto, alguém que vocês enterraram há exatos dois anos atrás, pode parecer vivo assim do nada, eu sei que pode ser dificil compreender tudo isso, foi pra mim também, mas Felipe esta vivo.__Os olhos do meu pai pousam em mim, meu coração acelera quando ouço suas palavras, meus olhos focam nos dele, isso não era possivel, não podia ser, pessoas não voltam da morte, mas Deus eu queria tanto que isso fosse verdade, meu pai sorri de lado pra mim, antes de continuar.__ Bom eu e a Cris estamos fazendo trabalhos voluntários em vilarejos que não tem condições, é um trabalho extremamente revigorante, poder ajudar pessoas que nunca tiveram contato com a cidade grande, e nem com os recursos que estamos acostumados a trabalhar.__ Os olhos dele brilham de empolgação, me fazendo sorrir, meu pai era apaixonado pela ideia de fazer diferente de poder ajudar a todos.__ É um trabalho puxado porém, as pessoas de lá não são acostumados com o nosso pessoal, e isso requer muita paciência, foi em uma dessas manhãs, enquanto sua mãe e eu cuidávamos de uma criança que havia sido picada por uma cobra que o impossivel aconteceu.__ Meu pai olha pra Felipe que o encarrava serio.__No começo eu achei que estava sonhando, aquilo não podia ser possivel, Felipe estava morto, todos sabíamos disso, mas então porque ele estava parado ali na nossa frente. Tudo ficou mais irreal e confuso quando descobrimos a historia do garoto do vilarejo. Após conversarmos com uma senhora de lá, descobrimos que Felipe havia chegado no vilarejo na madrugada em que tudo aconteceu, ele estava incrivelmente ferido, segundo ela ele parecia um anjo destruído, ninguém sabia quem era aquele garoto o que havia acontecido e muito menos se ele iria sobreviver, então eles cuidaram dele dia após dia, no começo eles não tinham esperança, Felipe havia perdido muito sangue, tinha muitos ferimentos, e estava em coma.__ Meus olhos viajam pra direção do meu pai quando escuto o que ele acabou de dizer, em coma? Felipe estava em coma?__Na verdade eles só estavam esperando o dia em que ele fosse cansar de lutar, o dia em que ele estivesse completamente esgotado e sem forças pra continuar respirando, enquanto isso eles iam cuidando dele e dos seus ferimentos, Felipe havia fraturado os dois braços e a perna no acidente, havia cortes profundos espalhados por todo o corpo, mas a pequena civilização daquele vilarejo não desistiu dele, mesmo achando que ele iria morrer, eles o curaram, Felipe ficou em coma por quase dois anos.
__Bem depois que descobrimos a verdade sobre o garoto do vilarejo, seu pai e eu corremos atrás da verdade, pedimos uma reavaliação do laudo que comprovava que o cara que enterramos era mesmo Felipe, enquanto o laudo era refeito, nos aproximamos de Felipe, viramos seus amigos primeiro, e a cada dia que passávamos com ele descobríamos mas semelhanças com o antigo Felipe, a verdade veio há uma semana atrás quando um exame de DNA comprovou que o garoto do vilarejo era mesmo Felipe e que o cara enterrado naquela manhã, não era ele.__ Minha mãe para de falar e olha pra nossa direção, os braços de Vitor estão presos em mim novamente, nossos olhos estão focados no azul dos olhos dele, ele nos encara com a mesma intensidade que olhamos pra ele.
__ Depois de descobrirmos a verdade, levamos os pais de Felipe até o vilarejo, e bom aqui estamos nós.__Meu pai para de falar, seus olhos focam em mim, esperando até que os meus foquem nos dele.__ O garoto sentado aqui na frente de vocês, é Felipe, o cara por quem vocês sofreram durante todo esse tempo esta vivo, não é um sonho Maju, Felipe o seu Felipe esta vivo.
 Meus olhos viajam pra direção daqueles olhos azuis brilhantes, minha visão esta borrada com lagrimas não caídas, os olhos de Felipe se prendem nos meus, eles estão calmos agora, aquele oceano azul escuro me puxa pra dentro dele. Então era verdade Felipe estava mesmo vivo, eu não havia perdido o amor da minha vida pra sempre, o cara por quem eu chorei, por quem eu me desfiz durante esses dois anos estava agora sentado na minha frente me encarrando de volta como se eu fosse algo intocável, Maria Julia ainda tinha seu Felipe Mendez, ele não havia me abandonado. Meus olhos continuam presos nos dele, quando minha mãe volta a falar.
__ O acidente que vocês sofreram aquela noite foi horrível Maju, Felipe foi o mais afetado, e é um milagre que ele esteja aqui agora, pra ser sincero não sabemos explicar como ele conseguiu sobreviver sem ajuda de profissionais  e de toda a tecnologia, porém ele sobreviveu.__ Ela sorri e olha pra mim meus olhos estão focados nos dela agora.__ Mas tem uma coisa que vocês precisam saber. Felipe não sabe quem vocês são.__ E então mais uma vez o meu ar estava sendo roubado de mim novamente, as batidas do meu coração vão se acalmando até que ficam inaudíveis, o aperto de Vitor é a unica coisa que me mantém presa aqui, olho pra Felipe que me encara sem saber o que fazer.__ Felipe teve sequelas graves, ter ficado dois anos em um vilarejo não ajudou, vocês sabem quem ele é, mas ele não sabe, Felipe não se lembra de nada, ele não sabe quem ele foi, quem vocês foram, e sinceramente não podemos afirmar que um dia ele ira se lembrar.
 Minha cabeça latejava, enquanto meu coração batia acelerado, meus olhos estavam presos naquele par de olhos azuis que me encaravam cheios de sentimentos, lagrimas corriam pelo meu rosto e alguns fios rebeldes do meu cabelo haviam escapado do coque que eu havia feito mais cedo, eu respirava com dificuldade, enquanto aquela imensidão azul me estudava. Quão irônico isso tinha que ser, quantas surpresas essa noite guardava. Quão destinados a sofrer Felipe e eu estávamos? Eu sentia como se meu mundo estivesse desabando ao meu redor, e não tivesse como sobreviver a isso. Sem pensar duas vezes me desvencilho do abraço de Vitor e me levanto, eu precisava de ar, precisava respirar e lidar com o fato de que Felipe não fazia ideia de quem era Maria Julia, eu precisava lidar com tudo isso longe de todos, e principalmente longe daqueles olhos azuis.
__Eu cuido disso.__ Mesmo distante consigo escutar a voz rouca de Vitor, ele estava vindo atrás de mim, ele sempre iria vir.
 Vitor on
 Felipe estava vivo...  Meu irmão estava vivo, isso não podia ser real, ele estava morto, eu havia enterrado ele, havia perdido meu melhor amigo naquela noite, mas então eu sabia que não era verdade, eu soube disso quando ele apareceu do nada, soube disso no exato momento que me virei e  encontrei aquele par de olhos azuis, só uma pessoa tinha esses olhos, só uma pessoa havia herdado aqueles olhos dos anjos, tinha que ser Felipe. Ele porém não lembrava quem eramos, Felipe não fazia ideia de quem eram aquelas pessoas.
  Maju estava escondida na sacada, seu pequeno corpo tremia conforme o vento atingia, seu cabelo estava bagunçado, ela abraçava suas pernas com forças enquanto soluços escapavam da sua garganta, fico de pé olhando pra ela, olhando pra menina do sorriso facil, a menina que eu sempre iria amar, durante esses dois anos Maju tinha se tornado a pessoa mais importante pra mim, eu havia segurado seu mundo incontáveis vezes, havia me tornado o seu heroi, os braços que a seguravam quando ela caia, eu iria protege-la pra sempre. E eu estava pronto pra segurar seu mundo pela segunda vez essa noite.
__Achei você.__ Digo quando atravesso a porta de vidro, o vento frio me atinge com força me dando boas vindas, mas nem mesmo a madrugada fria em Nova York, me congelou mais do que aqueles olhos perdidos e fundos dela, meu pequeno anjo loiro estava encolhida, os olhos manchados com lagrimas teimosas, sinto meu coração errar as batidas antes de eu correr pra abraça-la, seus pequenos braços envolvem meu corpo com força, como se eu fosse sua ancora.__ Eu estou aqui, estou aqui com você Maju.
Ela não diz nada apenas chora, seus soluços são a  única companhia que o vento tem. Essa noite estava sendo cruel com ela, primeiro as lembranças que a atacaram com força, eu soube assim que Brandon me ligou perguntando se Maju estava em casa que havia algo de errado, soube assim que encontrei ela no deck que ela estava presa ao passado, mas nem mesmo a dor que ela enfrentou ali, a fez se desfazer mais do que agora, eu estava segurando os pedaços dela e não sabia como iria fazer pra conserta-la.
__Ele não sabe quem eu sou.__ Ela diz sua voz abafada enquanto ela esconde seu rosto em meu peito. Eu sabia o quanto aquilo doía, Felipe estava de volta as nossas vidas, mas não totalmente, ele não sabia quem eramos, não sabia quem ele era.
__Eu sei.__ Digo afagando seu cabelo, enquanto lutava pra esconder a dor que aquilo causava em mim. O modo como ela me olhou entregava que ela havia escutado a minha dor porém, seus olhos azuis pousaram no meu, e um sorriso triste surgiu em seus lábios.
__ Eu sinto muito.__ Ela diz com a voz doce e delicada.
__Eu sei...__ Digo olhando as milhares de luzes de Nova York enquanto a verdade daquela noite ia caindo sobre nós.__ Eu sinto muito também.
  Sem dizer mais nada Maju deposita sua cabeça no meu ombro, seus olhos se perdem na selva de pedras, enquanto o vento frio nos trazia a verdade, a verdade que mesmo que Felipe estivesse vivo, mesmo que ele estivesse de volta as nossas vidas, Maria Julia e Vitor Menezes eram apenas dois desconhecidos em seu mundo, assim como todas as outras pessoas, Felipe não se lembrava das tardes nos parques, do encontro no mercado, das conversas, dos jogos de futebol, ele não se lembrava de nada. Olho pro anjo loiro ao meu lado, seu choro havia se acalmado agora, ela mantinha sua cabeça em meu ombro e apertava meu braço com força.
__Promete que você nunca vai me abandonar.__ Seus olhos azuis estão presos em mim.__ Promete pra mim Vitor que nunca, nunca vai sair do meu lado, que você sempre vai estar comigo. Jura que você nunca vai me esquecer.
__Ei eu nunca faria isso, nunca irei abandonar você, não importa o que aconteça, você sempre poderá contar comigo.__ Estendo minha mão esquerda pra ela.__ Maria Julia Albuquerque eu te prometo de dedinho que eu nunca vou esquecer ou abandonar você.
 Ela olha pra minha mão antes de olhar pra mim, os olhos brilhando, e um sorriso pequeno em seus lábios.
__Isso é uma promessa de dedinho.__ Ela diz e concordo com a cabeça, com um sorriso de criança ela sela seu dedinho no meu.__ Eu prometo que nunca vou esquecer ou abandonar você.
__Temos uma promessa de mindinho, e promessas de mindinho nunca podem ser quebradas, em hipótese alguma.
 Um sorriso genuíno brilha em seus lábios seus olhos brilhando e meu coração se aquece com a imagem dela assim, pela primeira vez naquela noite eu soube que minha irmãzinha estaria a salvo, ela só precisava de ajuda, seu sorriso some um pouco quando seus olhos focam algo atrás de mim, olho confuso pra ela procurando respostas, tentando atrair sua atenção mas seus olhos estão presos a algo, então, desisto de tentar entender e apenas olho pra trás. Felipe estava parado a alguns centímetros, as mão enfiadas nos bolsos de sua calça, seus olhos presos em nós, o cabelo voando. Seus olhos estavam confusos, ele olha pra baixo e meus olhos são atraídos para o cordão que ele estava usando, o metal brilha em contato com a luz, balançando de um lado pro outro conforme o vento o atingia. Seus olhos se encontram com os nossos novamente.
__ Você está bem?__ A voz rouca estava insegura, seus olhos presos em Maju, ele brincava com os seus fios de cabelo, sorrio pra semelhança que aquilo tinha, Felipe estava igualmente nervoso como quando no dia que ele foi pedi-la em namoro.
__Sim.__ Maju diz confusa, um sorriso de leve surge em seus lábios, e meus olhos vagam pra ver meu pequeno irmão, os olhos dele se aquecem como sempre fazem quando ela sorri, ele mantém o olhar deles, e então um sorriso genuíno brilha em seu rosto, um sorriso que tanto eu quanto Maju conhecíamos muito bem, aquele sorriso era o sorriso que ele só dava pra ela.
__Suas amigas disseram que eu iria encontrar vocês aqui.__ Ele diz e então seus olhos pousam no colar que balançava em meu peito, uma expressão confusa toma conta de seu rosto, seus olhos viajando pro colar que ele carregava consigo, quando ele leva seus olhos de volta pra gente eles estão perdidos e confusos.Sinto o aperto de Maju ficar mais forte em meu braço, olho pra ela e tento sorrir, quando volto a olhar pra Felipe ele esta sentado na nossa frente, seu rosto esta calmo e a imensidão azul como Maju chamava estava serena agora.
__ Eu sinto muito por não lembrar de vocês.__ Sua voz soa arrependida.__ Eu nem sei quem eu sou, mas eu sei que quem quer que tenha sido o Felipe Mendez que vocês dois conheceram, ele foi um cara de sorte.__ Ele brinca com as suas mãos e mantem seus olhos presos a elas quando volta a falar.__ Eu tento me lembrar das coisas, me lembrar de quem eu fui, de quem vocês são, mas tudo é tão vago, é como uma imensa escuridão aqui dentro. Minha mãe disse que se eu visse vocês, que se eu conhecesse vocês talvez tudo isso mudasse.__ Ele olha pra gente novamente prendendo seu olhar no de Maju__ Eu sei que vocês me conhecem, acho que conheço vocês também, tem alguma coisa em vocês que me faz pensar que são importantes para aquele velho Felipe, eu espero de verdade que algum dia eu consiga descobrir o que é.


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