Sensação morna

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Kei disparou pelas escadas de emergência, desceu sem descansar por mais de cinco andares, contou-os. A cada andar descido a fumaça subia mais e já não era mais uma leve camada no ar.

O teto alto estava repleto de fumaça escura, Kei descia as escadas ofegante pelo esforço de manter o corpo machucado de pé e por saltar tantos degraus de uma vez. Tropeçou e por pouco não caiu, mas seu tornozelo fez um ângulo estranho por um segundo. Grunhiu de dor e voltou a descer as escadas somente focando no que havia na frente.

Desceu mais cinco andares, a fumaça agora mais densa tornava impossível ver o que estava na sua frente, as tosses começavam a surgir. A falta de luz dificultava tudo, a Comissão não deixaria os disjuntores do prédio ligado, Kei pegou o celular desbloqueado e acendeu a lanterna para continuar correndo.

Desceu mais três andares e mesmo agachado suas tosses intensificaram, a fumaça queria entrar na sua alma preenchendo casa poro do corpo. Kei corria o que podia inclinado para não respirar a fumaça, porém quanto mais rápido, mais difícil ficava respirar. Dessa vez, quando tropeçou não conseguiu se firmar e rolou degraus a baixo batendo partes do corpo que nem imaginou que poderia bater.

Parou de rolar em uma plataforma que indicava o andar presente, se pôs de pé com a lanterna do celular em mãos e continuou descendo, mas alguma coisa estava errada com o lado esquerdo do tronco. Desceu mais seis andares. Deveria estar no 20º ou próximo. Talvez houvesse esperança.

Não houve.

As escadas do 21º andar estavam bloqueadas em chamas, Kei quase foi lambido pelas labaredas. Filhos da puta .Abriu a porta de emergência do 21º e viu que ele estava repleto de fumaça preta ao invés de fogo, mas ainda era possível enxergar o local, tapou o nariz e a boca com a mão livre e entrou.

Encontrou as escadas sociais para o próximo andar, elas também estavam em chamas que lambiam o teto, mas não mais que um metro, o resto ainda incólume.

Deve ter um banheiro por aqui.

Com sua experiência em prédios comerciais, foi fácil encontrar o banheiro. Kei correu para uma das pias, rodou o registro e ficou exultante ao ver o cano cuspindo forte a corrente de água.

Isso quer dizer que a estrutura do prédio ainda não foi comprometida, pensou ávido por viver.

Abriu o registro de todas as pias, tirou o casaco e a blusa encharcando-os. Enfiou a cabeça embaixo da corrente e sentiu o breve alívio da gasolina sendo levada embora, juntou as mãos em concha jogando a água no peito e nas costas que sentiram esse breve alívio, desse mesmo modo fez o possível contra o tempo para molhar as calças, pôs os sapatos sem tirá-los embaixo da corrente de água. Se tivesse um bidê ou ducha seria bem melhor. Vestiu a camisa e o casaco.

O celular tocou um dos números que Kei ligou.

— Senhor Takami? — a voz temerosa de Tokoyami quase lhe trouxe lágrimas aos olhos.

— Tokoyami! — Kei falou rouco. — Preciso de ajuda! Mera sabe onde estou?

— Sabem e estão indo salvá-lo! Me disseram para eu não ligar, disseram para eu esperar que iriam atrás do senhor, mas…

— Você é um bom estagiário, Tokoyami. — Kei desligou, pois era ele que não poderia esperar pela Comissão.

Guiou-se com a lanterna de volta para as escadas sociais, Kei cobriu a boca e o nariz com a lapela do casaco, olhou para as labaredas, respiraria fundo se conseguisse, pegou distância e saltou sobre parede de chamas. Elas lamberam seu corpo sedentas, mas nenhuma o agarrou.

O Rei E O PassarinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora