Gostinho de ferro

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Keigo de cinco anos arfava no chão segurando a barriga dolorida, vomitou bile quando o soco lhe acertou. O homem assomava-se sobre si, apenas uma silhueta de escuridão contra luz, sorriso afiado e olhos verdes penetrantes:

“Se você não aguenta um soco, garoto, então, não aguenta a vida de verdade fora desse chiqueiro.”

Kei lembrou-se das palavras do pai e jogou a guimba de cigarro no chão para logo depois escondê-la sob o tênis. Horas depois, Shigaraki entrou no cômodo seguido pelos seus subordinados, Kei agradeceu por não ver nem sinal do alicate. Já devia ser meio da manhã.

— Pensou melhor? É a sua última chance.

— Não sei quem são. Nunca os vi. — mentiu.

O primeiro soco veio logo em seguida, depois o segundo, quarto e sexto. Dois tapas estalados nas bochechas pelo mesmo homem de antes, esse porra deve tá tendo o momento da vida dele, pensou.

A cabeça de Kei flutuou nas surras em que levou, mas seus pés continuavam firmes no mesmo lugar.

Seguraram seu rosto e um cara de óculos enfiou o cano do revólver na sua boca:

— Conta para o chefe o que sabe.

Kei fingiu chupar a arma, nem as lentes escuras puderam esconder a expressão de nojo que o cara fez. Seu sangue e a arma tinham gosto de ferro mesmo. O cara tirou o cano da boca de Kei e lhe deu uma coronhada. A cabeça pendeu rodando de novo e mais uma maratona de socos e xingamentos começou.

No meio da tarde, Shigaraki se cansou e Kei era um mero boneco de pano jogado na cadeira.

— Você é um saco. — o líder falou. — Ontem foi mais divertido. Queria ver o resto de perto, mas vai dar para ver de qualquer lugar da cidade o que vamos fazer com você.

Shigaraki sorriu com lábios ressecados e disse:

— Bye, bye. Divirtam-se mais um pouquinho. — Saiu acompanhado de praticamente todos os seus homens. Restaram apenas três: o sádico, um careca e um de óculos escuros.

Outra sessão de socos e Kei descobriu que tinha o nariz bem resistente. Já os dentes nem tanto, sentia-os descolar das gengivas a cada golpe, todo seu maxilar parecia prestes a cair. A cabeça tombou para trás sem forças para erguê-la de novo.

— Já deu. Ele não serve mais para nada. — o careca falou.

O homem de óculos escuros concordou, porém, o sádico não estava muito disposto a ir com os amigos. Kei falou antes de todos saírem:

— Já? — Kei levantou a cabeça. — Achei que esse seu amigo sádico fosse brincar mais comigo ou ele é de nada mesmo?

Os três pararam na porta, o careca e o de óculos escuros ficaram desconfortáveis franzindo as sobrancelhas para a provocação louca de Kei, porém o sádico esperava ávido o aval do careca que devia ser o líder desse subgrupo.

— Não demore. — ele falou. — Senão, vamos deixar você aqui e terminar o trabalho.

Os dois saíram do cômodo e fecharam a porta, não queriam ouvir nada que viesse dali. Kei sorriu lambendo os lábios lascivo:

— E aí, esse teu pau é tão pequeno quanto parece?

— Você logo vai ver. — Pegou nas próprias bolas sob as calças.

O homem chegou perto de Kei e lhe deu outro tapa que fez com que visse estrelas, agachou para abrir e despir Kei das calças. Quando elas estavam na metade das coxas, Kei pôs todo o peso do corpo naquele chute e viu que o nariz do homem não era tão resistente quanto o seu.

O sádico caía quando Kei levantou da cadeira de supetão e num movimento usou ela para atingi-lo. A cadeira só quebrou no terceiro golpe, mas o cara só desmaiou no quarto e o quinto foi para garantir.

— Caralho, o cigarro salvou vidas hoje. — Kei falou com o peito subindo e descendo pela adrenalina, os nós dos dedos brancos pela força com que segurava a madeira.

Kei tateou pelo corpo do sádico até encontrar a arma e o celular. É claro que o celular tinha senha, mas dava para fazer uma ligação mesmo assim. O loiro se afastou do cara, não antes de lhe chutar de novo no nariz quebrado enquanto ligava para Mera que não atendia. Ajeitou as calças. Jogou o que sobrou da cadeira para longe assim como as cordas do braço direito que queimou com o cigarro e depois conseguiu arrebentar com os dentes e assim conseguiu soltar o braço esquerdo. Tinha a arma na mão e o telefone na outra. Mera não atendia e Kei estava mais puto do que jamais esteve.

Ficou um tempão fingindo estar preso, pois mesmo que livre só conseguiria fugir se houvessem poucas pessoas no prédio. Seria impossível sair cercado de capangas, era morte certa.

Kei chutou uma das caixas do galpão e então reparou nas etiquetas e a quem elas pertenciam: uma das empresas filiadas da Comissão, mas eram tantas… onde ficava essa mesmo?

Ouviu passos lá fora, colocou o celular no bolso e se escondeu atrás da porta com a arma pronta para atirar. O cara de óculos surgiu pela porta e ao ver o colega desmaiado enfiaria a mão no bolso, mas não foi rápido o suficiente, Kei apareceu do nada atrás da porta e enfiou o cano do revólver na boca dele:

— Tem gostinho de ferro, não é, filho da puta?! Levanta as mãos e faz o que eu mandar se não quer que eu estoure a tua cabeça aqui e agora.

O cara ficou bem mais chocado do que quando Kei fez um boquete no revólver dele. Ele não levantou as mãos, então Kei armou o cão do revólver para encurtar o gatilho. Ele ergueu as mãos tremendo e deixou Kei tatear sua roupa até pegar o revólver e colocar na parte de trás das calças.

— Desbloqueia o teu celular e me entrega. — Kei ordenou. — Só com uma mão.

Ele fez o que Kei mandou. Kei pegou o telefone e do aplicativo de mensagens escreveu para Mera e todo mundo que sabia o número de cabeça, não era muita gente, mandou uma foto junto assim como a localização. Seus olhos dourados esbugalharam — ao menos um esbugalhou, o outro inchado demais nem abria — ao ver onde estava no mapa, era em um prédio da Comissão no centro da cidade, não em um galpão abandonado na periferia ou no porto. Que merda estava acontecendo?!

— Que cheiro é esse? — Kei conseguiu sentir um leve aroma além do próprio sangue e bile. Gasolina e vinha do lado de fora.

“Reparou que aqui não tem sistema contra incêndio?”

“Queria ver o resto de perto, mas vai dar para ver de qualquer lugar da cidade o que vamos fazer com você.”

As peças se juntaram na cabeça de Kei. Vão fazer uma pira funerária bem no centro da cidade.

— Vai para o fim do cômodo! Agora! — Kei mandou aos berros. Nunca havia usado esse tom de voz, também nunca havia sido jogado no meio de uma fogueira prestes a entrar em combustão.

Saiu correndo da sala só para descobrir que o terceiro cara, o careca o viu no corredor quando veio atrás dos seus subordinados por não verem suas mensagens.

Ele apontou a arma para Kei que rolou no chão para escapar e atirar de volta. Sentiu a pele queimar pela gasolina que encharcava o lugar. Gritou de dor.

O careca conseguiu desviar e saiu correndo por onde veio, Kei tinha todas as costas ardendo em dor pela queimadura química e tudo o que lhe mantinha de pé era pura adrenalina. Não soube quanto tempo ficou parado ali tentando suportar a dor.

Kei finalmente correu seguindo os passos do gangster que já estava fora do seu campo de visão há alguns segundos e assim que percebeu nas portas da escada de emergência que estava no 30º andar de um prédio de 35º andares ao invés do térreo e o cheiro de fumaça vinha de baixo.

Apenas um milagre o salvaria.

Obs: armar o cão de um revólver é aumentar a precisão do tiro encurtando o gatilho, assim um mero toque nele faz a arma disparar. Kei fez isso para mostrar para o cara que ele sabia atirar e atiraria caso não fosse obedecido. Kei sendo dom aí pela primeira vez na vida kkkkkkkkkkkkk (piada horrível).

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Obrigado por lerem e até amanhã!
Bjinhus!





O Rei E O PassarinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora