Coma direito!

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Quando Keigo acordou no quarto de hospital sua primeira visão foi Enji encarando-o furioso de braços cruzados.

— O que aconteceu? — Sentia-se meio grogue e notou duas coisas: o catéter no braço ligado ao soro que pingava e que estava nu enrolado numa toalha branca ensanguentada. Não precisava mais de explicações. — Ah.

— Idiota! — Enji gritou como gritaria quando o caçula não lhe ouvia.

— Não grita, minha cabeça tá doendo. — Tentou tocar a testa e viu que esse braço estava vestido com um paletó bem maior que o seu tamanho. Kei estava vestido nele, apenas o braço do soro livre.

— Que doa! — Enji ficou afoito. — Você é um irresponsável! E se eu não aparecesse?!

— Calma. — Kei pediu. — Tá tudo bem agora, tô inteirinho.

— Um inteiro idiota! Desmaiou e bateu a cabeça no chão escorregadio com o chuveiro ligado, se fosse uma banheira teria morrido afogado! O que você acha que tá fazendo, garoto?!

— Mas eu não tenho banheira. Por que eu desmaiei? — Kei se perguntou se estava anêmico, se sentia tão fraco.

— Me diga você, garoto. — A exigência de Enji impregnada de insinuações. — Por que desmaiou?

— Não uso drogas. — Kei entediado explicou pela quinta vez naquele mês. — Estou doente e você fica me magoando desse jeito. — Fez biquinho.

Enji ficou enervado e tensionou mais os braços cruzados sobre o peito:

— Você tem sorte por estar numa cama de hospital.

— Preciso de um abraço para melhorar. — Kei choramingou.

A porta do quarto foi aberta e uma senhora idosa muito baixinha usando jaleco e carregando uma prancheta entrou:

— Quem quer um abraço? — ela perguntou. —  Olha só, ele acordou. Está mais aliviado ao ver o seu filho bem?

— Filho? — Kei perguntou confuso.

As ponta das orelhas de Enji aqueceram:

— Ele não é meu filho. — Mas a expressão ainda era a de irritação.

— Mesmo? Você ameaçou processar e destruir o hospital se ele não fosse atendido imediatamente.

— O serviço de emergência de vocês é péssimo. Fiquei esperando por quase vinte minutos e no final tive que o carregar até aqui.

— Empurrando todo mundo de forma bem bruta aliás. — a médica reclamou e passou as páginas da prancheta. — Bom, as radiografias mostram que não houve nenhuma lesão séria na cabeça, não vai precisar de pontos…

— Tem certeza? — Enji interrompeu. — Tinha muito sangue onde ele caiu.

— Geralmente feridas localizadas nessas áreas sangram muito o que não significa que necessariamente precisarão de pontos. — Ela virou mais páginas, a médica era praticamente uma miniatura perto de todo o tamanho Enji, continuou: — Os exames de sangue mostram o que eu suspeitava: desnutrição. Ele vai terminar esse soro e ficará bem, só tem que cuidar da alimentação.

— Mas eu como todo dia.

— Come porcaria é o que quer dizer. — Enji foi categórico na sua correção sem deixar aberturas para Kei responder.

— Mas é todo dia. E tem o leitinho…

— Chega de gracinhas. — Enji queria esganar o garoto, estava mantendo toda a compostura possível para não fazê-lo.

— Seu colesterol está um pouco alto — a médica falava —, mas de resto além da desnutrição nada fora do comum. Coma frutas, verduras e legumes e tudo ficará bem. Quer ver os exames do seu filho? — Ela ofereceu a prancheta.

Enji com o nariz enrugado pela irritação aceitou e analisou os papéis:

— Ele não é meu filho.

Enquanto isso, Kei se perguntou a porção de cebola frita que vinha no balde de frango era considerada legume.

— Obrigado. — Enji devolveu a prancheta.

— Viu? Não precisava ficar preocupado com o seu filho e ameaçar acabar com um hospital de renome.

— Ele não é meu…

— Você fez isso por mim, paizão? — Kei o encarou com a aura estonteante, os olhos grandes surpreendentes de regojizo.

— Pare. — Enji ordenou.

— Quero um beijo. — Kei pediu.

— Awn, que bom menino. — A médica se aproximou e afagou os cabelos bagunçados de Kei que aceitava tudo feliz. — Aqui o seu beijinho. — Ela lhe deu um selinho na testa.

Kei parecia um passarinho ao ser afagado:

— Só falta o seu, papai.

— Se comporte. — Enji cortou.

— Tenho outros pacientes para atender. — A médica soltou Kei que ficou atordoado sem o afago. — Quando o soro acabar, estão liberados. — Ela saiu do quarto.

Kei a viu partir e perguntou assim que ela se foi:

— Não vou ganhar meu beijo? Estou machucado.

— Você merece uma surra.

— Essas surras que nunca chegam… — fez muxoxo desapontado.

— Fique quieto. Até esse soro acabar, não quero ouvir a sua voz. — Enji sentou no sofá para acompanhantes.

O Rei E O PassarinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora