Capítulo 59

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Anahi Portilla

  Cheguei ao topo da montanha Olympus e quase sorri com a visão. Com mais de dois mil metros de altitude, a escalada tinha sido incrível. O esforço era proposital. Para me fazer esquecer na merda que eu tinha me enfiado.

  Tinham se passado cinco dias que eu tinha chegado em Utah, e o ar puro foi quase o suficiente para me fazer esvaziar a cabeça.

— Você me odeia. - Christian exclamou, jogando-se no chão pedregoso.

— Ah, largue de ser preguiçoso e olhe essa vista.

  E a vista era realmente incrível. Eu tinha uma visão perfeita da cidade. Era tão bonita. Tantos prédios brincavam com o verde dos parques e a água dos lagos que reluziam com o sol. E eu me sentia viva em estar fazendo trilha mais uma vez. Eu adoraria acampar, mas Christian, sendo um moço da cidade, se recusou, então estávamos na casa que seus pais haviam deixado quando faleceram.

  Christian levantou resmungando e se pôs ao meu lado. Ele tentou disfarçar a excitação com indiferença, mas eu o conhecia bem demais para não ver que ele havia adorado.

— Ah, vamos lá. Você adorou. - brinquei, batendo meu ombro no dele.

  Ele revirou os olhos.

— Só estou fazendo isso para te tirar de casa.

  E havia funcionado. Eu tinha passado os últimos quatro dias me afundando na cama, mal levantando até mesmo para tomar banho. Eu me sentia indisposta, deprimida, envergonhada. Não tinha pregado os olhos em nenhuma noite e só comia quando Christian me obrigava.

— Funcionou. Obrigada, Chris. Você é um ótimo amigo.

  Ele me abraçou de lado.

— Somos amigos, garota. Estou de seu lado sempre. Entenda isso. Acho que estamos no lugar certo para conversar. O que acha de nos sentarmos nessas pedras confortáveis e você me contar direito o que aconteceu? Sabe, com Maite contando a sua versão possessa, fica difícil saber até onde ela está contando a verdade e onde está exagerando.

  Claro. Maite era um poço de drama.

  Sabendo que Christian não desistiria, decidi pôr um fim nisso de uma vez. Conversaríamos sobre isso e eu seguiria em frente.

  Como? Eu não sabia.

  Sentamos nas pedras e comecei a contar a ele. De como eu suspeitava que Alfonso era casado no começo, porque convenhamos, era impossível um cara daqueles estar disponível, e como tinha fugido no começo justamente por isso. Que Alfonso havia me garantido que não era casado. Havia dito que tinha filhos, mas casado? Não.

  Porra, ele tinha mentido para mim. E a mulher ainda tinha aparecido na viagem. Eu estava tão mortificada, me sentindo tão traída. Só pensava na minha mãe se drogando e não conseguia deixar de culpar Enrico por isso.

  E ainda tinha o bebê que eu tinha perdido. Mesmo que ele não tivesse nascido, eu me sentia mal por tê-lo perdido. Ele estava ali comigo e eu nem sabia. Eu devia sentir algo diferente, não devia? A médica disse que os sintomas nem sempre aparecem. Um dos motivos de eu ter perdido, além dos eventuais acontecimentos que levaram às oscilações de humor, foi uma crise de pânico que tive no hotel quando Kiara apareceu. Quando eu estava vomitando, um pânico anormal cresceu em mim. Medo, talvez. Isso foi um fator contribuinte para a perda do bebê.

  Por mais que ela tivesse me dito que era normal perder o bebê no primeiro trimestre, não aplacava a minha dor. E se eu tivesse esse filho? Certo que era o melhor, visto que o pai dele era casado e eu nem sabia, mas e se ele tivesse nascido? O que eu faria? O que Alfonso faria?

  E Alfonso? Ele ainda não tinha me ligado. Será que eu tinha tão pouca importância assim? Enquanto eu me acabava por causa dele, o que ele estava fazendo? Eu tinha até medo de pensar na resposta. Eu queria que ele me esquecesse e fosse se foder, mas queria que ele viesse atrás de mim e me explicasse que merda era aquela. Por que ele tinha brincado comigo?

— Não acho que aquilo tenha sido uma brincadeira, garota. - Christian murmurou.

— Christian, ele é casado. Casado. Ele não respeitou meus sentimentos. De que lado você está, afinal? - retruquei.

— Do seu. Sempre do seu, querida. Mas eu conheço um olhar apaixonado quando vejo um e é assim que ele te olha. Com adoração. Como se só houvesse você no mundo.

— Eu e Kiara. A esposa dele. Eu só cumpri o papel de amante. Uma diversão passageira. Um passatempo porque ele não queria bater uma. - minha voz, infelizmente, saiu embargada, mostrando minha fraqueza.

— Anahi para com isso - Christian balançou a cabeça com desgosto - Homem nenhum te trataria como passatempo. Você é especial demais para isso. Só estou dizendo que pode haver algo a mais nessa história, entendeu? Tem criança no meio, Anahi. Ele pode ter medo de perdê-las. Você sabe que a preferência é sempre da mãe.

— Não me importa. Ele mentiu. Foi cínico. Cruel. Me humilhou. - choraminguei.

— Pare de ser teimosa e escute. Você sabe que não era só uma diversão para ele, Any. Você sabe disso. Você sentiu a conexão entre vocês. No começo até podia se tratar de sexo, mas certamente isso cresceu.

— Não quero falar sobre isso. - me encolhi.

— Porque você sabe que eu estou certo e você é orgulhosa demais para assumir isso. Meu Deus, Anahi, até um retardado via a química entre vocês.

— Acabou - gritei - Não quero mais te ouvir.

  Christian me encarou sem dizer nada. Enxuguei as lágrimas que insistiam em cair, me perguntando até quando eu seria uma garotinha fraca que chorava por tudo.

  Ainda sem falar, Christian levantou e pegou meu braço, levantando-me também. Ficamos na borda da montanha e respirei fundo aquele ar limpo.

— Grite! - Christian disse em meu ouvido. Olhei para ele com as sobrancelhas erguidas - Grite. Vai te ajudar. Coloca para fora toda essa merda que você tá sentindo. É como uma purificação.

  Olhei para a vista à minha frente, indecisa. Ninguém além de Christian me escutaria e o cara me conhecia muito bem, então, não tinha mal nenhum.

  Gritei a plenos pulmões. Gritei todo o meu ódio, rancor, humilhação, tristeza, traição. Amor. Gritei o quanto o amava e o quanto me matava ser fraca por continuar querendo aquele homem mesmo depois da merda que tinha acontecido. Por não ser capaz de controlar a saudade que sentia dele, e pior, a minha vontade de procurá-lo e pedir que ele me explicasse o que significava tudo aquilo. Eu queria saber se eu tinha sido só um jogo para ele. Algo casual.

  E por fim, chorei. Meus pulmões doíam e minha garganta ardia pelo esforço. Mas nada se comparava com a dor em meu peito. Nada. Chorei copiosamente nos braços de Christian.

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