Capítulo 66

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Alfonso Herrera

— Papa, a gente não vai conhecer a sua namorada? - Benjamin se sentou ao meu lado da cama, me olhando com curiosidade.

  Quase sorri. As crianças estavam curiosas para conhecer Anahi. Ela conseguia conquistar as pessoas mesmo sem ter a intenção.

— Vão sim, garoto - baguncei seus cabelos com um sorriso fraco - Você não devia estar dormindo?

— A Flo está dormindo, mas eu estou de vigia.

— Vigia, por quê?

— A gente não quer ir embora, então se a mamãe aparecer aqui, vamos fugir antes que ela nos encontre.

  Meu coração deu um nó e engoli o bolo que se formou na minha garganta. As crianças estavam feridas não só por fora, mas também por dentro. Eu me sentia tão impotente por não ter conseguido fazer nada, que a partir do momento em que eles passaram a viver comigo, jurei a mim mesmo que nada mais os machucaria. Se eu precisasse matar, eu o faria!

— Ela não vai voltar, Ben - coloquei-o em meu colo. Ele tremeu de leve e eu fiquei meio sem jeito. Eu não era de ter muito contato físico e ele também não. Mesmo assim, me permiti acariciar seus pequenos bracinhos - Vocês agora estão comigo, como sempre teve que ser.

— A mamãe é louca?

  Crianças sempre são tão curiosas. Na inocência, trazem assuntos que os adultos fazem questão de evitar.

— Não sei, filho. Sua mãe tem problemas psicológicos, mas não sei se louca é a palavra certa.

  Eu não iria arriscar. Coloquei seguranças onde ela estava hospitalizada. Eu não duvidava que ela tentasse escapar.

— Ela não ama a gente - suspirou pesadamente - Ela sempre disse. Falou que a gente separou vocês dois.

— Sua mãe não sabia o que estava dizendo, Ben - virei seu rosto para mim, para mostrar que eu falava sério - Sua mãe e eu ficamos mal antes mesmo dela engravidar de vocês. Não quero que você pense em nada disso, tudo bem? Isso é passado!

  Ele assentiu levemente com a cabeça.

— Posso dormir com você hoje? - sussurrou depois de passarmos um tempo em silêncio. Meu celular começou a tocar.

— Claro, garotão - coloquei-o na cama enquanto me levantava para ver quem era. Podia ser Anahi. Franzi o cenho ao ver que era Angel - Estou ouvindo.

Alfonso, preciso que você venha aqui agora - a voz da irmã da Anahi estava trêmula, nervosa. Fiquei alerta - Você precisa dar um jeito nisso.

Angelique, o que aconteceu? - perguntei já vestindo uma camisa e calçando os sapatos.

Vem aqui e você vai ver. Eu não aguento mais - soluçou - Você tem que se resolver logo com ela, Alfonso.

Tá. Estou chegando - coloquei o celular no bolso e beijei a testa de Benjamin - Garotão, o papai teve um problema, vou precisar sair. Pode continuar na minha cama, tudo bem? Victoria vai ficar de olho em você. - graças ao universo no dia seguinte a nova babá chegaria. A pobre Victoria não conseguiria lidar com duas crianças elétricas de oito anos.

  Avisei Victoria que precisaria sair e enquanto dirigia até o Bronx, tanta merda se passava pela minha cabeça sobre o que poderia ter acontecido, que quase bati o carro três vezes e ultrapassei todos os semáforos vermelhos.

  Foda-se.

  Eu estava desesperado.

  Não houve hesitação quando entrei no prédio da Anahi, nem pulando os degraus de três em três para chegar mais rápido e muito menos ao entrar na casa dela. A porta estava entreaberta, o que me fez supor que Angel estava mesmo desesperada para que eu chegasse logo. Ela não deixaria a porta aberta num dia comum num bairro perigoso como aquele.

  Mas eu não estava preparado para ver o que eu vi. O cubículo da Anahi estava uma bagunça. Móveis e objetos quebrados, cortinas e sofá rasgados, a TV destruída no chão, assim como a caixa de som. A cena era a mesma na cozinha e no banheiro.

— Graças a Deus você chegou - Angel saiu do quarto com os olhos inchados e o corpo trêmulo. Ela me abraçou com força, como se eu fosse o único salvador que ela tinha. Christian saiu em seguida com cara de poucos amigos - Anahi teve outra crise, Alfonso - soluçou - Precisei dar um remédio para ela conseguir dormir.

— O que aconteceu? - perguntei cauteloso.

  Angel se afastou e relatou que tinha visto pouco, mas o que viu foi Anahi gritando desesperada enquanto quebrava e rasgava tudo o que via pela frente. Tentei imaginar a cena e foi completamente desconcertante. Anahi estava destruída. E era por minha causa.

— Toma isso. Você está pálido - Christian me entregou uma cerveja. Abrimos e tomei alguns goles enquanto tentava clarear as ideias - Angel, por que não vai dormir? Você está cansada. Vou conversar com Alfonso.

— Você vai matá-lo? - Angel cruzou os braços, desconfiada.

— Não vou. Isso mataria Anahi. E não a queremos morta. Vou cuidar do Alfonso. Vá dormir.

  Angel pareceu relutante em sair, mas creio que seu cansaço realmente falou mais alto, porque beijou a minha bochecha, a de Christian e saiu.

— Onde Anahi está dormindo? Suponho que ela tenha destruído o quarto também.

— Eu trouxe um colchão inflável e duas cadeiras. - apontou para as cadeiras que estavam no canto da sala. As únicas que não estavam destruídas.

  Caminhei lentamente até o quarto e vi Anahi deitada no colchão inflável, dormindo. Seu semblante não estava relaxado como de costume. Ela parecia atormentada até mesmo no sono. Angel se deitou ao lado dela e a abraçou, chorando baixinho.

  As coisas realmente saíram do controle.

  Voltei para a sala. Christian estava sentado numa cadeira, então me sentei na outra. Ficamos calados, perdidos em pensamentos enquanto tomávamos a cerveja. Deus, a cerveja da Rússia era muito melhor.

— Você realmente fez uma bagunça na vida dela, Alfonso. - Christian sussurrou depois de um tempo eternamente longo.

— Eu sei - bati a cabeça na parede e apertei os olhos. Minha garganta doía e eu queria fazer alguma coisa que fizesse Anahi não se sentir mais daquele jeito - Eu sei.

— Você sabe que não foi legal ter mentido para ela - ele começou - Então não vou dizer isso. Todo mundo deve ter dito isso. Você se divorciou?

  Assenti com a cabeça, ainda de olhos fechados. Eu estava tão envergonhado que não tinha coragem de olhar para o amigo da Anahi.

— Angel me contou um pouco do que aconteceu... O que você vai fazer a respeito?

— Boa pergunta - resmunguei - Eu penso em tantas coisas e nenhuma delas traz a Anahi para mim. Parece que qualquer coisa que eu fizer agora vai afastá-la de mim.

— É foda ficar pisando em ovos - riu secamente - Mas é melhor você fazer alguma coisa logo. Ela ama você e você não estaria aqui se não sentisse o mesmo. Vocês precisam colocar as cartas na mesa. Sem manipulações.

  Assenti com a cabeça e continuamos em silêncio. Aquele era o conselho de uma das pessoas que Anahi deixava por perto, mas ainda assim eu fiquei perdido.

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