Isabella
Talita: Tem alguém batendo na porta, Isa! —gritou do banheiro.
Abaixei o volume do som, prestando atenção. Realmente, alguém chamava.
Isabella: Já vai. —gritei de volta.
Tirei os fones do ouvido e larguei em cima da mesa antes de ir até a porta. Meu coração acelerou um pouco, sem motivo aparente. Quando abri, me deparei com o Lobo parado ali, com a expressão séria e os olhos afiados, como se já soubesse que a conversa não ia ser fácil.
Isabella: Oi... Entra. —dei passagem para ele e fechei a porta atrás.
Lobo passou por mim com o jeito tranquilo de sempre, mas percebi que sua atenção estava completamente focada em mim.
O jeito que ele ajeitou a corrente no pescoço e passou a mão na barba era um sinal claro de que estava prestes a soltar alguma bomba.
Isabella: É sobre a visita?
Lobo: Também. Estamos vendo pra agendar a sua visita sábado agora. Se tudo der certo, te aviso e mando mensagem marcando o horário que vamos sair.
Isabella: Você vai também?
Lobo: Sim. Os menor de confiança estão tudo fixado, não tem como eles irem... —ele parou por um segundo, me analisando— Mas a gente tava precisando conversar. Por isso vim.
Isabella: Pode falar. Senta aí. —apontei para o sofá e me sentei no outro, de frente para ele.
Lobo se ajeitou no assento, apoiou os cotovelos nos joelhos e entrelaçou os dedos. Ele respirou fundo antes de começar, e aquilo já me deixou inquieta.
Lobo: É sobre sua vó. —engoli seco e passei a língua nos lábios, sentindo um frio na barriga. Meu corpo inteiro ficou tenso.
Fiquei em silêncio, esperando ele continuar.
Lobo: O negócio da operação foi coisa mandada. A gente suspeitava já, porque eles não vieram pra prender e nem pacificar a comunidade.
Isabella: O que quer dizer com isso? Que o que aconteceu foi por causa da minha vó?
Lobo: Eu fui atrás de saber o porquê eles vieram aqui, e um informante meu avisou que uma idosa tinha ido até eles e falou que o Branco tinha sequestrado você. Disse que ele era o chefe do tráfico e contou onde vocês moravam. Por isso que eles só vieram atrás de você.
A cada palavra dele, meu coração batia mais forte. Meus olhos se arregalaram, e eu precisei de alguns segundos para processar aquilo.
Minha própria avó... A mulher que me criou. Que deveria me proteger.
A culpa de tudo era dela.
Fiquei quieta, absorvendo a informação. O estômago embrulhou. Meu peito doía de raiva, de decepção. Eu queria dizer algo, mas minha garganta parecia travada.
Lobo: Branco não tá aqui, mas ele ia gostar que você soubesse... A gente sabe onde ela tá e estamos indo de encontro com ela. A cobrança vai ser feita.
Fechei os olhos e inspirei fundo, tentando me manter calma, mesmo que o sangue fervesse dentro de mim. Eu não conseguia acreditar que minha vó seria capaz de fazer isso. Mesmo sabendo do ódio que ela tinha pelo Branco, não achei que chegaria a esse ponto.
Isabella: Eu posso ir com vocês? Preciso entender o porquê ela fez isso.
Lobo coçou a cabeça, pensativo. O jeito que ele me olhava mostrava que estava avaliando se valia a pena ou não me deixar ir.
Lobo: Eu deixo tu ir, mas de qualquer forma, você não vai intervir na cobrança.
Mesmo sabendo que aquilo ia me machucar, eu precisava de respostas.
Concordei com ele, avisei a Talita que ia sair e depois explicaria tudo. Saímos de carro, e eu fui no banco de trás com o Kaká. Outros dois estavam no carro também, mas eu não os conhecia bem.
Reconheci o caminho fácil. Estávamos indo para a casa onde o Jhony tinha me mantido presa. A lembrança daquele dia me atingiu como um soco no peito.
A sensação de impotência. A verdade sobre meu pai, revelada de forma cruel.
Eu respirei fundo, engolindo o nó na garganta. Eu não podia me abalar agora.
O carro parou em frente ao portão da casa.
Lobo: A gente vai ficar aqui fora te esperando. Quando pudermos entrar, me avisa.
Assenti fraco com a cabeça, tomando coragem antes de descer do carro.
Atravessar aquela rua pareceu levar uma eternidade. Cada passo era pesado. Meu coração batia forte, e minhas mãos estavam frias.
Cheguei no portão e chamei. Até que minha vó apareceu.
Ela me olhou surpresa ao me ver ali.
Isabella: Dá pra gente conversar? —perguntei, quebrando o silêncio.
Isaura: Claro. —Ela veio até o portão, destrancando e me dando passagem.
Isaura: Como soube que eu estava aqui?
Isabella: Isso não importa. —falei, séria, e fui andando para dentro da casa.
Ela veio atrás, e quando parei no meio da sala, me virei para encará-la.
Isabella: Eu sei do que a senhora fez. Mas quero saber o porquê.
Isaura: Tá falando de quê?
Isabella: A senhora sabe bem. Foi a senhora que deu o nome do Branco e contou quem ele era. Ainda meteu papo de sequestro. Pra quê isso? Me fala.
Isaura: Branco é bandido. Ele matou o meu filho e vai pagar pelo que fez. Eu não consegui provas de que foi ele quem assinou o Jhony, mas eu sabia o cargo dele no crime. Usei o que tinha em mãos, Isabella. Isso não tem nada a ver com você. —ela me olhava firme, mas eu não baixei o olhar.
Cada palavra dela só me deixava mais decepcionada.
Isaura: Você tá grávida e sozinha pelo mundo agora. Se quiser voltar a morar comigo, estou de braços abertos. Desde que corte contato com o pai do seu filho.
Isabella: Você fez tudo isso por ego. Não foi por estar machucada. Você só não aguentou me ver escolher ele ao invés de você, não foi?
Ela não respondeu.
Isabella: Você nunca se importou de verdade. Se fosse por dor, teria feito o mesmo quando meu pai morreu. Mas não... Você preferiu mentir pra mim.
Isaura: Você escolheu o pior lado. Se quiser ser mulher de bandido, vá em frente. Vai ficar em porta de cadeia sendo humilhada.
Meu peito queimava de tanta raiva.
Isabella: Dói ver o que a senhora se tornou. Egoísta ao ponto de ferrar minha vida só pra ter o que quer. Mas quem escolheu o pior lado foi a senhora.
Peguei o celular e mandei mensagem pro Lobo.
Isabella: Eu só vim aqui pra saber o porquê de tudo isso.
Isaura: Teve sua resposta? Veio defender seu macho?
Isabella: Tive sim. Vim defender a mim mesma. E acabar com qualquer esperança de que você ainda fosse a avó que me criou.
Ouvi o portão sendo aberto. Vi o Lobo entrar, e ele me olhou, esperando confirmação.
Assenti com a cabeça e dei as costas. Saí sem olhar para trás.
Eu sabia que o que ia acontecer lá dentro não ia ser bonito. Mas, por mais que ela tivesse feito tudo isso... não conseguia acreditar que minha vó merecia o final que ia ter.
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No alto do caos
Fanfiction"No Alto do Caos" é uma história sobre uma jovem de 19 anos que, em meio à realidade da favela, acaba se apaixonando pelo chefe do tráfico local. A trama acompanha os dilemas e perigos de viver um amor proibido, enquanto a jovem tenta equilibrar sua...