Capítulo 43

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Manhã. Banco de dados.


Eu e Kali passamos pelas ruas já movimentadas do subúrbio usando casacos mais pesados do que de costume. Um vento gelado parece soprar das montanhas e canalizar-se pelas ruas. Quando chegamos ao banco de dados, meus dedos estão gelados, assim como grande parte do meu rosto.

— Como acha que Leon pode nos ajudar? — Pergunto. Tento mascarar meu nervosismo quanto a conhecer o homem. Trata-se da mesma situação em que estive quando conheci a fatalista pela primeira vez. Uma coisa é espionar alguém através de câmeras; outra, completamente diferente, é encarar essa pessoa nos olhos.

— Ele não pode nos ajudar. Mas eu quero falar com ele.

Concordo.

O velho já está no topo das escadarias que levam para o interior do edifício e, quando nos vê, dá um sorriso.

— Este é quem eu acho que é? — Pergunta.

Nós subimos os degraus e paramos em frente a ele.

Em meio às rugas de seu rosto e por trás de uma espessa sobrancelha de fios brancos ficam olhos vívidos. Por alguma razão, eles sempre me haviam parecido mortos e cinzentos, ao vê-lo nas imagens no tampo de vidro no depósito. Mas são coloridos.

— Sim. Harlan Montag, mercador. — Diz Kali, me apresentando.

Não tenho certeza se devo fazer alguma coisa, oferecer-lhe a mão para que a aperte, ou não. Por fim, acabo fazendo apenas um sinal com a cabeça, que ele corresponde.

— Imagino que tenha acontecido alguma coisa, para que ele esteja aqui. — Diz o velho, estreitando os olhos.

— Eu tive de contar a ele, Leon.

Apesar de parecer concordar, ele suspeita.

— Bem, imagino, então, que o melhor momento para encontrar com aquele homem seria agora. Vocês certamente estão à procura de alguma coisa — diz ele. — Uma atualização, ainda? — Ele olha para a garota.

— É nossa única opção. — Ela diz.

— A não ser que não seja uma opção — o velho vira-se na direção do banco de dados e passa o display no console para entrar. Eu e a fatalista fazemos o mesmo. — Você foi até Fenrir, e veja o que aconteceu.

O que aconteceu, afinal? — Pergunto.

Kali gira os olhos nas órbitas.

— Ele simplesmente não entendeu nada do que eu tinha a dizer — diz, com desgosto. — Achou que eu estava lá para fechar o arco dele, ainda que ele não estivesse pronto para isso. Pelo que entendi, ele tem medo de que a CMT vá caçá-lo por conta de suas obras de arte supostamente rebeldes. O único problema é que a Teia não tem nenhuma razão para caçá-lo pelo simples fato de que ele não faz nada de errado. E, de qualquer maneira, ele enlouqueceu quando eu falei a respeito de Edward Blair.

Concordo.

— Pelo que entendi, ele é um falso rebelde.

— Um conceito criado por ele para justificar sua própria preguiça em levantar da cadeira e fazer alguma coisa — fala Leon, em voz alta. — Duvido muito que seja possível existirem dados ocultos nos nossos displays. Não faria nenhum sentido.

Dou de ombros. Kali apenas continua andando atrás dele. Vamos até uma das mesas coletivas e nos sentamos juntos, longe de outras pessoas.

— Mesmo assim, vocês estão atrás de uma atualização. Duvido muito que possam contar com esse Fenrir.

Deuses e FerasOnde histórias criam vida. Descubra agora