Capítulo 47

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Dez minutos depois.


Não tenho ideia de quais possam ser as consequências do que acabamos de fazer, mas imagino que o que aconteceu possa ser considerado uma imprevisibilidade. É possível – mas apenas possível – que Simus tenha o destino que Kali disse: ser considerado um acidentado e substituído, como uma peça defeituosa, por um curinga.

Kali parece distante, mesmo enquanto corre pelas ruas.

— O que ele quis dizer quando disse que não era um imune? — Pergunto.

Viramos uma curva e começamos a caminhar. Nos distanciamos o bastante do galpão de atualização para sermos confundidos com passantes. Paramos e descansamos em um beco.

— Eu nunca ouvi falar de nada do tipo. — Responde a garota, respirando profundamente e soltando o ar com força. Eu me apoio nos meus joelhos e respiro rápido, pela boca.

— E ele seria imune a quê?

Ela balança a cabeça, mas para em seguida.

— À Teia, talvez. — Resmunga.

— Imune à Teia?

Ela só me olha, pensativa.

Então, passa um dos dedos pelo display e, pouco depois, tira o fone de ouvido de um bolso da sacola e o põe na orelha.

— Ceres. — Ela diz, um segundo depois.

Aguardo enquanto ela ouve.

— Fui atrás do homem que verificamos no meu display, antes. Ele comentou alguma coisa sobre ser imune.

Mais um momento de espera.

— Preciso saber o que é isso.

A garota olha para mim, sua respiração se regularizando.

— Certo. — Diz, por fim, tocando na tela outra vez e desligando.

Ela se vira para mim, ainda apoiado nos joelhos.

— Precisamos voltar ao servidor — diz ela, começando a andar para fora do beco. Me apresso a acompanhá-la. — Ceres disse que é muito perigoso falar de imunidade através de uma ligação, porque todas elas são monitoradas por um algoritmo que caça palavras suspeitas.

Abro as mãos para ela.

— Mas agora você já disse a palavra "imune", enquanto falava com ela.

Kali se limita a ignorar o que acabei de dizer.

Pouco depois chegamos ao servidor. Antes mesmo que passemos nosso braço no console a porta já estala, e a trava é recolhida. Mas passamos os braços mesmo assim, para fazer o check-in.

— Não ligue as luzes. — Diz Ceres, de onde está.

A fatalista parece pensar por um instante, e, então, continua caminhando. Passamos pelas prateleiras e chegamos a Ceres. Ela digita freneticamente em seu teclado projetado.

— Esperem aí. Eu estou preparando algo para vocês — ela diz, e, então, aperta alguns botões virtuais nas telas e olha para cima. No teto, vemos um projetor virado para uma parede sem prateleiras ou cabos correndo por ela. O aparelho solta um bipe e as lentes giram e ligam. — Só deixem essa porcaria esquentar. Eles acham que ninguém vai usar o espaço dentro dos servidores, então deixam equipamento ultrapassado instalado. Dá nisso.

Eu espero de braços cruzados enquanto a imagem projetada se torna gradualmente mais nítida.

Quando finalmente é possível ver com clareza o que há para ser mostrado, percebo que é um mapa. Um mapa composto por infinitos pontos ligados por linhas de quatro cores: brancas, vermelhas, azuis e amarelas. A imagem parece estar em movimento. Há um ponto praticamente isolado, com apenas uma linha branca se ligando a ele, que desaparece enquanto olho. Algumas outras linhas também desaparecem.

Deuses e FerasOnde histórias criam vida. Descubra agora