Capítulo 66

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Dez minutos depois.


Eu quero fugir.

Mas há um peso enorme sobre as minhas costas. Ainda que eu queira correr, minhas pernas parecem mover-se devagar demais. Por mais que eu queira usar minha moto para atravessar a Zona Industrial, o subúrbio e desaparecer no meio das montanhas fora dos limites da cidade, não posso. Nem ao menos tenho uma moto.

Um soco me atinge e eu caio no chão.

Meu rosto é prensado contra o asfalto e, com o canto do olho, vejo que Kali está na mesma situação. Um mantenedor de capacete junta os braços dela com violência, e outro faz o mesmo comigo. Algemas eletromagnéticas são postas em nossos pulsos e, então, somos incapazes de nos soltar.

Quando eles terminam, somos levantados e postos contra a parede do Núcleo de Nascimentos.

— Eu gostaria de saber se houve algum problema, algum ruído em nossa comunicação — diz Dimitri O'Neil, às nossas costas. — Pelo que me recordo, nós entramos em um acordo em que todos seríamos beneficiados. Vocês cumpriam com seus displays e nós não os levávamos para a CMT. Acredito que a proposta tenha ficado clara.

Nem eu, nem ela falamos nada.

— Ficou? — Pergunta o mantenedor, com ferocidade na voz.

— Sim. — Eu digo, baixo, percebendo que Kali não dirá nada.

— Ótimo — O'Neil anda às nossas costas, sua voz se movimentando junto com ele. — Por essa razão, estou tomado por uma séria dúvida. O que os levaria a cumprir com as conquistas um do outro, ao invés de assumir as responsabilidades de seus próprios displays?

Ele para.

Podem me explicar? — Grita.

Kali se mexe, tentando se soltar.

Com um chute ela se livra do homem que a estava segurando, e, com uma joelhada, o põe no chão. Ela consegue correr por dois metros antes que Dimitri a interrompa, lançando-se sobre ela. Os dois caem com impacto e ele a levanta em seguida, jogando-a com força contra a parede.

— Eu achei que você tinha entendido as regras por aqui — diz o mantenedor, empurrando o rosto dela contra a parede, as falhas desta raspando em sua pele. — Espera-se que as pessoas aprendam com seus erros, não que sigam errando.

Ele se cala, e segura o rosto dela com a mão esquerda. Puxa-o e a encara.

— Está drogada — diz, e a empurra na direção de uma mantenedora. — Vasculhe-a.

Dimitri cruza os braços e espera.

A mantenedora tira a sacola de Kali, joga-a para outro mantenedor, próximo da porta de um dos carros. Dou uma olhada no cenário. Há quatro carros e cerca de quinze mantenedores. As barras de led tradicionais piscam como de costume, fortes o bastante para alcançarem as nuvens baixas que começam a escurecer o final do dia.

A mulher balança a cabeça negativamente e devolve meu par para Dimitri. O outro mantenedor, porém, tira o pacote embalado a vácuo de dentro da sacola.

— Nectarina. — Afirma ele, depois de provar o gosto do pó azulado.

— Recolham.

O mantenedor estende a mão, e a garota vai até ele, empurrada.

— Onde você conseguiu isso? — Ele pergunta, irritado. Uma mecha de seu cabelo se soltou e pende sobre sua testa. — Sabe que o consumo dessa droga é terminantemente proibido, sob qualquer circunstância.

Deuses e FerasOnde histórias criam vida. Descubra agora