[36] Revelações I.

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I.

Kwon Sook's P.O.V.

Houve um tempo em que eu odiei a vida ao máximo.

Negava-me ao direito de ter esperanças em um coração que eu rejeitava como meu. Naquela época, a tristeza foi minha única companheira e o sofrimento me moldou. Isolei-me para não enfrentar olhares de pena, chorei em silêncio para que ninguém me ouvisse e tentasse me consolar. Às vezes me encolhia num canto do quarto e abraçava os joelhos até tremer. E suplicava para que tudo findasse.

Muito embora tentasse, meu choro nunca acabou com a dor e a solidão. Eu ainda ouvia os gritos, via os olhos mortiços que se transformaram em espectros para me assombrar. Sonhava com os corpos frios e dilacerados, que ainda sangravam e me tocavam, me perseguiam e me empurravam em um abismo profundo, povoado por monstros. Era quando a saudade mais doía.

Comprimia meu peito, expulsava o ar, me dilacerava. E eu nunca pude lutar contra aquela realidade cruel. Não podia lavar minhas memórias para que não existissem, não podia desejar que tudo desaparecesse. Não conseguia nem chorar tudo o que queria. Não podia gritar para fazer tudo sumir, porque nada sumiria.

Nada.

Nada, exceto Omma e Jisoo.

Elas estavam presas na pior das eternidades, embaixo da terra escura, fria, real. Naquele tempo minha dor não tinha nome e nunca foi capaz de me afastar. Entre fantasmas e lágrimas, permaneci em um vórtice destrutivo. Porque meu amor podia vê-las através da morte, porque só o verdadeiro amor é tão eterno quanto a morte. Eu era apenas uma criança amedrontada, que sentia falta da mãe e da irmã mais velha e tentava morrer para encontrá-las. Foi por isso que amar tornou-se sinônimo de ausência, sofrimento e perda.

Por causa disso, me fechei em uma casca seca, com um interior vazio.

Cheguei ao limite de não suportar sentir mais nada.

Queria morrer para estancar a ferida que tanto me maltratava. Foi na depressão e no luto que parei de comer. No início, por ansiedade. Via-me no espelho e enxergava uma saúde que eu não merecia ter, porque Omma e Jisoo sequer existiam. O isolamento da convivência com pessoas reais me fez mergulhar na vida social que a internet me proporcionava, impessoal, fria e insípida. Lá, estranhos me aceitavam e me elogiavam pela magreza, estancavam meu sofrimento. Iludi-me. Foi um dos meus piores erros.

Meu reflexo passou a ser um inimigo. Rejeitava minha imagem, não me reconhecia. Toda a carne e gordura que eu via em minhas curvas diante do espelho eram excessivas, distorciam quem eu era, ou quem deveria ser. Para mim, aquele invólucro me distanciava do carinho virtual de estranhos e da imagem que Omma e Jisoo tinham àquela altura. Na gana por aliviar minha dor e me transformar no esqueleto que Omma e Jisoo eram, padeci. Emagreci ao ponto de não conseguir me erguer da cama.

Diagnosticaram-me com um distúrbio alimentar.

Anorexia.

Comer era doloroso, eu chorava a cada punhado que me obrigavam a engolir. Queria ver meus ossos colados na pele, odiava a mim mesma quando via os números na balança. Vomitava após as refeições, quando conseguia. Eu comia, vomitava, chorava e comia. Uma inflamação na garganta, causada por ácidos gástricos, me denunciou e o médico sentenciou. Meus músculos começaram a atrofiar, minha atividade cerebral se tornou mais lenta, meu ciclo menstrual estava interrompido, meus pulmões apresentavam avarias. Eu definhava.

Morreria por inanição em pouco tempo. Naquele dia vi a dor transbordar em forma de lágrimas nos olhos do inabalável Kwon Ji Yong. Ele desabou nos braços da Srta. Jeon em um choro copioso em um canto da varanda do apartamento em que morávamos na capital. Suas palavras ainda ecoam na memória. "Ela é tudo o que me resta. Minha filha é tudo o que eu tenho." Eu quis abraçá-lo e pedir que não sofresse por mim. O que sua namorada respondeu foi o gatilho que eu precisava para me convencer.

Girl Meets EvilOnde histórias criam vida. Descubra agora