Capítulo XXVIII

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Sou despertada com o barulho da chuva batendo contra a janela, riscando o vidro em linhas claras. A batida era persistente e firme. Ainda é noite, as árvores se agitam violentamente lá fora. Olho para a tela do meu celular.

23h50min.

Estou com sede, e decido sair do quarto para servir um copo de água. Fico de pé, calçando as pantufas ao mesmo tempo que prendo meu cabelo num coque frouxo.

Trovões sempre me causam pavor, e por mais que eu ainda não tenha ouvido nenhum, a possibilidade é grande se levado em conta a velocidade que a chuva aumentava.

Abro a porta do quarto.

O único som é o da chuva forte lá fora. Todas as luzes estão apagadas, e após muitas tentativas de me adequar a elas, decido mantê-las assim.

Com cautela, sigo ao frigobar.

Um clarão que me paralisa ilumina a sala, e pela janela, avisto Damen de costas apoiado no parapeito da sacada. No segundo seguinte, tudo escurece outra vez.

Minhas pernas se arrastam até ele, sem qualquer hesitação. Por mais que não gostasse da ideia, sabia o que deveria fazer e enquanto não o fizesse, não conseguiria dormir.

Assim que empurro a porta de vidro, meus olhos são atraídos ao show de luzes que acontece por detrás das imensas nuvens acinzentadas, o céu todo pintado em chumbo.
Um vento forte e gelado ricocheteia a minha pele. Alguns fios do meu cabelo que ficaram de fora do coque começam a bater no meu rosto sem parar, os ajeito para trás da orelha e pigarreio, chamando a atenção de Damen.

Um arrepio percorre a minha nuca quando finalmente nota a minha presença. Ele entorna os olhos apenas o suficiente para me dar uma rápida olhada, e depois volta a apreciar os raios distantes que cortavam o céu.

- Eu posso falar com você? – Minha voz saiu quase como um sussurro.

Ele inclinou a cabeça e deu os ombros.

- Nós não matamos ninguém.

- O que?

- Eu não matei aquele cara. – Ele limpa a garganta, e continua contemplando o tempo.

Por mais que fossem outras as preocupações que me afligiam nesses últimos dias, uma parte de mim nunca conseguiria esquecer de todo aquele sangue daquela noite.

No meu ponto de vista leigo, ninguém poderia sair vivo depois de perder tanto sangue, mas de fato estava aliviada ao descobrir que eu estava enganada.

- Um contato acompanhou a cirurgia que o miserável teve que fazer. Acabaram de me ligar e me informaram que ele está fora de risco.

- Que bom. – Era bom. Muito bom. Só que Damen não parecia tão aliviado como eu, era quase como se ele estivesse infeliz com a notícia. – Não é?

Seu maxilar fica mais rígido.

- Não.

- Você queria que ele tivesse morrido? – Pergunto, mas ele não me responde. Apenas vejo seu olhar se escurecer, ser tomado por sombras. A resposta para a minha pergunta não precisava ser dita em voz alta, eu já havia entendido. – Por que você iria querer isso?

Seus olhos descem aos meus.

- Porque eu sou um cara ruim, como você mesma disse mais cedo.

- Você não é. E eu estou aqui justamente para corrigir isso, para lhe pedir desculpas.

Ele assentiu, mas o silêncio continuou.

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