Lua Negra

Capítulo LXXXVIII

 
           Independentemente do quanto nos esforçamos para evitar um momento, uma pessoa, uma palavra, a vida não permite que sigamos em frente sem que encaremos aquilo que tanto lutamos para escapar. Às vezes são momentos de dor, outras de amor. Algumas são despedidas, outras de reencontros, seja qual for, cedo ou tarde você terá que enfrentá-las.

      Hunter, papai e Tyler entenderam isso, assim como eu. Deixaram todo o passado para trás, cada mágoa, cada rancor, cada dor para que conseguissem estar aqui, reunidos nesta mesma sala, sentados sobre o mesmo sofá, ouvindo atentamente o que eu tinha para falar, tudo o que eu tinha para falar.

      Às vezes coisas difíceis precisam ser ditas, não unicamente porque queremos, mas porque  existem alguns sentimentos que necessitam ser libertos, e depois de livres uma vez, nunca mais precisarão ser mencionados.

      Cada um deles teve a sua oportunidade de falar, como a que eu tive. Cada um deles se emocionou, como eu me emocionei. Cada um deles carregava uma história, a sua própria história, mas ainda assim éramos todos versos de um mesmo poema.

      Porque por mais que tivéssemos nossas diferenças todos nós partilhávamos o maior presente que poderíamos receber no mundo, o amor incondicional que Elizabeth Hayes dedicou a cada um de nós.

      Sei que o caminho que escolhi não seria fácil, mas estava disposta a trilhá-lo.

      E por mais que todos aqui tenhamos errado, para mim o que bastava era que estávamos agora dispostos a consertar.

      Porque grandes decisões mudam a sua vida, mas são as pequenas escolhas do dia a dia que a define.

E hoje....

Hoje eu escolhi amar.

* * *

     Eu estava secando o cabelo, quando noto uma sombra no espelho que não percebi antes. Damen estava lá, encostado na soleira da porta, os braços cruzados sob o peito.

    Um sorriso perverso nos lábios me convidam a adivinhar o que se passa em sua cabeça por todo o tempo que ele esteve ali, me observando.

     - Sabe, dá azar me ver antes da hora.

      Um sorrisinho de canto brota em seu lábio enquanto assimila a frase de duplo sentido.

     - Por mais que eu queira, e queira muito... – Damen murmura, se aproximando e passando o braço ao redor da minha cintura, colando meu corpo ao seu. – Ainda não te pedi em casamento, principalmente porque o seu pai disse que se eu fizer você casar tão jovem, vai acertar as contas comigo. E seja lá o que quis dizer com isso, não parece ser algo bom.

     Encaro olhos azuis pelo reflexo do espelho, convencida de que nunca me cansaria de encará-los.

     Eles refletiam o mesmo oceano de meses atrás quando o conheci, mas agora não mais tão desconhecidos e sombrios, eu diria que ainda existem certas porções inexploradas, como todo oceano é, como tudo na vida deve ser.

      Eu podia ouvi-lo cantarolando para mim aquela velha canção, como a melodia de uma sereia, me seduzindo e desafiando a explorar onde mais ninguém havia ousado.

      Porém, agora as ondas de seu mar eram mais livres, e radiantes. Isso é o que acontece com todos aqueles que deixam o sol entrar em suas vidas e se permitem serem felizes, porque coisas ruins acontecem a todo momento, mas o que verdadeiramente conta no final, são os momentos bons que passamos com aqueles que amamos.

      Você não pode mudar seu passado, mas o presente é uma dádiva, o único meio de criar um futuro melhor.

      Damen suspira no meu ouvido, e quase não sou capaz de disfarçar o arrepio que perpassa por todo o corpo.

      Giro os meus calcanhares para ficar frente a frente dele, meu coração ia a falência toda vez que ficávamos tão perto.

      Observo que ele vestia o melhor de seus adereços, camisa branca, terno preto, e um sorriso de deixar minhas pernas bambas.

      Ficamos assim por um segundo, ou dois, não sei exatamente porque o tempo não parece passar normalmente quando ele está comigo.

     Ele enfia a mão no bolso e tira uma caixa de lá. Arregalo os olhos em surpresa, tínhamos combinado que ele ia parar de me dar presente dia sim e dia não. Apenas em datas especiais.

      - Este é especial, juro. – Sussurrou contra o meu ouvido. E olhando-o pelo espelho, pego a caixinha de suas mãos.

     Estou empolgada, tento não abrir a caixa tão rápido. E quando a abro, não consigo evitar o sorriso enorme que os meus lábios se dobram.

     Era uma pulseira.

     Não qualquer pulseira.

     A mesma pulseira que usei no leilão quando fizemos aquela viagem juntos, a viagem em que demos o nosso primeiro beijo, e que apesar de toda loucura que aconteceu depois, era o começo de tudo o que senti por ele.

       - Como você...

      - Eu comprei a pulseira naquela mesma noite, não a deixaria ir embora, não depois que a vi em seu pulso, não depois que meu coração batia descontroladamente perto de você.

      - Você foi o louco que pagou mil vezes mais do que ela valia?

      - Megan, a única coisa pelo qual eu sou louco, é por você. Sempre fui, mesmo que evitasse admitir. – Seus lábios descem até os meus, explorando-me com fervor, como se de alguma forma voltássemos naquela noite, a noite do nosso primeiro beijo.

     Suas mãos percorrem todo o meu corpo, alisam o meu vestido, e me puxam para cima da bancada.

      Prendo as minhas pernas ao seu redor em uma tentativa desesperada de aproximá-lo. Beijar Damen Coleman é alucinante, quase te faz esquecer de todo o resto, quase.

      Eu me afasto, estamos ofegantes, os seus olhos gelados sobem aos meus, os lábios a poucos centímetros de distância.

     - Estamos muito atrasados?

     Eu sorrio, não consigo evitar.

     - Sim, estamos muito atrasados. – Respondo a pergunta sabendo o que se passava pela sua cabeça porque era exatamente a mesma coisa que se passava pela minha. – A verdade é que estamos mais que atrasados, quase ferrados, eu diria.

      Muita coisa mudou nestas últimas semanas. Como por exemplo, agora a minha família era maior, muito maior, e os segredos foram de vez banidos. Eu também não era mais uma simples colegial, fui admitida em três faculdades de cinema, e sim, com muito suor consegui nota suficiente para não reprovar. Outra coisa que mudou era o fato de que agora eu tinha um namorado. Não um namorado qualquer, mas um por quem sou perdidamente apaixonada, e que finalmente apresentei oficialmente para minha família, a toda ela.

     Entretanto, mesmo com o mar de mudanças que aconteceram neste último ano, muitas coisas não mudaram. E sou grata a elas.

     Como o fato de Willa, James e Olive serem os meus melhores amigos de todo o mundo. Ou que a professora Muertes continuar pegando no meu pé até o último dia de aula, mesmo que agora eu sei que ela fazia isso para meu bem (e também um pouquinho para não perder o costume). Meu pai continuava a ser o melhor pai do mundo, e o ciumento de sempre. Tyler o irmão mais babaca que conheço, mas também uma das pessoas que mais amo neste universo.

      Então mesmo que muita coisa mudou, sentia como se nada realmente havia mudado.

      Eu ainda era Megan Hayes, uma garota boba atrás de repostas, à busca incessante de eu quem sou neste mundo, aquela que sempre chegava atrasada para todos os compromissos, e agora, inclusive para a própria formatura.

       F I M