CAPÍTULO 37 - A ILHA DOS BOIS

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Bem mais longe daquele bistrô do que se imagina, na mente de Elias, o capitão e seu visitante entravam em um embate sobre a deflagração da Revolução onde cada um gritava seus argumentos:

- Você se aproveitou da situação em benefício próprio! - Disse Enzo.

- Em benefício próprio, não. Agi conforme meus interesses. - Respondeu Elias.

- É a mesma coisa! Você fez isso para ter poder. - Acusou Enzo.

- Não vou mentir, eu fiz para ter poder, mesmo. Mas para ter poder de mudar a realidade de muita gente. Você fala de seguir legado político de seu pai, mas é só falácia.

- Falácia? Que motivo eu teria pra mentir sobre isso? - Questiono Enzo, furioso.

- A verdade, nua e crua ,é que seu pai quer que sua família se mantenha no poder. - Esbravejou Elias.- Mas o pior não é isso. É que, para se manter no poder, é preciso trazer sofrimento para outras pessoas.É o caos que faz as pessoas sentirem a necessidade de um líder.

- Quer dizer que os homens como meu pai não querem uma sociedade perfeita. Nela, não haveria problemas a serem resolvidos. - Concluiu Enzo, mas falou em tom baixo - Não acredito que estou discutindo isso com um avatar de videogame.

- Mas se, por oportunidade ou por legado, o poder vier até você, use-o para um objetivo maior. - Explicou Elias antes de perguntar - Qual é a sua missão ao se candidatar?

- Bem... Eu...Eu não sei. Eu cometi muitos erros de onde eu vim. Não me sinto uma pessoa adequada para ocupar um cargo desses. Até ontem eu só queria saber de jogar.

- Você precisa pensar nisso, mesmo que escolha não se tornar um político. - Aconselhou Elias - Enquanto você pensa, porque não visita a minha ilha dos bois?

Olhou para ilha cheia de animais pastando e, depois, Enzo olhou para o boi sobrevoando a ponte, antes de dizer:

- É claro! A ilha! Mas e os tubarões? Como faço para passar por eles?

- Eles não vão fazer nada. Capaz de algum deles te levar até lá para ser mais rápido. - Respondeu Elias fazendo Enzo subir no beiral da ponte e pular na água.

Seu corpo afundou e quando ele abriu os olhos, deu de cara com um grande tubarão que vinha em sua direção. Mas antes que pudesse alcançar Enzo, o tubarão mergulhou, fez uma manobra e ficou debaixo do rapaz que logo entendeu que era para montar no animal.

O tubarão percorreu a distância entre a ponte e a ilha em questão de segundos e ao sair do mar, em direção a ilha, Enzo olhou para a ponte e pode ver Elias acenando. Passou por entre os bois que pastavam pela pequena porção de terra, até que escolheu o que carregava uma placa de madeira com a numeração mais baixa, de número 1770.

O boi de número 1770 olhou para Enzo como se agradecesse por ter sido escolhido, tanto que não foi necessário que o rapaz tocasse no animal. O boi, por conta própria, se aproximou e esfregou sua cabeça no braço de Enzo que instantaneamente sentiu a mesma sensação de tocar os turbantes de Xica, em 1591.

Uma sequência de informações sobre o passado de Elias invade a cabeça de Enzo. A primeira delas é o momento em que Elias nasceu. Sua mãe gritava devido as contrações enquanto as parteiras comentavam que a escrava havia sido forçada e agora a mulher deveria criar o filho sozinha, pois o marido foi embora, envergonhado por ser corno.

A imagem rapidamente se transforma revelando a escrava, carregando Elias no colo, conversando com um padre que parecia estar constrangido com a presença da mulher.

Em seguida, a imagem sofre uma nova metamorfose ao mostrar o padre, anos depois, sem batina, indicando que ele não é mais uma figura religiosa. A escrava ficou desconfiada, mas deixou que o homem se apresentasse para Elias.

Novamente, a imagem sofreu uma mudança revelando Elias brincando com o pai ao simularem uma guerra. Os dois correm de um lado pro outro e derrotaram um exército enorme de pessoas imaginárias.

Na adolescência, Elias descobre como sua mãe engravidou de seu pai e ele discute com o homem, partindo para cima dele. Ele coloca a faca no pescoço do pai, mas sua mãe implora para que ele não o faça.

Mais uma vez, a imagem transaciona para anos depois, onde Elias havia sido admitido para ser um praça do exército. A imagem muda rapidamente, mostrando Elias ser promovido a Sargento, Segundo Tenente, Primeiro Tenente e, por fim, Capitão do Regimento de Artilharia do Recife.

Depois de receber todas essas informações, Enzo cambaleou até onde o mar formava ondas na praia da ilha dos bois. Observou que, na ponte, Elias acenava para que ele voltasse para lá. Enzo então entrou na água e o mesmo tubarão que o trouxe, logo apareceu e o levou rapidamente de volta. 

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