A casa principal da Fazenda da Boa Esperança foi organizada por Tônico de forma que a maioria dos quartos foram oferecidos para as maiores patentes, entre eles, o Tenente Mário Neves. Além disso, Tônico ofereceu para Valente, seu amigo de longa data, um quarto onde Clara também poderia descansar.
Pela janela do quarto era possível observar os soldados paulistas montando seus acampamentos enquanto amarravam seus cavalos para não fugirem. A professora arrumava a única cama que havia no aposento, mas conseguiu notar que, lá fora, alguns homens lutavam para conseguir lavar suas roupas e outros cospem a comida preparada devido ao seu péssimo sabor.
- A cama está pronta! Me ajude a arrastar essa cadeira de balanço até aqui. - Pediu Clara ao irmão enquanto apontava um local próximo a cama.
- Certo, ali? - Perguntou Valente, recebendo uma confirmação silenciosa de Clara. - Deixe que eu durmo aqui, você fica com a cama.
- Claro que não. Você vem lutando na última semana, deve estar exausto. - Falou Clara.
- Não vou mentir para você. Estou bem cansado mesmo, dormir em uma cama seria um sonho. - Respondeu Valente ao se sentar na cama.
- Sabe, eu queria me desculpar pelas coisas que disse quando você se juntou aos rebeldes. - Disse Clara ao sentar na cadeira de balanço. - Você não abandonou sua família a própria sorte, na verdade, você fez o que fez, para garantir um futuro melhor para todos nós.
- Não precisa se desculpar. Eu entendo que naquele momento, depois do M.M.D.C., qualquer pessoa que visse um familiar se juntando ao movimento, também temeria pela vida dele. - Comentou Valente.
- Eu espero que essa situação passe, o mais breve possível, acho um absurdo não podermos nos abraçar. - Lamentou Clara.
- Sim, até porque não pretendemos ficar muito tempo aqui. - Explicou o soldado - O tenente Neves acredita que a Fazenda fica em um lugar vulnerável, então tem dúvidas sobre se fixar aqui.
- Que ele seja iluminado e decida ficar por aqui por um bom tempo. - Clamou a professora antes de reparar as roupas sujas de Valente - Aquilo ali é pra lavar?
- Isso, mas deixa que eu faço. - Pediu Valente - Tive que aprender na marra a lavar roupa.
O irmão conseguiu tirar uma risada de Clara, mas instantaneamente, uma ideia foi concebida pela sua mente. Olhou para as roupas do irmão antes de ir até a janela observar a montagem do acampamento dos soldados.
- Que foi? Aconteceu alguma coisa? - Perguntou Valente, ao se virar na cama, mas não se levantou.
- Você pode até ter aprendido, mas a maioria daqueles ali estão apanhando para lavar a roupa. E aquele ali, jogando a comida fora depois que o outro vomitou. Imagino que o tempero está ruim. - Comentou Clara enquanto apontava pela janela, mas o irmão continuou na cama e não viu sobre quem ela falava.
- E daí? - Perguntou Valente, sem entender onde a irmã queria chegar com aquela conversa.
- E se...? E se eu me juntar a vocês? - Sugeriu Clara, fazendo o irmão dar um pulo na cama - Eu posso cozinhar e passar para vocês!
- Você só pode estar de brincadeira. - Esbravejou Valente - Trincheira não é lugar...
- Eu sou muito capaz de me defender, se for necessário. - Insistiu Clara, percebendo que seu irmão lhe via como uma larva frágil que seria esmagada no primeiro combate.
- E eu falo o quê para o papai, se algo acontecer com você? O que eu falo para suas filhas? - Perguntou Valente, ainda furioso. - Você não devia nem ter ficado aqui para me encontrar.
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Sete Erros
General FictionSete Erros é uma jornada pela história do Brasil que tem como pano de fundo diversos momentos: - Os dias que antecederam a visita do Santo Ofício - A criação da bandeira de Pernambuco no fim do Brasil Colonial - Um romance impossível às vésperas da...