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O Giovanni chegou perto da gente e puxou a Lavínia, civilizadamente para longe.

-Você já deu o seu show, agora vai embora. -Pude ouvi-lo dizer. 

A Lavínia não discutiu. Pelo contrário, ela deu um sorrisinho e foi embora rebolando. A Liara e o Giovanni não se aproximaram de mim e do Bernardo, mas ficaram sentados em um canto no jardim. Atentos.

Voltei a minha atenção para o Bernardo. Ele estava chorando muito, a ponto de soluçar. Eu não sabia como agir nem o que dizer. 

-Eu matei meu filho. -Ele sussurrou. 

Tive que olhar para cima, mas não deixar as lágrimas que se formaram em meus olhos, escorrerem.

-Você não sabia... -Sussurrei de volta, o abraçando mais forte. 

-Como sabe? -Ele foi ríspido. Já tinha internalizado que a culpa era sua. -Como você saberia? Eu te odiava.

-Ninguém sabia que ela estava grávida. Ela descobriu quando chegou no hospital depois do acidente. 

-Mas isso não importa, né? Eu estava dirigindo, eu o matei. 

-Claro que importa, Bernardo! -Levantei o seu corpo e o fiz olhar para mim. -Se vocês ao menos soubessem... Não teriam bebido, não estariam naquele carro... 

Ele me olhava, mas eu não via nada de bom em seus olhos, ali só tinha culpa e luto. Um luto que eu não sei como fazê-lo superar. Um luto que eu imploro que o tempo consiga curar. Sinto que algo mudou nele, para sempre. 

A vida desse Bernardo vai ser marcada por antes e depois dessa revelação. Ele nunca mais vai ser capaz de ver a vida com tanta leveza e diversão depois de hoje. Eu só espero que isso não acabe com a sua alegria para sempre. 

-Você sabia e não me contou. -Ele me acusou e isso doeu. Mas hoje eu vou deixar passar, hoje eu vou deixá-lo me atacar igual ele fazia antigamente. Não porque eu estou com medo de ser expulsa da escola, mas porque se for o único jeito dele se sentir melhor, eu não quero ser quem vai acabar com o seu alivio. -Como pôde esconder isso de mim?

-Não era um segredo meu. 

-Meu filho não deveria ser um segredo! -Ele gritou. Por sorte a música estava alta e só nós quatro ouvimos. A Liara e o Giovanni se olharam, tristes. -A vida dele sequer deveria ter acabado, antes de... -O Bernardo soluçou. -Antes de começar.

Suas palavras saíram como um tiro em meu coração. Mas não só no meu, como também no de qualquer outra pessoa que ouvisse isso. É horrível ver um pai, ou mãe, perder um filho que tanto queria ter. Mesmo nessas circunstâncias, o Bernardo parecia não se importar em ter um filho. Muitas pessoas com a nossa idade pensaria muito fácil em um aborto ou em dar para adoção, mas não esse menino parado na minha frente. Eu consigo muito imaginá-lo como um pai, impendente das circunstâncias. 

-Não há o que eu possa dizer que vá te confortar nesse momento, mas quero que saiba que eu estou aqui e vou ficar, mesmo que me mande ir embora. Eu só saio daqui se for com você e vou para onde você for. -Olhei no fundo dos seus olhos. 

-Eu estou com tanta raiva. 

-Eu não tenho ideia do que você está sentindo, mas quero que saiba que não está sozinho para passar por isso. Estou aqui e não vou a lugar algum. 

-Eu não preciso da sua pena.

-Não é pena, Bernardo. Se tem uma coisa que eu nunca senti de você, foi pena.

-Então o que? Por que não desgruda do meu pé? -Ele gritou

-Porque eu te amo. -Gritei de volta. As palavras saíram antes que eu pudesse controlá-las, mas eu não me arrependi. Embora eu não tivesse parado para pensar racionalmente sobre tudo aquilo, todos já sabiam, não é mesmo? Minha mãe com seu olhar preocupado quando me via indo vê-lo. As indiretas da Liara. A raiva do Giovanni. Os sorrisinhos da Flávia. -Porque eu te amo. -Repeti dessa vez sem gritar. 

Com as minhas palavras, o Bernardo afundou a cabeça no meu colo e chorou.

Chorou. Chorou.

E chorou.




De repente tudo mudouOnde histórias criam vida. Descubra agora