DESAPARECIDOS

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DESAPARECIDOS

        A tempestade pareceu durar uma eternidade. Todos a bordo estavam com os músculos exaustos e com fortes câimbras, pois além do esforço prolongado a noite tempestuosa era congelante. O convés estava coberto de uma grossa camada de gelo, assim como as vestes e o rosto de muitos.

        Houveram muitos gritos apavorados durante a tempestade, porém os trovões e a forte chuva impediam que fossem ouvidos. Agora que a grande tormenta havia passado já não tinham força para gritar.

        Stok e Kay eram os que estavam em melhores condições logo em seguida ao fim da tempestade se levantaram e foram em socorro aos homens ainda agarrados em alguma parte do navio lutando loucamente para sobreviver.

        Alguns haviam tido suas orelhas ou nariz completamente congelados. A maioria estava muito fraco, precisariam com urgência de uma fogueira, o que seria um tanto difícil a bordo de um navio.

        Harley se levantou para auxiliar os amigos e com ele mais três homens passaram a se recuperar lentamente.

        — Onde está o Hayden? — perguntou Harley a ninguém em particular.

        Stok e Kay se olharam abalados. Em seguida ponderam ainda em silêncio as péssimas possibilidades: morto afogado, congelado, em batalha ou capturado. Estas eram as maiores possibilidades, mas, se tratando de Hayden, eles se agarraram a esperança que estivesse ainda com vida, seja no navio, no mar ou até mesmo em mãos inimigas.

        — HAYDEN!!! — começaram a gritar para todos os lados.

        — Separem-se — disse Stok. — Procurem pelo convés e ajudem os demais tripulantes feridos e fracos.

        Eles passaram então a buscar desesperadamente por vestígios de Hayden e outros sobreviventes no mar. O temor de Stok foi enorme quando ele observou um corpo flutuando nas águas negras e congelantes. Lembrou-se que Hayden portava sua armadura superior durante o combate. Cair na água com aquilo faria dele uma âncora.

        Após buscas exaustivas pela embarcação e pelo mar, chegaram a conclusão que não havia esperança de encontrá-lo, a não ser que estivessem em poder do inimigo.

        Eles se uniram num abraço de sofrimento, temor, aperto no coração, contudo com uma pequena chama de esperança e fé.

        — É preciso seguir enfrente — disse Stok. — Muita coisa depende de nós.

        — Se temos fé em nosso destino e nossa missão, temos de seguir lutando — afirmou Kay'Lee com firmeza. Tenho fé de que o encontraremos quando menos esperarmos.

        — Sim — disse Harley apenas. Os olhos marejados e vermelhos. — Agora temos de ajudar essas pessoas.

        — Sim. Irei cuidar dos feridos e fazer algo bem quente para aquece-los.

        — Eu vou secar suas roupas — afirmou Harley.

        — Como é Harley? Vai usar magia novamente?

        — Infelizmente é tudo que sei fazer. Sem isso não vou ajudar em nada.

        — Não é verdade. Você se cobra demais. Você é muito inteligente e companheiro. Tem muitas formas de ajudar sem precisar se prejudicar tanto.

        — Vou ver como posso ajudar então — disse sem ânimo.

        Todos eles precisavam se aquecer e secar suas roupas, que estavam virando gelo em torna deles. Harley chegou a conclusão de que sem fogo e sem rouparia reservas, não sobreviveriam. Então começou a preparar um local para acender uma fogueira. Juntou tudo que pôde para impedir o fogo de alastrar para as tábuas do navio. Bacias de barro e de bronze, placas de ferro e diversos utensílios menores.

        Após juntar tudo e com a ajuda de alguns homens colocaram madeiras secas, encontradas no porão e acenderam fogueiras dentro das bacias, onde passaram a se aquecer e se secar. Kay e Stok trabalhavam próximo do fogão e lá se aqueciam e aqueciam os mais debilitados e feridos. Kay deu primeiramente a eles um vinho quente com um toque especial, uma erva e raiz que ainda possuía e era bem útil para aquecer o corpo.

        Foi o suficiente para todos os tripulantes remanescentes beberem. Agora eram um total de treze homens. Os prisioneiros no porão eram em maior número que eles próprios.

        — Stok — disse Kay com pesar e ainda mais gravidade. — Temos péssimas notícias.

        — Diga amigo. O que foi?

        — A dispensa, foi parcialmente destruída... perdemos muita água e muita comida... temos de dar um jeito de preparar o que for possível para economizar e racionar água.

        — Quanta água temos? — indagou Harley.

        — Três barris. Oito se quebraram.

        — Teremos de usar esta água apenas para beber e cozinhar — determinou Stok. — Nada de água para outras finalidades. Temos mais de quinze dias até Lenöria. Se não houver mais atraso. Irei falar com a tripulação.

        Kay havia feito o possível com os sobreviventes. Ainda assim, dois perderam a ponta do nariz, e quatro perderam partes da orelha. Destruídas pelo frio intenso.

        Stok compareceu ao local onde descansavam e se aqueciam no fogo e bradou:

        — Vocês foram guerreiros sem igual. Se estão aqui... é porque enfrentaram a morte de igual para igual. Perdemos muitos de nós. Mas estamos aqui, vivos. Isso significa que devemos continuar a lutar. Isso é estar vivo.

        Ninguém respondia e mal erguiam a cabeça. Suas mentes reviviam momentos de terror e matança de sua primeira batalha e momentos de total pavor da terrível tempestade. Mas ouviam o que era dito, e tinham a consciência que precisavam lutar. E queriam lutar pela vida até o fim.

        — Temos mais quinze dias de viagem até Lenöria. Não vou mentir ou enganá-los, não será fácil. Mas vamos conseguir — garantiu Stok. Vendo uma ou duas cabeças se erguerem para retirar de seus olhos esperança e força.

        Stok manteve a firmeza e a força que a ocasião exigia. Então prosseguiu:

        — Não vamos morrer. Vamos viajar para nosso destino, vocês terão um bom futuro em Lenöria e nós iremos vingar nossos mortos e levar cada um desses bandidos malditos a justiça.

        — Por hoje descansem bem — disse Kay'Lee. Iremos fazer preces aos deuses e ao deus dos mares por todos que foram ao seu encontro e pedir que nos guiem a nosso destino. Não iremos desistir até cumprir esta promessa. Esses piratas malditos vão pagar.

        — É isso aí! — gritou Esrik com a força que tinha, estava deitado nos cordames próximo a uma das fogueiras.

       Um sorriso se formou no rosto de Kay por ver seu mais novo amigo acordar. Esteve muito próximo da morte.

        — JUSTIÇA! — gritaram todos os demais.

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        A noite não foi fácil de passar. Enquanto Harley, exausto, dormia com os tripulantes na cabine, Stok e Kay faziam um trabalho nada prazeroso, limpando o sangue e gelo do convés, e, após fazer uma prece ao deus dos mares para cada um dos três corpos sem vida que encontraram e esconderam dos demais tripulantes para não os fazer sofrer ainda mais, fizeram a única coisa que podiam: os entregaram ao mar com pesar em seus corações e em suas mentes diversos pensamentos: de fúria a temor, de tristeza a esperança e de desolação a desejo de lutar.

 
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Grato a todos que permanecem até aqui.

Perdão pela demora em postar ultimamente, tenho tido alguns contratempos. Perdão pelos prováveis erros, lamento profundamente, não tenho podido revisar.

Forte Abraço!
       
       

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