III - O Rei Impiedoso (5)

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Era início de madrugada quando W Roman conseguiu encontrar o rastro do Boneco Espantalho, assim foi nomeado pelos jornais o assassino de crianças nos anos setenta. Roman sempre foi um homem de ação e em relação a criminosos cruéis ele não possuía nenhum remorso tanto quanto cautela em capturá-los. Geralmente era possuído por uma fúria cega que por muitas vezes parecia que envenenava sua mente. Certamente se não fossem as intervenções de seu parceiro em situações como essa ele já teria matado intencionalmente alguém ou provocado sua própria morte. As pistas o guiaram até o cais do porto, bem afastado da cidade. Ele estacionou seu carro um pouco distante e como um gatuno invadiu o lugar sem ser notado pelos vigias. Depois de alguns minutos, Roman percebeu a ausência de qualquer outro vigilante nas redondezas. Com a lua muito clara e o cais bem iluminado não foi difícil avistar o suspeito seguindo para uma das docas particulares. Na entrada da cerca vê a placa escrita: AD HOUSE, ele olha para seu relógio de pulso marcando três horas e cinquenta e oito minutos. Sabe que o protocolo é esperar seu parceiro, mas Roman nunca foi muito capaz de seguir regras, ainda mais quando está no calcanhar de um matador de crianças. Ele olha para as grossas correntes que fecham a cerca, observa o grande cadeado que lacra as correntes. Roman é um homem muito alto de aparência extremamente rústica, um bruto por natureza, um sujeito que por toda a vida acreditou e dependeu da sua força física e da sua capacidade de nunca desistir. Nenhuma outra pessoa normal seria capaz disso, mas com suas mãos gigantes ele consegue arrebentar as correntes e sem qualquer reserva entra sem aguardar seu parceiro ou pensar no que pode encontrar do outro lado. Quando percebe que quanto mais caminha menos permanece iluminado o lugar ele tira da parte de trás de seu colete um martelo de aparência estranha, feito de algum metal pesado, que estava escondido pelo seu paletó xadrez marrom. Não demora muito para o escuro tomar conta do local. Agora ele se confia plenamente em seus instintos e sentidos aguçados, na realidade esse é o momento que mais gosta. O momento da caçada. Seu paletó e sapatos são deixados para trás e como um predador atrás de sua presa segue o rastro farejando o percurso realizado pelo suspeito. Ele sente a adrenalina percorrer seu corpo, a tensão de seus músculos, as veias pulsando com seu coração. Seu instinto lhe guia até onde quer chegar, o odor forte lhe confirma, os sons que consegue ouvir, agora é só questão de segundos para…

– Você realmente acredita que é bom, não é mesmo?

O tom era educado e a voz jovial, apesar do comentário ser de desdém. Romam vê um homem de costas para ele, de altura mediana, magro, despido, utilizando somente um avental parecendo de açougueiro, calçando luvas negras que vão até próximo de seus ombros e galochas de mesma cor. Sua cabeça está coberta por um tipo de capuz e está próximo de uma mesa de metal de inox. Pelo odor, mesmo sem precisar ver, ele já sabe que ali em cima se encontra depositado um cadáver. Ele responde ao desdém com firmeza:

– Nunca imaginei que o monstro que caçava fosse tão jovem assim.

– Esse é o mau da geração de meus pais. Enxergam inocência onde não há e não percebem o mal onde existe, mas você...

O suspeito se vira para Roman revelando a imagem estampada de seu capuz que usa. Buracos mal cortados para os olhos, narinas de caveira pintadas e um sorriso distorcido que vai de orelha a orelha cobrindo quase toda a máscara, porém isso não causa nenhuma perturbação a Roman, mas sim o avental coberto de sangue que lhe deu nojo pela raça humana naquele instante. A voz jovial prossegue no mesmo tom educado sem desdém dessa vez:

– Você tem algo de podre aí dentro. – Ele aponta em direção ao coração dele. – Que o faz diferente dos outros.

Ele olha para o martelo que Roman segura com força com sua mão esquerda:

– Mas me responda uma coisa, homem do martelo. Acreditou mesmo que me deteria sozinho?

– Com o que vim fazer aqui prefiro deixar meu parceiro fora disso.

– Pois esse, meu amigo, foi seu segundo erro.

Roman deixa escapar uma expressão de surpresa enquanto o jovem fala:

– O seu primeiro erro foi o de me encontrar.


...

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