IX - Todos os Nossos Pecados (6)

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A expressão de Johnny de curiosidade está estampada enquanto ele lê um livro de capa dura sem nome que possui a gravura de um crânio humano mordendo uma serpente. Carmem o observa movendo os lábios sem emitir qualquer som, mas não reconhecem o idioma, mas parece ser algo do continente africano, provável que seja um dialeto.

Seus olhos se desviam de seu parceiro para Dorothy e Derik que voam em torno deles meticulosamente formando um oito. Sua voz soa aborrecida:

- Pode me dizer o que diabos essas moscas estão fazendo, Johnny?

- O quê? Ah, sim. Estão nos protegendo de sermos espionados. Bloqueando qualquer tipo de sinal, filmagem, gravações de som etc.

- Nós não somos espiões, parceiro.

- Sim, de fato. Mas não podem evitar, foram desenvolvidas para isso.

- Pelo tal de Juarez. Sei. Ele também foi parceiro do Branco?

- Não. Foi da época em que o B fez parte de um grupo que atuava na Europa.

- De espionagem?

- Não, não. De contra espionagem na verdade - Johnny para de ler o livro e olha seriamente para Carmem. Ao perceber a ação dele, ela pergunta:

- Que foi Johnny?

Ele fecha o livro e se vira para ela:

- Creio que a essa altura do tempo você já percebeu que possuo uma necessidade ímpar de adquirir informações e conhecimentos, não é?

- Sim. “Conhecimento pode definir se você vive ou morre". Me disse algo assim em nosso primeiro caso.

- Uma forma mais enfeitada para dizer que conhecimento é poder - Ele se afasta um pouco, apoia seu cotovelo na base de madeira que sustenta o livro que estava lendo - Preciso lhe contar algo, Carmem.

Sua voz soou séria. Carmem olhou para ele e em seguida buscou em volta um lugar para se sentar. Ao ver a poltrona de couro vermelha, perto da base de madeira do livro, foi até ela e se sentou. Pareceu cansada. Deu uma analisada na poltrona enquanto passava as mãos nos braços dela:

- Vermelho. Antigo. Conservado. É a cara de Branco.

Os dois se encaram em silêncio por quase um minuto até ela falar novamente:

- Manda ver, parceiro.

- O B andou acompanhado suas ações pelos seus registros militares. Diria até que estudou você.

- Levando em conta que acabei me tornando sua parceira isso não é de surpreender.

- De fato.

- Mas…?

É… - Ele faz uma pausa - Mas há um importante detalhe que inevitavelmente trás questionamentos.

- Acerte direto no alvo, Johnny - Ela fala com leve tom de impaciência.

- Seu pai e Branco trabalharam juntos na Europa.

- Hum. Isso surpreende, mas pelo fato de Branco nunca ter me dito a respeito, mas não é nada para causar um choque.

- É - Jonhhy caminha até Carmem, ela muda de posição, cruza as pernas apoiando os cotovelos em seu joelho com uma das mãos segurando seu queixo. Ele não disse na hora (e nunca falou depois), mas naquele instante ela transmutou de uma militar rígida para a personificação de uma linda mulher transbordando sedução. “Uma característica dos bestiais?” Pensou.

Carmem o encara com seus olhos vívidos:

- Mostre logo parceiro.

Ele sorri:

- Quando viu que encontrei?

- Pouco antes de começar a balbuciar em um dialeto aborígene. Quando olhei para Dorothy e Derik você o guardou na manga de seu casaco.

- Você me surpreende. Afirma ser alguém que só atua em operações táticas ou age como se fosse somente um soldado para os campos de batalha, mas consegue de forma natural espionar outra sem que ela perceba. Isso é talento, Carmem. Talvez tenha se limitado demais.

- E você está enrolando, parceiro. Anda, deixe-me ver esse naipe que tem consigo.

Jonhhy retira uma foto da manga de seu casaco, olha para Carmem, depois olha para a foto e a entrega.

Ela observa a fotografia, meio desgastada, mas bem visível no que lhe foi registrado. Nela Carmem reconhece seu amigo e mestre Branco ao lado do homem mais importante de sua vida, seu pai Gohard, um dos poucos homens em que mesmo após sua morte sua presença se mantém firme pelo peso de seu nome. Seus olhos ficam presos na imagem dele como se estivesse hipnotizada. Demorou um tempo até Carmem ver o terceiro homem ao lado dele. Ela não o reconheceu pela fisionomia, mas sim devido ao traje metálico por baixo do sobretudo negro, o famoso Steel Blade, o maior de todos os soldados da Guarda Especial, o pai de Johnny.

“Órfãos dos heróis de ontem” - As palavras surgem como assombrações em sua mente.

Ela olha para Johnny, se levanta e lhe devolve a foto:

- É coincidência demais para ignorar.

- Eu nunca acredito em coincidências ou em destino como o B. Esse nosso mundo é impregnado de segredos e esses segredos geralmente possuem terríveis pecados.

Um assobio quebra a conversa entre os dois. É Dallas que se juntou a eles. Johnny abre a palma da mão para a mosca robô pousar. Assim o faz e volta a assobiar novamente. Carmem pergunta:

- O que ela diz?

- Que Lady Lucy entrou em contato. O bloqueio de Dorothy e Derik não permitiu chegar até mim a transmissão.

- Lady Lucy?

- Minha ajudante virtual.

Ele assobia para Dorothy e Derik. Elas voam até Dallas. As três se juntam formando um único inseto e voam para o ombro de Johnny. Em seguida ele fala em voz de comando:

- Lady Lucy. Se apresentar.

A voz de uma jovem sai do inseto:

- LADY LUCY SE APRESENTANDO.

- Prosseguir com a mensagem Lady Lucy.

- AFIRMATIVO. MENSAGEM: LOCALIZAÇÃO SOLICITADA ENCONTRADA. AGUARDANDO PRÓXIMO COMANDO.

Johnny olha para Carmen:

- Pergunto novamente. Está pronta, parceira?

Ela o encara sério, mas não consegue evitar uma leve empolgação em sua voz:

- Dessa vez eu dirijo, parceiro.

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