VII - Aquelas Velhas Canções (8)

11 4 9
                                    

Johnny se manteve quieto e mudo diante de Carmen, seus olhos distantes ficaram perdidos em inúmeros pensametos recorrentes a pergunta feita por sua parceira. Ambos já estavam na segunda xícara de café até ele decidir abrir a boca:

– Eu… Eu tenho que confessar que um lado meu se empolga com seu interesse, de presenciar essa sua atitude de ir além das regras, mas também sinto certo temor em trazer a tona algo que eu mesmo evito falar com outra pessoa.

– Sei que não tenho grande conhecimento sobre as fazendas, mas sei o suficiente para ter noção do quanto é errado o que ocorre. E também sei que você já esteve em uma delas.

– “Errado” não define nem de longe o que ocorre nas fazendas, Carmen. – Ele ergue a xícara de café e a mantém próxima de sua boca. – Quando fiquei órfão e fui enviado a uma das instituições para jovens sem lar, em seguida me encaminharam para uma das fazendas após o teste de aptidão. – Ele dá um longo gole e fica olhando para o fundo de sua xícara. – Apesar de hoje saber que o que sei e quem sou foi devido às experiências que vivenciei nos Campos Verdejantes eu guardo marcas profundas até hoje.

Carmen permanece atenta, mas demonstra certa inquietação, o que Johnny percebe e o faz sorrir:

Não se pode fugir daquilo que sempre retorna. – Fala em voz alta para si mesmo. – Pois bem, vou lhe contar uma história, uma história em que nos faz duvidar da veracidade, mas que não desaparece de nossa mente. Tem haver com um jovem, órfão como todos os outros, sem nome, porém se intitulava como o Rei Impiedoso.

Seus registros são vagos, seu passado era cheio de discrepâncias e ao contrário de mim ele foi enviado a várias instituições para jovens problemáticos antes de acabar indo parar em uma das fazendas, que antes era chamada de Internato Omera, mas que ficou mais conhecido como o Instituto ‘O’. Entre nós, me refiro aos internos, tínhamos uma forma íntima de chamar de o Lar dos Quebrados. As fazendas eram específicas com quem alojava, ou melhor, com quem aprisionava, e a única intenção era de escolher os melhores recrutas para servirem a Central e o Escritório, agentes escolhidos por Otelo através do doutor Serra.

– Já li sobre ele, foi encontrado morto em seu escritório. Causa da morte indeterminada.

– Arquivo falso, Carmen. Ele foi assassinado e para mim tem haver justamente com o jovem da história.

– O tal Rei Impiedoso? Por que ele se intitulava assim?

– O Rei deve ser por ego, mas o Impiedoso, esse serviu como um manto diante do que havia cometido ainda jovem.

– Um assassino prematuro?

– Sim… Antes de ser levado ao Lar dos Quebrados ele fugiu de todas as instituições que foi parar e nesse período ele havia cometido nada menos que vinte e sete homicídios, todos com armas brancas e sempre múltiplas. Eu tentei encontrar mais registros sobre ele, nome, quem foram seus pais, onde nasceu, mas tudo acabava em becos sem saída.

– Difícil acreditar que isso não foi proposital.

– Exatamente.

– E qual é a história do Rei Impiedoso?

– É a de como um jovem com talentos para a morte deixou de ser rei e virou escravo.


A HORA ZEROOnde histórias criam vida. Descubra agora