VII - Aquelas Velhas Canções (9)

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Um homem caminha por uma sala escura, para diante de uma escrivaninha que está pouco iluminada pela luz da lua que invade o recinto por uma janela circular. Acende a pequena iluminaria que está na sua frente, puxa uma cadeira pesada de madeira escura e se senta. Da terceira gaveta do móvel retira um livro de couro negro com os dizeres marcados em alto relevo:

Os Contos dos Condenados.

Abre o livro, vira as três primeiras páginas e na quarta para. As letras do livro são feitas a mão, no título está escrito O Menino que Queria ser Rei.

Ele lê para si mesmo:

– Uma vez houve um menino que ficou sozinho e perdido após a partida de seus pais do mundo dos homens. Vagando sem propósito o destino decidiu lhe traçar um caminho, um caminho doloroso, um jardim de rosas sem rosas, somente com espinhos.
Como seu grito fora abafado ainda quando menino, do mundo ninguém o conhecia e assim sem ninguém ter conhecimento de seus planos ele faria do mundo seu reino e de seu reino o seu mundo. Um reino de versões desfiguradas de sua utopia distorcida, um caos desejado de forma inconsciente, onde no seu novo mundo todos seriam seus súditos, prisioneiros como ele de um relógio quebrado. Com mais outros ele realizaria seu sonho tenebroso, porém mal sabia que no seu ardiloso plano ele mesmo destruiria tudo aquilo que sua fé respondia.

Ele encerra a leitura e vira a página. Pousa as mãos sobre a escrivaninha, fecha os olhos, aspira e respira lentamente. Abre os olhos e com a mão direita vai até a gaveta onde se encontrava o livro e pega uma caneta dourada. Olha para a folha em branco e começa a escrever falando em voz alta:

– Eles eram três, sempre são três, e três sempre serão. Um deles é um hábil ardiloso, a outra uma fera feroz, o último uma raposa das neves, o maestro misterioso. Nem mesmo eles sabem, e como poderiam? Mas os três caminham para o grande combate contra o severo rei, uma luta antiga com inúmeras versões e mesmos espectadores, um sonho dentro de um sonho cheio de terríveis e assustadores segredos. Segredos que fazem as engrenagens do nosso mundo girar e até parar, mas que nunca deveria voltar.
E quem virá a vencer afinal?

Sua mão para de mover a caneta, ele lê sussurrando o que acabou de registrar. Ao finalizar a revisão escreve acima do texto, Os Cavaleiros Cinza, Negro e Branco. Seguidamente fecha o livro e juntamente com a caneta o guarda novamente na gaveta da escrivaninha. Se levanta, desliga a iluminaria, posiciona a cadeira de forma como estava antes e caminha pela sala, que é de aparência descuidada, de paredes de pedras e cheia de prateleiras repletas de livros de couro de diversas cores e tamanhos. Próximo de uma grande porta de madeira, com a parte superior oval, há um armário de cedro com portas de vidro, dentro dele estão livros devidamente alinhados. Todos possuem títulos gravados nas bordas e seguem respectivamente nessa ordem:

Ecos dos Antes de Nós, A aniquilação dos Extraordinários, O Jogo Secreto do Destino, Herdeiros das Maravilhas e Maldições, A Sociedade Invisível dos Sete, A Ordem Silenciosa dos Relojoeiros, A Batalha dos Heróis Desconhecidos.

No último livro ele para e o encara com um olhar pensativo. Nele está escrito:

O Renascimento do Terrível Rei Impiedoso.

Com a palma da mão toca o vidro, abre as portas e pega o livro. Olha em volta e ao fitar uma poltrona confortável de veludo se acomoda nela, liga um abajur que se encontra ao seu lado e inicia a leitura.

Do lado de fora uma forte chuva se anuncia por trovões e relâmpagos, ele olha para a janela:

– Uma tempestade. Nada mais seria tão apropriado para definir o que estar por vir.

E retorna ao livro.



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