XI - Um Mundo Além de Nós (1)

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"O fim é tão certo quanto a chegada da noite, como tão certo é o recomeço que vem com o alvorecer."


Um segundo depois do outro. O eterno e incansável trabalho do passar de tempo. O tempo que zomba de nós, homens e mulheres feitos de frágil carne que enfraquece e apodrece ao fim de cada existência. Os ponteiros seguem, eles marcham nos arrastando pela longa estrada, os ponteiros fuzilam a todos nós.
Não possuem misericórdia nem remorso e obedecem ao seu mestre incontestavelmente realizando a mais severa lei da vida. Que tudo segue como a correnteza de um rio e como tal de forma inviável não há retorno, que a cada passo que deixa um eco expande sua marca e que a cada passo realizado não há mais como contornar. E o mundo segue deixando para trás aqueles que os ponteiros silenciaram abrindo espaço para os que acabaram de chegar. Morre o velho para vir o novo.

'Nem sempre.'

Foi o pensamento de um jovem ao concluir a leitura do pequeno texto abaixo de um quadro em exposição no museu Acrópole que se encontra no centro da cidade, próximo do parque onde costuma correr diariamente.

Sua altura é mediana, aparentando entre quatorze e dezesseis anos, cabelos pintados de rosa claro, usando casaco e calça de motoqueiro. Aos seus pés está uma mochila de costas com estampa de várias raças de cães.

Ele olha a pintura, observa bem as pinceladas e as combinações das cores, analisa a forma como a luz se destaca devido às sombras. Em seguida observa atentamente a imagem que foi retratada pelo autor por suas hábeis mãos e vê com clareza que, aquela considerada obra de arte, é na realidade um retrato do tormento de seu criador, uma forma de mostrar aquilo que não é visível aos olhos.

'A dor que geme e range, a dor que se oculta nos locais onde se guardam segredos. Os piores segredos. '

O jovem já sabia que ela viria a sua procura antes mesmo de chegar á rua. Que não seria para uma visita amigável, que não viria sozinha.

Ele pega seus fones que estavam presos em sua cintura e os põe em seus ouvidos. Olha para o display de seu celular e escolhe um de seus álbuns com músicas de artistas de décadas passadas. A primeira faixa é de Frank Sinatra cantando ao vivo My Way. Ele caminha até a grande vidraçaria que se estende por todo o salão permitindo que todo o ambiente seja completamente invadido pela luz do dia. Senta-se no batente de uma das vidraçarias e aguarda. Alguns minutos depois passos ecoam na sua direção. De cabeça baixa sussurra:

- Quatorze segundos...

Ele desativa o player e retira os fones deixando apoiados em seu pescoço. Os passos se tornam mais fortes. São dois pares de botas, um ele reconhece de início, é leve, suave, porém o assoalho não permite que haja silêncio, o outro par é mais intenso, inseguro e há um ritmo familiar nele.

Uma voz feminina pronuncia seu nome:

- Max - Sua voz é doce e hipnotizante. Ele adora ouvi-la falar mesmo tendo conhecimento que nesse ato reside perigo.

O jovem ergue a cabeça. Seus olhos se deparam com Charlotte parada diante dele com seu chapéu cuco e suas vestes com cores em harmonia. Ao lado dela está uma moça de olhos grandes azuis e curiosos, cabelos cheios, longos, ondulados de um louro pálido e brilhante.

Ele toca sua própria face ao sentir um leve rubor.

Charlotte vai até ele sorrindo e de braços abertos:

- Olá meu querido - Em seguida lhe dá um abraço carinhosamente - Deixe-me lhe apresentar minha acompanhante. Seu nome é Alenora Justice W Prince.

- Filha do professor Walker Prince?

- Sim - Alenora responde entusiasmada - Conheceu meu pai?

- Fui seu aluno quando ele lecionava na faculdade de Acrópole.

- Do grupo dos avançados?

- Ele te falou sobre nós?

- Sim. Ele costumava me contar sobre seus trabalhos, sobre as aulas, até mesmo dos tempos que ele era explorador. Nossa, adorava suas histórias.

- Era a melhor parte de suas aulas. Havia uma grande e genuína satisfação e entusiasmo quando ele nos entretia com suas aventuras.

- Me alegra que vocês de deram bem - Diz Charlotte interrompendo - Pois vocês irão precisar trabalhar juntos.

- Como é? - Pergunta Alenora nitidamente surpresa. Ao perceber que sua reação fora um tanto exagerada ela abaixa os olhos envergonhada.

Charlotte a olha com a um sorriso no canto da boca:

- Não pensou mesmo que simplesmente a jogaria ao circo para enfrentar os leões sem nem saber manejar uma espada, não é?

- Hã? E será ele quem irá me treinar?

- Não querida. Vocês irão treinar juntos ajudando assim um ao outro - Ela olha para Max - Meu adorável Max aqui é talentoso por natureza, autodidata e inovador, mas... Não é capaz de trabalhar com outra pessoa o que acaba sendo seu maior defeito e no nosso ramo uma falha dessa magnitude pode nos levar a um fracasso em que o resultado pode ocasionar em um fim irremediável.

- Ela fala de morte - Diz Max sorrindo enquanto coça seu queixo - Escuta Charlotte. Sei que devo obedecer às ordens de minha tutora, mas também sei que sua amiga não está registrada no Escritório ou na Central. Então qual justificativa para sua presença e como iremos trabalhar juntos, como afirmou agora a pouco?

- De fato. Mas não preciso de permissões de nenhum deles para treinar um novo soldado para integrar as Sombras.

Max solta uma risada:

- Céus. Você não falha mesmo. Tudo bem, tudo bem, quero ver onde isso irá chegar. Para mim será uma ótima experiência de qualquer jeito, então sigamos com seu plano - Ele olha para Alenora - Certo, parece que agora seremos parceiros por enquanto. Em que nível você está? Já fez algum treinamento? Não creio que tenha vindo de algum grupo militar ou de uma de nossas famigeradas Instituições. De algum Internato da Europa, talvez?

Alenora não responde de imediato, fica parada olhando para ele e para Charlotte. Após alguns segundos ela respira fundo:

- Não tive treinamento algum, Max. Na realidade a única razão para eu estar aqui é porque busco respostas e a razão de Charlotte ter me trazido, creio eu, seja pelas habilidades que herdei de meu avô paterno.

- E quem é seu avô paterno?

- Jacob Walker Prince II. Mas você deve conhecê-lo pelo seu codinome Senhor Branco.

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