X - Atravessando o Espelho (5)

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Gohard fecha os olhos e se prepara, será sua vez ou Blade novamente. Ele ignora seus sentidos. São inúteis nessa ocasião, somente seu instinto lhe proporciona alguma chance de vitória.

É possível sentir os deslocamentos do ar, variam entre perto e longe, entre alto e baixo, esquerda e direita, é tão veloz que às vezes parecem acontecer ao mesmo tempo. Talvez seja o eco.

Seus músculos enrigessem em todo seu corpo, sua massa corporal parece aumentar de volume, suas veias se dilatam e se destacam como raízes de árvores, garras ocultas se revelam de seus dedos grossos, seus caninos se prolongam ficando pontiagudos e afiados e ao abrir seus olhos amarelos suas pupilas encolhem abruptamente.

'Acima de mim.'

A mão forte de Gohard pareceu segurar o ar, mas foi um braço que ele firmou com suas garras e o grito denunciou que quem os atacou agora está ferido. Não houve tempo para tentar fugir, apesar de seus talentos não conseguiu se livrar das garras e preso a Gohard não tinha capacidade para realizar sua façanha. Com a outra mão ele agarrou seu pescoço para incapacita-lo de qualquer outra ação e ao ver que não se passava de um garoto se surpreendeu com a brutalidade presente em ambos.

Sua voz soa feroz:

- Blade. Como está nosso amigo?

Blade vê Branco se levantando com uma das mãos apertando a nuca e a outra guardando seus óculos que haviam caído:

- Ele está bem. Um de vocês pode me dizer o que acabou de acontecer aqui? Como esse jovem nos acertou tão facilmente?

- É um Deslocador, meu amigo - Responde Branco - Um dos bons, mas ainda inexperiente. Se fosse mais velho ou se tivesse tido treinamento não teríamos saído daqui intactos. Talvez nem vivos.

- Um Deslocador... Um que não está registrado. A Central nem deve saber de sua existência.

- De fato - Diz Gohard - Mas será que poderiam me ajudar? Não vou conseguir mantê-lo assim por muito tempo.

- Eles são instáveis e imprevisíveis - Diz Blade - A única forma que conheço de captura e aprisionamento é com o uso de fortes sedativos. Mas tenho que confessar que nunca enfrentei um. E estou impressionado como conseguiu detê-lo somente com as mãos.

- Dor, meu caro - Responde Gohard - A dor sempre funciona com qualquer um.

- Porém não por muito tempo - Diz Branco - Põe ele para dormir Blade. Uma descarga elétrica funcionará. Você terá que aguentar o tranco Gohard, já que tem que segurá-lo para ser atingido.

O jovem tenta se soltar ao ouvir as intenções deles, mas não possui forças contra seu oponente. Ele tenta falar algo, mas as mãos fortes em sua garganta o impede.

Blade se aproxima dele, contrai seu braço direito e em um movimento rápido toca o meio de suas costas com a palma da mão. Um clarão surge entre os dois, seu corpo se contrai para trás por um segundo e é jogado para um lado enquanto Gohard foi arremessado para o outro.

Branco vai até o Deslocador e com a mão descalça verifica sua pulsação. Olha para Blade que caminha até Gohard:

- Ainda vivo e inconsciente. E o grandão, como está?

- O “grandão” ainda está vivo - Responde o próprio Gohard se levantando devagar - E como acredito que não temos nenhum sedativo aqui conosco temos que pensar o quê faremos com nosso anfitrião, assim que acordar escapará num piscar de olhos.

- Como não podemos contatar a Central ou o Escritório - Diz Blade - Estamos limitados em nossas opções.

- Se fosse um dos malditos degenerados que já me deparei eu iria sugerir ceifa-lo,mas olhe só para ele, é apenas um garoto e nem sabemos o porquê de sua presença nesse buraco - Fala Gohard.

Branco olha para o jovem e compreende os pensamentos de Gohard. Tem conhecimento que seu amigo possui uma filha que ainda está nova e como Blade, que também é pai de um garoto, sabe que há sentimentos envolvidos em relação a essa inusitada situação.

Ele toca no rosto do jovem com a mão que está sem descalça, analisa da sua maneira no intuito de descobrir alguma informação sem a necessidade do uso de palavras, já que é inviável poder interroga-lo sem a presença de algum agente Mental que pudesse invadir sua mente conseguindo impedir que escapasse.

- Alguma coisa? - Pergunta Blade.

- Sua mente é caótica, está absolutamente perturbada, é como se tivesse dividida após uma colisão. Não consigo compreender direito, preciso de mais tempo.

- Tempo é justamente o quê não temos Branco - Fala Gohard impaciente.

- Ok. Vou tentar ser mais agressivo.

Branco retira a outra luva e segura o crânio do rapaz com as duas mãos, deposita seus polegares no meio da testa, fecha seus olhos para se concentrar, há um esforço nítido em sua face, como se exigisse uma grande força física para tal realização. Ele cerra seus dentes e seu corpo se contrai como se fosse invadido por uma descarga elétrica.

Seus olhos de lua cheia despertam para uma grande sala escura de bizarra arquitetura. Há janelas fechadas de modelos e tamanhos diferentes espalhadas por todo o imóvel, escadarias nas paredes e no teto que vão para aberturas que parecem não ir a lugar algum. Os móveis aparentam serem antigos, mas não consegue reconhecer de que época ou qual civilização, no centro da sala há uma enorme mesa de pedra negra como carvão. Seus pés são de metal fosco, acinzentado e suas cadeiras longas, estreitas e de um vermelho vivo como sangue.

Ele caminha até a mesa, seus passos não ecoam, porém consegue ouvir os batimentos de seu próprio coração. Sua mão esquerda toca a superfície da mesa.

Fria. Fria como se fosse gelo.

Próximo da mesa se surpreende com uma lareira de tamanho descomunal que não havia percebido. Sua aparência incomum combina com a estranha ambientação, e como em todo esse lugar existe nela uma sensação de gravidade, algo que contra a sua vontade e de forma anormal o atrai.

Branco esquece-se da mesa, esquece-se de onde está e a razão. Caminha até a lareira que o chama de maneira íntima e sedutora. Um intenso fogo surge em seu interior, um fogo com chamas que possuem formas que se movem devagar bailando entre cores que fogem do real. Ele consegue ouvir sussurros vindos das chamas, sussurros que cantam seu nome, seu verdadeiro nome:

WalkerWalker Prince…”.

Seu olhar se tornam prisioneiros das chamas que mudam de cor, são cores que ele nunca presenciou antes, nem saberia como descrever ou se atreveria dizer seus nomes. Suas mãos se elevam em direção às chamas e lentamente caminha até a lareira.

...

A HORA ZEROOnde histórias criam vida. Descubra agora