V - O Legado de Nossos Pais (5)

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Pela janela da limusine o Senhor Branco admira um falcão planando no céu que se encontra acinzentado anunciando a chegada da noite. Ele muda sua visão para dentro da limusine e olha seus acompanhantes, primeiro para os dois grandalhões, Alovitch e Anavir, sentados á sua frente, depois para Juarez que está ao seu lado direito. Seu amigo o encara e Branco lhe responde com um sorriso de lábios cerrados, em seguida fica sério ao visar Dalton, o homem carrancudo de aparência primitiva, que está sentado no banco do carona enquanto o motorista, um homem pálido, de cabelos e barba tão ruivos que chegam a ser laranja, o observa constantemente pelo retrovisor.     

Nenhum deles falou nada desde que entraram no carro e a atmosfera permanece tensa desde a saída do hospital. Branco olha para seu relógio de bolso de prata polido que se encontrava em sua mão desde o quarto:

– Uma hora e dezesseis minutos.

Todos o olham, até mesmo seu amigo, e sem parecer que se deu conta ou se importou com isso prossegue:

– Pelo percurso em que estamos indo falta mais de duas horas de estrada, não? - O motorista desvia o olhar. – Posso afirmar que vamos para uma das… Casas de campo, vamos dizer assim, de Otelo.

Dalton faz uma expressão de desaprovação, mas uma vez Branco parece não se importar e prossegue:

– Como sei que ele não sai mais de seu edifício no centro a quase uma década, certamente quem nos aguarda é o cão fiel dele.

– São muitas afirmações, senhor. - Responde o motorista.

– O que eu disse até agora não é nem a questão onde quero chegar.

– E onde pretende chegar com todas essas palavras, meu caro senhor Branco? – Pergunta Dalton com seu eterno semblante de mau humor. Branco deixa escapar uma curta e leve risada (não conseguiu evitar):

– Onde pretendo chegar, meu caro… É… Se estamos sendo levados de fato para um encontro ou para o matadouro, visto que o cão de Otelo adquiriu sua fama devido aos seus talentos homicidas, e com isso, creio que é compreensível minha palavras, não?

– Sim. É bem compreensível, contudo não há necessidade para tal pensamento ou qualquer preocupação. Acredite, não correm perigo algum. – Branco o encara enquanto Dalton o olha de soslaio:

– Por motivos que desconheço senhor Otelo possui interesse nos senhores.

Nos senhores? – Pergunta Juarez surpreso.

– Exatamente, senhor Juarez. O senhor entrou no veículo, não foi?

– Sim… Lógico, mas estou apenas acompanhando meu amigo...

– Conhece as regras, senhor Juarez. Conhece o jogo.

Todos se calam trazendo o silêncio novamente. Seguem pela estrada se afastando cada vez mais da cidade, indo para as áreas verdejantes dos campos, rumo ao destino do território do cão fiel de Otelo, o homem que outrora era chamado de W Roman, o guerreiro do martelo de pedra.

Branco retorna a olhar para a janela e se surpreende em ver o falcão que avistou antes planando alto na liberdade dos céus, na harmonia com os ventos, em sintonia com a natureza, sintonia que a raça humana perdera a tempos e que jamais recuperaria outra vez.

A HORA ZEROOnde histórias criam vida. Descubra agora