IX - Todos os Nossos Pecados (10)

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A chuva começa a diminuir, apesar dos trovões estrondarem violentamente e os relâmpagos serem intensos iluminando os céus e a terra.

Um carro percorre a estrada para as províncias em alta velocidade. O olhar de Carmem permanece sério desde que saíram dos limites da cidade. Johnny observa de forma concentrada para o display de um aparelho de um smartphone que mostra um mapa com coordenadas de latitude e longitude. Ele olha para sua parceira:

- Há um desvio para a esquerda a dezoito metros á frente. É um terreno acidentado, mas diminuirá nosso tempo de percurso em mais de trinta minutos.

- Ok - Responde e acelera mais.

Jonhhy olha para Carmem, mas nada diz. Sem desviar a visão da estrada ela fala com ele:

- Por que Brasco?

Ele não tira os olhos do display:

- Quando concluí meu tempo no “lar dos quebrados” fui enviado diretamente para a área de investigação de arquivos. Era um serviço burocrático na realidade, já que nunca ia a campo.

- Você foi dos Internos?

- Sim. Trabalhei diretamente para a Central. E ao contrário do Escritório não há liberdade em escolhermos nossa alcunha.

- Vou entrar no desvio, se segure - Carmem fala em tom sério. Ela ainda conduz o carro em alta velocidade e faz a curva sem hesitar ou reduzir.

Jonhhy a observa atentamente esquecendo-se do aparelho em mão e prossegue:

- Assim que entrei houve um rumor devido ao meu pai. O fato de ser seu herdeiro, único filho que se tenha conhecimento. Creio que saiba do que estou falando Carmem, afinal você é a filha do grande Gohard, o leão de Roma. Então sabe como os outros te veem, de como surge uma expectativa sobre nós.

- Quando estava no Internato na Europa não havia preocupação com isso. Apesar do regime de treinos duros, posso afirmar que foi a época mais tranquila de minha vida.

- Sempre tive curiosidade para saber sobre essas “Escolas” para jovens como nós.

- É. Não sei lhe dizer se de fato era bom ou ruim, só posso fazer comparações com outros períodos de minha vida. E como lhe disse antes, foi uma época tranquila, o oposto de meu período como militar.

- Outra curiosidade que tenho - Diz sorrindo.

Carmem olha para ele e pergunta:

- E por que o nome Johnny?

- E o porquê do nome Carmem? - Responde ainda sorrindo.

Ela faz uma cara feia, sorri e responde:

- É o nome da cidade onde meus pais se conheceram.

- Hum. É uma razão bem emotiva.

- Tudo é emocional, Jonhhy. Por mais que tenhamos sido treinados, agimos em resposta ao que sentimos ou agimos para termos controle sobre nossas emoções. Sentir algo é inevitável.

- Não sei se estou cem por cento de acordo com suas afirmações, mas acredito que não esteja longe de uma verdade - Ele volta a olhar para o aparelho - Mais a frente há outro desvio, é um declínio, o terreno é bem acidentado, mas nos fará chegar bem mais rápido que seguindo essa estrada que contorna as partes altas.

- Ok. Melhor se segurar, parceiro. Não tenho intenção de ser suave ou cuidadosa.

Aproveitando que a pista está em uma reta, Carmem acelera o carro novamente, faz uma curva brusca e segue pelo caminho indicado por Johnny. O carro prossegue sacolejando por uma descida íngreme onde terra molhada, pequenas pedras e folhas acertam o veículo. Ao se desviar de alguns troncos de árvores e plantas elevadas ela fala alto:

- Belo atalho, parceiro.

- Eu disse que era bem acidentado.

- Você sabe que a qualquer momento podemos capotar, não é?

- Bem… Foi um risco calculado.

Os dois começam a dar risadas como se tivessem escutado uma piada. O sol começa a surgir no horizonte dissipando as nuvens juntamente com o resto da chuva e a luz, apesar de ainda estar pálida, consegue espantar o assombreado da noite trazendo a harmonia após a funesta tempestade.

A HORA ZEROOnde histórias criam vida. Descubra agora