VII - Aquelas Velhas Canções (6)

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Apesar do desconforto nítido de Juarez o desjejum ocorreu de forma amigável, chegando a aparentar um encontro de velhos colegas que estavam a relembrar dos velhos tempos em meio a risadas e histórias do passado. Em outra situação seria somente isso, recordações seguido de despedidas, contudo a presença de Branco e seu amigo nesse local construído a base de sangue e ossos revelava a verdade temerosa, o fato de serem, de forma inegável, prisioneiros e não hóspedes e que não havia como determinarem o que estava por vir, se virá a firmar uma aliança ou se terão que enfrentar o destino final de suas vidas. De qualquer modo, ao contrário de Branco, Juarez aguardava pelo pior e assim estava preparado a enfrentar pela segunda vez os Subjulgadores e sua tribuna.

Ao percorrer do dia ambos puderam caminhar livres pelos arredores da casa grande, onde ao distante sempre estava um ou mais dos cães a vigiá-los. Branco como sempre ficou a admirar a natureza e prestar a atenção nos inúmeros detalhes que geralmente passam despercebidos pela maioria. Juarez por sua vez caminhou ao seu lado mais calado que de seu costume. Ao pararem na sombra de uma sequoia, Branco põe a mão no ombro dele:

– Creio que é a hora de contar o que inquieta seu coração, meu amigo. Sei que todos  possuímos tanto monstros como traumas dentro de nós, mas nada que se deva passar sozinho. – Branco se move ficando de frente a ele. – Afinal já percorremos essa maldita estrada a mais tempo que poderíamos aguentar.

Os olhos de seu amigo fixam nos olhos de Branco parecendo estar avistando algo além dele, como se o horizonte de seu olhar se perdesse nas partes mais distantes e desconhecidas do mundo, em meios a segredos que somente ele pode guardar. Foi um longo e inquietante silêncio até Juarez se manifestar:

– Desculpe-me, amigo. Não foi intenção despertar sua preocupação, estou bem, apesar de estarmos aqui.

– Juarez… Apesar de nossa longa amizade, existem partes de nossas histórias que jamais revelamos um ao outro, ou a ninguém.

“Essa nossa trajetória indesejada e inevitável é um imenso castelo construído sobre fundações cheias de perigosos segredos”.

“Conhecimento e segredos são o que nos mantém vivos”.

– O velho Lafayette. Aquele louco que possuía fetiche por ouro.

“Cada um com seus desejos para suportar a sua dor”. Ele era cheio de frases marcantes ou dizeres de livros antigos e poetas mortos.

– Sim, sim. – Respondeu Juarez com certa empolgação permanecendo em seguida em prolongado silêncio.

O sol que começara a se pôr invadiu toda extensão da fazenda com uma cor alaranjada, morna e calma, trazendo de forma inesperada para ele uma paz que só experimentou em raras ocasiões de sua vida. Ele olha para Branco, o estranho que ao longo dos anos acabou se tornando seu irmão, o único que veio a confiar em um submundo em que não se pode confiar em ninguém, nem mesmo em seu parceiro. Sua voz séria e rouca quebra o silêncio criado por si:

– Tem razão meu amigo. Tem segredos que nunca ousamos revelar a ninguém, não por ausência de confiança, mas pela profundidade existente que aflige nossa mente e coração. – Branco se mantém quieto em sagrado silêncio atento às palavras de Juarez. – O que virei a lhe contar fará mudar sua perspectiva em relação aos seus velhos colegas de trabalho e principalmente com aqueles que considera como amigo.


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