Estou de volta

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· Perspectiva de Renato

Ouço uma voz longe, tento compreender o que ela está dizendo, mas ainda está incompreensivo. Talvez seja fruto da minha imaginação, talvez eu esteja apenas sonhando. Tento não pensar na voz, mas ela começa a ficar mais perto, alguém está conversando comigo, mas não consigo abrir os olhos. Mesmo que eu faça todo o esforço eles ainda continuam fechados. Tento me mexer, mas o meu corpo também não me obedece.

A voz começou a soar familiar, era a minha mãe.

- Faz tempo que a gente não desce para pegar um banho de sol, mas amanhã se não estiver chovendo a gente desce, nem que seja para você pegar um pouquinho de ar puro. Está bom, meu amor? Agora boa noite, durma bem.

Desta vez consigo compreender o que ela está dizendo, me esforço um pouco mais para abrir os olhos. Não consigo entender o motivo de não conseguir, é como se eu estivesse preso ao sono e mesmo que fizesse todo o esforço não conseguisse sair dele.

Mas eu quero abrir os olhos, eu sinto que preciso.

Junto todas as minhas forças e finalmente eles me obedecem.

Minha visão está estranha, ainda está tudo desfoca. Tento me esforçar mais um pouco para mantê-los abertos.

- Você abriu os olhos, meu amor. Você abriu seus olhos, meu amor.

Tento responde-la, mas assim como meus olhos a minha voz não me obedece.

Finalmente consigo enxergar um pouco melhor, realmente era a minha mãe falando comigo, mas não consigo saber onde estou. Tudo parece estranho.

Então me lembro do acidente, barulho do freio do carro veio primeiro, depois o impacto da batida. Tudo pareceu acontecer em câmera lenta, tentei ao máximo manter o controle do carro, mas meus esforços de nada adiantou. O impacto da água foi a última coisa que eu lembro, tudo a partir dali virou um borrão.

Filha.

Lembro da conversa que tive com a Rafa antes de sairmos e pegar a estrada, foi por isso que estávamos na estrada, porque eu tinha uma filha. Sim, uma filha com Gizelly. Mesmo que minha mãe desaprovasse eu irei criar esse bebê com ela.

- Meu anjinho. Ei! Oi meu amor. Você está me vendo? Você está me enxergando, você está me vendo, Renato? – Minha mãe continuava a me perguntar, sua voz doce.

Eu queria responder que sim, mas não conseguia.

- Filho, se você estiver me vendo ou me ouvindo, aperta a minha mão. Aperta.

Sinto quando ela a pega, mas não consigo fazer o que ela me pede.

- Aperta a minha mão, aperta. – Ela repete.

Começo a compreender que estou no hospital.

Rafaella, preciso saber como ela estar. Sinto as lágrimas escorrerem pelo meu rosto, ela também estava comigo no carro.

Quero falar que preciso vê-la, assim como quero ver também a minha filha. Eu mal olhei para ela no parquinho, preciso vê-la. Lembro que ela foi a última coisa que pensei antes de o borrão tomar conta de mim.

- Fii... – Tento falar, mas não está saindo.

- O que foi, meu bem? O que foi? – Ouço minha mãe perguntar. – O que você quer dizer, meu filho. Você quer falar alguma coisa? Você quer falar, quer?

As lagrimas continuam descendo, não consigo controlá-las.

- Fala para a mamãe, que a mamãe vai entender. O que é que você quer, em? – Ela aproxima-se um pouco mais de mim.

Junto um pouco mais de força e tento fazer o que ela me pediu, falar o que eu quero.

- Mi. Nha. Fi.lha – Consigo falar, e isso faz com que eu sinta que minha garganta estar sendo arranhada por grandes espinhos.

- É a sua filha? É a sua filha, é isso? – Ela me pergunta. – É o que você quer, meu bem?

Sentir vontade de falar que sim, que era isso o que eu mais queria. Mas não consigo, minha garganta ainda dói e não sei se consigo mais fazer com que as palavras saiam da minha garganta, que agora estar queimando por causa dos espinhos causados pelo esforço anterior.

- Você quer a sua filha, é isso meu bem? Se for o que você quer apertar a minha mão. Aperta.

Sim, o que eu mais quero é isso. Então me esforço para apertar a sua mão, pois quero minha filha.

Finalmente minha mão me obedece, consigo fazer o que ela me pediu confirmando o meu desejo. Ela deposita um beijo no dorso da minha mão, ela também está chorando.

Não consigo mais manter meus olhos abertos, sinto minhas pálpebras pesarem novamente, mas desta vez não tenho mais forças para mantê-las abertas e me deixou ser levado novamente para a escuridão.

Conseguir abrir os olhos na manhã seguinte.

Minha mãe estava novamente do lado da minha cama, me disse que eu tinha dormido tranquilamente a noite inteira e que aquela manhã estava sendo linda só pelo fato de eu ter acordado. Ainda não conseguia falar, mas estava tendo mais controle sobre minhas mãos.

- Aperta a mão da mamãe, filho. – Minha mãe está do meu lado a segurando.

Fiz o que ela me pediu, desta vez com mais facilidade.

Não estávamos sós, um tempo depois que acordei uma mulher apareceu vestida com um jaleco branco.

- Aperta mais uma vez, meu anjo. – Minha mãe pediu. E eu apertei novamente.

- Meu Deus! Dona Genilda. - - Sua voz soou espantada.

- Eu disse a senhora, não disse? E ontem doutora, ela moveu os lábios.

- Isso é incrível.

- Não dava para entender direito, sabe? O som quase não existia era feito um sopro, mas ela moveu os lábios. Eu, com dificuldade, mas pude entender. Ele estava querendo dizer sobre a filha dele.

Eu escutava a conversa entre a minha mãe e a médica.

Tinha pensado que minha voz tinha saído alto, mas pelo que ela tinha acabado de dizer n]ao era como eu imaginava.

- Renato, eu vou precisar fazer alguns testes com você, tudo bem? – Ela perguntou ao pegar a minha mão.

Para confirmar que estava tudo bem, fiz o mesmo que tinha feito com a minha mão, apertei a sua mão.

- É muito importante para mim que você não se estresse, você só vai o que for possível por enquanto. Combinado? – Apertei novamente a sua mão. – Ótimo! Ótimo.

Enquanto ela fazia os testes eu reagia quanto possível. Sentir quando ela passou algo pontudo e frio na sola do meu pé, depois quando passou algo semelhante a um pequeno pincel ao longo da minha perna. E o incomodo causado pelos pequenos furos que ela fez com uma espécie de agulha.

- Muito bem. Ótimo. – Ela repetia enquanto continuava os testes. – Deus. Isso é incrível, dona Genilda. Isso é maravilhoso.

- Obrigada meu Deus. Obrigada senhor, obrigada. Obrigada senhor por ter meu filho de volta. Doutora. Doutora meu filho está de volta.

Naquele momento entende a gravidade do acidente. Elas estavam tentando ver se eu tinha perdido os movimentos, mas fiquei feliz por ainda sentir, mesmo ainda não os controlando, os meus membros. Isso significava que eu não estava paraplégico. 

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