Nossa filha

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· Perspectiva da Gizelly

A surpresa de ser surpreendida por Rafaella em um momento tão descontraindo me fez esquecer por alguns segundos de tudo o que tinha acontecido naquela manhã, mas logo a tristeza tomou o lugar da surpresa. Ela tinha sumido sem me dar qualquer explicação, não só me magoando, mas magoando nossa filha. E isso era o pior que ela poderia ter feito.

Mesmo triste com sua atitude, não conseguir deixar de reparar e contemplar a sua beleza, era algo que eu adorava fazer. Estava radiante como sempre, mas nos seus olhos tinha algo que eu não conseguir distinguir. Por mais que sua beleza me deixasse sempre sem fôlego, durante todos esses anos juntas eu sentia como se sempre fosse a primeira vez que acontecia. O choque percorrendo por toda a minha espinha e se acumulando por fim entre as junções das minhas cochas. Mesmo não me tocando, ela conseguia me tirar do sério só por estar no mesmo vão que eu.

Sofia correu para o seu encontro, se agarrando a mãe de forma desesperada.

Sentir um leve aperto por minha pequena, sabia o quão triste ela tinha ficado pela ausência de Rafa em sua apresentação.

Ver minha filha naquele estado me deixou com o coração tão apertado que não conseguir dizer uma única palavra em resposta a Rafaella.

Mas ouvia atentamente ela tentando acalmar a Sofia.

Me pedindo para seguir-la até a sala de estar com um olhar suplicante me pedindo para acompanhá-las, nos sentamos no sofá. Não conseguindo me manter distante ocupei o espaço ao seu lado.

- Eu amo muito as duas. Vocês é e sempre serão o meu mundo, preciso que saibam disto. – Iniciou.

Sentir que algo realmente estava errado.

Por mais que soubesse o quanto essas palavras fossem verdadeiras, a forma que soou desta vez não me deixou nada preenchida como costumava me fazer sentir.

- Amor. –Disse. – Eu sei.

Nossa filha reforçou o que eu tinha acabado de dizer, o que a fez embargar. Algo muito incomum de acontecer.

Sempre que Sofia expressava o quanto a amava, Rafa fazia questão de dizer o quanto ela a amava mais ainda. Como se estivessem travando uma batalha eterna de quem possuía o amor maior.

Toda a chateação pelo seu suposto sumiço se desfez.

Não conseguiria me manter irritada nem que minha vida dependesse disto.

- Você está me assustando, Rafa. – Disse não conseguindo manter minha ansiedade controlada. Eu precisava entender o quanto antes o que estava a deixando daquela maneira. – O que estar acontecendo?

Rafa começou a falar de forma atropelada, outra característica que não lhe pertencia, tentado explicar o motivo da sua quebra de promessa a não aparecer em sua apresentação. Eu não conseguir acompanhar o que ela estava tentando dizer para nós, e quanto mais ela falava mais me deixava confusa. O que me deixou impaciente.

Sentir que tudo aquilo estava me deixando atordoada demais para o meu gosto, decidir que precisava me levantar, mas Rafaella continuou segurando a minha mão. O que fez com que eu ficasse parada em sua frente, sem ter forças para me desvencilhar do seu contato.

- Não briga, mamãe. – Pediu Sofia.

Sentir meu coração se desfazer em mil pedaços ao ouvir minha filha pedindo para que não brigássemos.

Nunca antes tínhamos alterado o tom de voz em sua presença, ainda mais travar uma briga em sua frente. Me arrependi instantaneamente de ter deixado o meu temperamento explosivo submergir das profundezas de onde o tinha enterrado.

- Sua mãe não está brigando. – Rafa a acalmou antes que eu pudesse falar algo. – Não estou enrolando, ou estou. – Admitiu. – Eu só quero me certificar de que aconteça o que acontecer eu sempre irei amar vocês.

- Ok! – Conseguir dizer ríspida.

Eu estava novamente irritada, mas tentei ao máximo controlar minha irritação por conta de uma Sofia que me encarava assustada sentado no colo da sua mama.

- A mama não foi assistir a sua apresentação porque recebeu uma ligação muito importante do hospital onde o Papai Tato está internado. – Começou Rafa, intercalando o olhar entre mim e Sofia. – Eu precisei ir até para ver o seu pai, minha pequena. E você não adivinha a boa notícia que sua mama tem para dar a vocês. – Ela fez uma pausa, parecendo tomar coragem para dizer as próximas palavras. – Ele acordou.

- Quem acordou? – Ouvir uma Sofia confusa perguntar.

- Seu pai, meu amor. Por isso a mama não foi para a sua apresentação, precisei correr para o hospital assim que recebi a notícia. – Respondeu Rafa pacientemente. – Eu sei o quanto era importante a minha presença em sua apresentação, mas eu não tive escolha. Precisei ir até lá. – Rafa me encarou. – Precisei ir ver o Tato.

Eu não sabia o que falar.

Apenas a encarei de volta, as palavras pareciam fugir da minha cabeça, como se estivesse perdido a habilidade de fazer uma simples junção de sílabas.

- Eu já disse que não gosto que diga que ele é meu pai. – Minha filha repreendeu.

- Eu sei meu anjo, mas de fato ele é. E quer saber de uma coisa? – Rafa fez uma longa pausa.

Parecia que ela queria saber se eu também queria saber o que ela pretendia me dizer, como fiquei em silêncio ela prosseguiu.

- Eu conversei com ele, e a primeira coisa que ele me falou foi sobre você. – Disse passando as dobras dos dedos de forma suave na lateral do rosto de Soso. – Ele quer te ver. Quer ver você e a sua mãe.

Antes que conseguisse assimilar a informação que acabará de receber, sentir como se a atmosfera ao meu redor estivesse mudada drasticamente, sentir um mal estar percorrer todo o meu corpo. "O que afinal Rafa tinha acabado de dizer?", nunca sentir algo parecido com isso, era desesperador. De repente sentir um intenso calor no meu peito, tateei com a mão livre em busca da causa, mesmo sendo algo irracional a se fazer.

Meu coração disparou, eu estava suando bastante e o mal estar só piorava a cada segundo.

Não tinha me sentido desta forma, nem mesmo quando soube do acidente que ele tinha sofrido. Tentei pensar de forma racional, tentando buscar explicação para o que eu estava sentindo.

Foi quando sentir minha garganta se fechando e o ar entrando com dificuldade cada vez mais em meus pulmões.

Tudo ao meu redor começou a tomar tons cinzentos ao mesmo tempo que ia se desfocando.

Foi quando sentir uma rajada fria percorrer por toda a minha espinha. Não sabia de onde tinha vindo, afinal estava dentro do abrigo da nossa casa, mas não tive tanto tempo para ponderar a respeito. Pois logo tudo se resumiu a total escuridão e fui sugada para ela de bom grado. 

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