Pedido inesperado

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Voltamos para casa um pouco depois das três. A Soso estava no branco de trás abraçada com sua nova mascote encarando a paisagem através do vidro do carro. Uma música tocava baixo, enquanto eu prestava atenção na estrada. Rafa se mantinha em silêncio ao meu lado, ela quase nunca conversava quando estava dentro de um carro. As vezes penso que ainda é muito doloroso para ela entrar em um. Ela sempre desviava quando tentava conversar com ela a respeito, o que me fez parar de perguntar.

Assim que estacionei a Sofia se soltou do cinto de segurança e pulos do assento de elevação e correu para dentro da casa.

- Quero saber que horas a pilha dessa garota vai chegar ao fim. – Disse olhando para a Rafa.

- Nunca?

Eu gemi em resposta.

Rafa se desprendeu do cinto e se aproximou de mim.

- Espero que a sua bateria também esteja em dia. – Disse depois me deu um longo beijo. – Vamos, precisamos encontra-la antes que ela derrube a casa.

- Aquela pequena furacãozinha. – Revirei os olhos.

- Tal mãe...

Mostrei a língua para ela.

- Olha que eu arranco.

- Tenta a sorte. – Desci e fiz como a minha filha, corri para dentro da casa.

- Gizelly.

Ouvi o grito de Rafa antes de bater a porta atras de mim.

Depois de conseguir fazer com que a Sofia tomasse banho e janta-se sem voltar a fazer bagunça, fui organizar alguns papéis para o trabalho no dia seguinte. Em troca de não aprontar mais nada, ela conseguiu um acordo de assistirmos um filme da coleção da Barbie depois que organiza-se o material escolar para a segunda.

Estávamos no nosso quarto, meu e da Rafa, como de costume colocamos a Soso entre a gente. Sentamos apoiadas na cabeceira da cama, enquanto a Soso estava deitada com a cabeça apoiada no colo da Rafa, recebendo carinhos em seus cabelos.

O filme escolhido para aquela tarde foi As Doze Princesas Bailarinas.

A história girava em torno de 12 princesas que, mesmo com todas as suas diferenças, amavam dançar. As irmãs descobrem um lugar mágico feito por sua mãe, que faleceu após o nascimento das caçulas trigêmeas, e fogem três noites para lá a fim de fugirem das ordens da vilã. O filme mostrava o amor existente entre essas irmãs e o amor pela dança. A vilã tenta destruir esses laços de irmandade, mas não consegue.

- Quando vou ter irmãs também?

Eu e a Rafa nos encaramos, a pergunta havia nos pegos de surpresa. Eu alternei o olhar entre minha filha e Rafa, não sabia o que responder para a pequena.

Rafaella também pareceu não saber o que responder, ficando em silêncio.

Sofia se levantou virando para a gente ficando de joelhos e nos encarando.

- Seria legal ter uma irmã, ou até mesmo um irmãozinho para brincar comigo. Todos os meus amigos da escola têm, e olha como a Genevieve é feliz com as dela. E olhe que ela tem onze irmãs. Você ou a mama poderiam me dar pelo menos um.

- Primeiro cachorro, agora irmão?

- Ou irmã. – Ela completou dando de ombros.

Eu tinha explicado para a Soso sobre sua existência, como a tinha feito, mas escondendo alguns pontos negativos dessa história. Ela sabia muito bem que seu pai era o Renato, que antes de ter algo com a Rafa tínhamos ficado juntos e com isso ela tinha acontecido. Expliquei também o motivo dele está preso naquela cama do hospital e sobre a relação que tinha sido construída depois do seu nascimento, tudo com a ajuda de sua psicóloga. O pedido por um irmão, ou irmão, me deixou sem saber o que dizer.

- Amor, vem aqui. – A Rafa lhe chamou, a colocando em seu colo. – Já conversamos sobre não se comparar com as outras crianças da escola, não é?

- Eu sei, mama. Não é isso... – Ela me encarou com aqueles olhinhos depois voltou a encarar a Rafa. – Eu sei que fui feita pela mamãe e pelo Renato, mas vocês duas poderiam fazer um também e me dar um irmãozinho. O Luiz me contou que os pais dele adotaram o irmãozinho dele e que ele era seu irmãozinho de coração. Que seus pais disseram que não tinha nenhuma diferença. – Ela deu de ombros. – Eu só pensei que vocês poderiam fazer o mesmo.

Por mais que eu tentasse, não conseguir fazer com que a Sofia chamasse o Tato de pai. A sua psicóloga disse que não ela para força-la, explicou que da mesma forma natural que ela tinha encontrado na Rafa uma mãe iria acontecer caso enxergasse o Renato como pai, que não adiantaria força-la.

- Realmente não tem diferença alguma. – Rafa colocou uma mecha do cabelo da Soso atrás da sua orelha.

Eu me aproximei mais das duas.

- Sim, não há. – Beijei a bochecha da Soso e depois da Rafa. – Assim como não existe a diferença entre mim e a mama Rafa para você. As duas são suas mães. Você nos pegou de surpresa com esse pedido, um irmãozinho, ou irmãzinha, é algo que precisamos conversar e pensar muito antes de fazer. Não é como o filhotinho que decidimos de uma hora para outra.

- Epa! Eu não decidir de uma hora para outra. Tínhamos combinado que iriamos dar um cachorrinho para ela depois de conversamos, você que está querendo voltar atrás.

- Não. Não podem desprometer. – Foi a vez da Soso protestar.

Eu revirei os olhos para a reação das duas, mas no fundo agradeci pelo clima ter voltado a ficar leve.

- Desprometer não existe, Sofia.

- Não mesmo mamãe. Não existe prometer algo e depois desprometer, é errado.

Rafaella começou a rir.

- Eu me referir a palavra desprometer, Sofia. – Tentei explicar sem êxito, o que só fez a Rafa rir mais alto ainda. – Quem está sendo uma boba agora? – A fuzilei com o olhar. – Vamos, dê o beijo em sua mama, já está na hora de ir para a sua cama. Amanhã é dia de aula e você precisa descansar.

- Boa noite, mama. – Disse dando um beijo na bochecha da Rafa.

- Boa noite, meu amor. – Disse Rafa, retribuindo o beijo em sua testa. - Bons sonhos.

Levei ela para o seu quarto, quando já estava saindo ela me fez voltar e procurar a bendita Girafa.

- Quero que ela durma comigo. – Disse com a voz dengosa.

Assim que encontrei o bichinho de pelúcia levei ate ela.

- Pronto, agora deita e dorme. – Disse, dando outro beijo em sua testa.

- Mamãe, se a senhora quiser eu posso desistir do cachorrinho para ter o irmãozinho. Não tem problema. Sei que um filhote vai dar muito trabalho e com isso não vai querer me dar o neném.

Me sentei ao seu lado.

- Você seria capaz de desistir do filhote? – Ela afirmou com a cabeça. – A mamãe vai pensar um pouco está bem? Você sabe que quando você chegou, a mamãe não sabia bem como lidar, precisou da ajuda da bisa e da mama para conseguir criar você. Você foi e sempre será a melhor coisa que aconteceu em minha vida, mas a mamãe não sabe se está na hora de colocar outra criaturinha serelepe, assim como você, no mundo. Vamos ficar com o filhote, você vai aprender a ter algumas responsabilidades e a mamãe aproveita para pensar sobre o assunto de lhe dar um irmãozinho. Mas é apenas um pensamento, não uma promessa. Tudo bem?

Ela se virou e me abraçou forte.

- Obrigada!

Deu um beijo no alto da sua cabeça retribuindo o abraço. 

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