Temporal

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· Perspectiva de Rafaella

Depois de tanto tempo sem notícias, encontrar com ela, daquela forma só me mostrou que eu não tinha a esquecido. Que o meu amor estava mais vivo do que nunca dentro de mim. No início não conseguir procurá-la, minha mãe não facilitou em nada a minha vida. Ainda mais quando descobriu que o pai da Gizelly não iria dar a ela o valor que pedia após o divórcio. A traição que ela sofreu não causou tanto estrago quanto descobrir que não seria bancada pelo seu ex marido como pensava.

Não que ele deixou a gente sem nada, mas para minha mãe aquilo era uma esmola.

Eu não entendia o motivo de Tato ter ficado do lado da nossa mãe, eu pedir sua ajuda para convencer a nossa mãe de que era um exagero nos afastar da Gizelly, e ele pareceu se enfurecer comigo. Ele ficou completamente cego, dando total razão as loucuras da Dona Genilda. Depois de um tempo eu desistir de tentar convence-lo a procurar a Gi, e fui eu mesma atrás dela. Tentei pedir ajuda as nossas amigas, mas elas também não sabiam notícias sobre a Gizelly, então decidir voltar naquela casa e foi quando descobrir que ela tinha ido embora do país.

Parecia que tinha passado uma vida desde a última vez que a vi. Eu queria apagar a lembrança daquele dia da minha mente. Dela ter passado a tarde com meu irmão, e pelo que eu sentia de ter tido algo com ele. Mesmo ele negando, eu sabia que tinha acontecido algo entre eles na cachoeira.

Desde o dia que eu a encontrei naquele parque não consigo tirá-la da cabeça, se é que algum momento antes eu tinha conseguido, mas algo estava me deixando com a sensação de tinha alguma coisa errada na história que ela tinha contado sobre a bebê.

Lembrei de quando saiu uma manchete sobre o casamento do seu pai com a mulher vinte e cinco anos mais nova que ele, e de como a minha mãe ficou ao saber da notícia. Mas não era a reação dela que fazia com que isso voltasse sempre para a minha cabeça desde o dia que encontrei a Gi e a sua irmãzinha.

As contas não batiam, a criança não poderia ser dela. Olhei aquela foto várias vezes durante a semana, comparando a barriga com a data do casamento e a idade aproximada da neném. Algo não se encaixava. Até o dia em que me dei conta.

Tato estava em seu quarto se preparando para irmos embora do hotel em que tínhamos nos hospedado para ele participar de um campeonato, o qual mais uma vez estava saindo com a vitória.

- Você transou com ela no dia do acampamento, não foi? – Disse entrando em seu quarto sem pedir licença.

Eu não tinha muito tempo até a mãe voltar, ela tinha saído para jantar com a treinadora e um possível patrocinador.

- Quando vocês ficaram sozinhos na cachoeiro vocês transaram. Agora tudo faz sentido.

- Nós quem? – Ele continuou a arrumar a sua mochila.

- Para de agir como um idiota, Tato! – Eu não conseguir controlar a minha raiva. – A neném é de vocês. Como você não notou isso?

Eu sentia um misto de alegria e tristeza.

Agora eu sabia que não podia mais revelar o que eu sentia por Gizelly, não tendo uma criança envolvida nessa história.

- Do que você está falando? – Ele virou, pela primeira vez me encarando.

- Da Gizelly e a bebê. – Berrei, ao mesmo tempo que joguei as mãos para o céu sem paciência. – Nossa, ela é tão parecida contigo, como não me toquei disso antes? – Levei uma das mãos a testa. – Ela te procurou?

Assim que fiz a última pergunta vi que a fisionomia do meu irmão mudou, o denunciando.

- Ela foi, não foi?

- Rafaella, acho melhor você ir arrumar suas coisas. A mãe não vai gostar nada se encontrar tudo por...

- Caramba Renato, para de ser babaca. Você tem uma filha. Uma filha caramba! E você está preocupado com nossa mãe, serio?

- Você está louca, ela não é minha. Você ouviu, ela é do pai da Gizelly. – Ele me virou as costas.

- Você acredita mesmo nisso? – Eu fui até ele, o puxando para que me encarasse.

- Eu... eu não sei. – Admitiu. – Quando vi você segurando aquele bebê notei o quanto ela se parece com você. Ela é a sua cara, mas eu pensei que fosse algo que minha cabeça estava criando. – Ele fez uma pausa. – Ela veio atrás de mim, e eu a mandei ir embora. E se ela veio falar sobre a gravidez?

Eu me assustei quando meu irmão me puxou para os seus braços. Sentir as lágrimas molharem o meu ombro. Ele não estava louco. Eu não estava louca. Aquela criança ela deles, da Gizelly e sua.

- Você tem uma filha. – Até então não tinha percebido que também estava chorando.

A mulher que amo e o meu irmão tinham tido uma filha juntos.

A felicidade e a tristeza estavam lado a lado, de mãos dadas alternando em meu peito.

Tudo aconteceu muito rápido. A decisão do Tato em pegar o carro sem esperar a nossa mãe voltar do jantar de reunião e ir atrás de respostas de Gizelly foi tomada no calor do momento. Eu não conseguir fazer com que ele se acalmasse e esperasse voltamos para a cidade com a nossa mãe e só então ir procurar por respostas.

- Você vem comigo ou não? – Ele me perguntou segurando a chave do Jipe.

Eu tinha muito medo de sair desta maneira, tarde da noite e deixando nossa mãe para trás. Tinha medo das consequências que isso resultaria, mas mesmo assim resolvi o acompanhar.

- Não vou deixar você sair a essa hora sozinho.

A estrada de volta para a cidade estava tranquila, a viagem duraria poucas horas. Calculei que chegaríamos um pouco antes da meia noite, e com sorte iriamos conseguir encontrar a Gizelly ainda acordada. Eu orava para que ela estivesse em casa, e que se arriscar a pegar a estrada aquela hora, sem nossa mãe saber, não fosse em vão.

Estávamos na metade do caminho quando um temporal nos atingiu. A visibilidade da estrada não estava nada favorável. Comecei a temer que tínhamos tomado uma péssima decisão ao pegar a estrada aquele horário.

Sentir uma sensação estranha, mas não dei muita atenção a isso, foi quando ouvi uma freada brusca, vi o carro vindo em nossa direção. A chuva forte tinha deixado a pista escorregadia. Ao olhar para o Tato pude sentir o seu desespero, e me preparei para ser atingida. Ele girou algumas vezes antes de romper a proteção e cair no lago.

No primeiro momento a dor não me atingiu, estava em choque. Não sentia meu braço esquerdo e a perna direita. Tive medo de me mover e perceber que tinha sido dilacerados. A pancada tinha me atingido em cheio e o meu desespero aumentou quando percebi que o carro estava sendo inundado.

- Tato! – Gritei em desespero.

Não conseguia me soltar do cinto de segurança, o Tato estava desacordado ao meu lado. Ouvi alguém longe chamando em desespero. O carro continuava enchendo de água e afundando. 

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