Três mosqueteiras

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Minha alma pareceu se desligar do meu corpo quando ouvir minha avó dizer que meu irmão tinha piorado, deixei o celular cair e fiquei paralisada, sem saber o que fazer. Gizelly pegou o telefone e terminou de falar com ela. Fiquei tonta e me sentei na beirada da cama.

- Sua avó pediu que fossemos para a casa dela, mas disse que era para você se manter calma. Ela só quer conversar com a gente pessoalmente. Rafa, você está me ouvindo?

Minha mente não estava conseguindo processar nada além dos últimos momentos que passei ao lado do meu irmão. Eu tinha o deixado bem, ele até tentou falar comigo. Será que eu tinha feito algo de errado? Será que o meu encontro o deixou bastante agitado ao ponto de fazer com que seu quadro agravasse? Mas ele estava bem, a doutora me disse que ele estava bem.

Fiquei tonta com essa enxurrada de perguntas que atingiram a minha mente.

De repente, Gizelly já estava com um copo de água nas mãos.

- Acho melhor ir acordar a Soso para irmos para lá o quanto antes. Beba um pouco que eu já volto.

Eu tentei tomar um gole, mas minha garganta estava trancada. Continuava tonta, minhas mãos tremiam, eu não conseguia me mexer. Meu corpo estava tremendo.

Não sei quanto tempo fiquei ali, sentada encarando o copo em minhas mãos.

Gizelly apareceu novamente, agora ela estava com nossa filha. Eu olhei para ela e a vi mexendo os lábios, mas eu não conseguia ouvir o que ela estava falando. Ela segurou a minha mão e me ajudou a levantar.

- Soso, espera a gente lá embaixo, meu amor. – Disse olhando para Sofia.

- A mama está bem?

- Está sim, não se preocupe. Ela só está um pouco cansada. Nos espere lá em baixo, faça o que eu te pedir. E não se preocupe, está tudo bem com ela. Vamos só nos vestir para irmos visitar a bisa.

Ela me ajudou a trocar de roupa, depois que eu estava novamente sentada na beirada da nossa cama foi trocar a sua própria.

Aquilo parecia um sonho, tudo estava em câmera lenta. Comecei a recordar a noite trágica que sucedeu o acidente, estava com o mesmo sentimento. Eu não iria me perdoar jamais se minha ida ao hospital tivesse causado algum dano ao meu irmão. Eu não iria aguentar saber que eu fui a causadora da sua piora.

Gizelly me puxou para fora da nossa casa. Gizelly abriu a porta do passageiro para mim.

- Entre. – Disse me colocando no bando do passageiro, como se eu fosse uma criança pequena me ajudando a colocar o cinto.

Depois foi para trás, ajudando a nossa filha a se acomodar no assento de elevação.

Quando ela ocupou o bando do motorista, pegou o meu celular e fez uma ligação rápida. O carro começou a ganhar movimento, e quando estávamos já na estrada a caminho da casa da minha avó voltei a ouvir a voz dela.

- Calma, Rafa, está tudo bem. Você precisa ficar calma. – Ela disse com a voz agitada, mas suave.

Eu não conseguia falar, minha boca estava muito seca, minha garganta parecia estar fechada o que dificultava minha respiração. Gizelly fez outra ligação do meu celular, mas agora eu conseguia ouvir.

Ela falou com minha avó pelo alto falante do carro, informando que estávamos a caminho da sua casa.

Eu me sinto culpada. Culpada por ter ido ver meu irmão no hospital. Culpada por não ter sofrido quase nada no acidente enquanto ele ficou em coma por tanto tempo. Culpada por amar a mesma mulher que ele desde a infância. Culpada por não conseguir imaginar minha vida longe dela e da nossa filha, sim Sofia era minha também. Culpada por ter vivido todo esse tempo em seu lugar, com sua família. Um filme de acusações passava na minha cabeça na mesma velocidade em que a passagem lá fora passava pela janela.

O medo tomou conta de mim. Medo de nunca mais ver o meu irmão, de que tivesse o perdido de uma vez por todas. Medo de nunca mais ouvir a voz dele, de não poder mais abraçá-lo. Lembrei das músicas que ele cantava para me fazer dormir quando erámos pequenos.

Gizelly estava conversando com Soso, tentando distrai-la. Ela alternada a atenção na estrada em olhadas rápidas pelo retrovisor para olhar para a nossa pequena e para mim. Eu estava chorando. Não consegui mais segurar, a represa de lágrimas se rompeu.

- Calma, amor. Não aconteceu nada grave, você precisa se acalmar e parar de se culpar. Eu sei que estar fazendo isso. – Ela falou baixo, para que só eu pudesse escutar.

Ela tinha razão, eu não podia perder a cabeça daquela forma. Eu precisava me acalmar, continuar neste estado só iria deixar Sofia agitada se ela percebe-se.

- Eu quero comer pizza. – Sofia disse, chamando a atenção.

- No café da manhã? – Gizelly olhou para ela através do retrovisor. – Vai sonhando, mocinha.

- Mas é domingo. Domingo é dia de diversão.

- Concordo. – Gizelly disse dando uma olhada rápida para mim, depois voltando sua atenção para a estrada. – E por isso vamos tomar café em sua bisa. Isso é ou não divertido?

- É, mas comer pizza também. – Disse Sofia.

Eu podia ouvir o riso em sua voz.

Eu amava tanto essa pequena, não consigo imaginar minha vida sem momentos como esse. Momentos tão familiares, onde nos divertimos com suas argumentações tentando nos convencer a fazer algo que ela deseja, mesmo sabendo que não o vamos.

Quando estávamos perto da casa da minha avó, pegamos uma chuva não muito forte. Por um instante pensei que pudesse ser um mau presságio. A lembrança do dia do acidente não demorou a voltar para me aterrorizar, mas dessa vez a expulsei.

Ainda chovia quando chegamos na casa da minha avó. Ao estacionar na frente da casa, Gizelly soltou o cinto e segurou a minha mão.

- Estaremos sempre juntas. -Ela olhou para Sofia e depois voltou a me encarar. – Aconteça o que acontecer será sempre nós três, as três mosqueteiras contra o mundo. Lembra?

Apenas balancei a cabeça concordando.

- As inseparáveis. – Gritou Sofia de forma animada. – Athos, Porthos e Arame.

Ela sempre errava o nome de Aramis, o que me fez dar um pequeno sorriso. Tínhamos assistido o filme Os três mosqueteiros, em formato de desenho, a algum tempo atrás. Em certo momento do filme ela nos comparou com os personagens que sempre estavam juntos, desde então viramos as "inseparáveis".

- Sim! – Disse pela primeira vez. – As inseparáveis.

Gizelly foi a primeira a descer, indo para a porta do passageiro para ajudar a Sofia a descer do carro.

Ao abrir a porta, senti o vento frio deixado pela chuva que havia caído momentos antes. Assim que entramos na casa da minha avó, ela veio em nossa direção. Ela não disse uma única palavra, apenas me abraçou e chorou. Era a minha vez de ser forte, ficamos um bom tempo abraçadas. 

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Desculpem-me pela demora, estava dando uma adiantada na outra história, pois ela esta na reta final, então acabou atrasando um pouco a atualização desta aqui. 

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Beijos e até breve ;*

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