Nosso primeiro beijo

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·         Perspectiva de Rafaella

Aqui, com ela em meus braços, sinto uma paz tão forte e uma certeza indescritível de que enquanto a mantê-la assim, entre eles, nada será capaz de nos abalar. Nem mesmo meus próprios medos.

Encaro nossas mãos entrelaçadas, a ondulação da água em decorrência do nosso corpo se mover por conta da nossa respiração, os pelos dos seus braços, mesmo finos, dançarem com o movimento da água, até mesmo a luz parecia brilhar de maneira diferente sobre nós. Tudo parece estar em completa harmonia.

- No que está pensando? – Ouço sua voz doce me trazer de volta da divagação.

- No quanto é harmonioso estar em sua companhia. – Digo, depositando um beijo em seu ombro.

- Harmonioso. – Ela repete a palavra como se estivesse a pesando. – Tai uma palavra que eu não usaria para definir a sua companhia.

- Não? – Pergunto curiosa.

- Não! – Sinto seu corpo tremer antes mesmo de ouvir o som da sua risada.

- Hum. E qual seria?

- Qual seria o que?

Tento não revirar os olhos para a sua provocação descarada.

- Qual palavra você usaria para definir? – Digo encostando meus lábios a sua orelha, ao ponto de roça-los em seu lóbulo. O que lhe causa um arrepiou visível, pois consigo ver os pelos dos seus braços se arrepiarem, assim como seus mamilos endurecerem.

Sim, Gizelly, eu também sem como lhe provocar.

Mas ao contrário de você, não sou tão piedosa ao ponto de só querer rir da sua cara. Prefiro te deixar louca de desejo. Novamente.

Ela ofega antes de responder, o que me deixa ainda mais satisfeita com a minha provocação.

- Intoxicante. – Ela sussurra.

- Intoxicante? 

- Sim, intoxicante. – Ela repete. – Desde o nosso primeiro beijo, na frente daquele café, você me intoxicou. Me deixou completamente viciada pelos seus beijos, assim como também pelas suas mãos, pela sua pele. Pelos seus olhos. Sorriso. Por cada pedaço de você.

- Intoxicante. – Repito.

Sim, é dessa maneira que também me sinto ao sue respeito. Gizelly me intoxicou com sua existência, mas ao contrário dela, comigo aconteceu bem antes do café, até mesmo antes do nosso primeiro beijo. Que por sinal ela esta redondamente enganada ao lembra-lo como sendo o do café.

A primeira vez que a vir, descendo as escadas desta mesma casa, enquanto ainda não passávamos de meras crianças, foi ali que começou a minha intoxicação.

- Sim, completamente. – Ela diz ao apertar ainda mais nossos dedos.

- Concordo com você. Intoxicante é uma ótima palavra para definir isso. – Elevo nossas mãos. – Mas esta errada em outro ponto.

Ela inclina o corpo em um ângulo que a permita me encarar.

- Em que ponto?

- No café não foi o nosso primeiro beijo. – Digo, não conseguindo evitar sorrir para a cara de espanto em seu rosto.

- Como assim não? – Ela franze a testa.

- Não sendo, uai. – Dou de ombros.

Eu a entendo em não se recordar do nosso verdadeiro primeiro beijo.

- Como não? Tínhamos levado a Soso a escola, era o seu primeiro dia, então resolvermos ficar por perto. Foi então que você decidiu me dizer que iria nos deixar... – Ela diz. – Naquele momento sentir meu coração bater tão forte, mais tão forte como nunca antes. Tinha medo que quando dissesse que estava sentindo algo por você, você fosse sair correndo dali, mas antes gritaria pros quatro ventos que eu era uma louca por conta disto. Então, de repente ouço você dizendo que sentia o mesmo por mim. E tudo o que eu queria naquele momento era ser beijada por você.

Ouvi-la descrever o dia em que finalmente tive coragem para dizer a verdade sobre os meus sentimentos, me fez abrir um sorriso tão largo, ao ponto de doer as minhas bochechas.

- Sim, aconteceu tudo isso. – Digo ainda sorrindo. – Mas este não foi o nosso primeiro beijo. Tenta voltar alguns anos, mas especificamente ao aniversário de 15 anos do Tato. Brincadeira da garrafa. Quinze minutos no céu e voilà...

- Meu Deus, sim. Claro. – Ela desgruda as nossas mãos e leva até a sua a própria boca.

- Este foi o nosso primeiro beijo, e no sentido literal da palavra.

- Sim, nosso primeiro beijo. – Ela sorrir de uma forma tão maravilhosa que me faz sentir pontadas no coração.

- Eu lembro que estava tão nervosa aquela noite, não queria participar daquela brincadeira, que ao meu ver era tão estupida, mas deixou de ser quando a garrafa me escolheu para ser beijada por você.

- Nossa, sim. Eu lembro de tudo daquela noite, mas sempre lembro do nosso primeiro beijo sendo o do café. Acho que por quer éramos pirralhas, e o fato da sua mãe ter interrompido aquela noite e a transformado em algo digo de ser esquecido ofuscou essa lembra.

- Ou o fato de você não sentir nada por mim naquela época também ajudar nesse ofuscamento. – Digo, evitando soar azeda, porque realmente não tenho esta intenção.

Ela meneia a cabeça.

- Eu sentir algo com o beijo, só não sabia o que era exatamente. – É a vez dela dar de ombros.

- Você sentiu mesmo algo? – Soou como uma adolescente desesperada por aprovação após dar o primeiro beijo.

Mas no fundo era sobre isso.

Era sobre o nosso primeiro beijo enquanto erámos duas adolescentes.

- Sim, sentir. Quando beijei você sentir algo, e fiquei com medo de beijar...

Ela se cala de forma abrupta, o que aumenta ainda mais a minha curiosidade.

Depois de anos, era a primeira vez que essa lembrança vinha à tona, era a primeira vez que conversamos sobre o nosso beijo na festa de aniversário do Tato.

- Medo de beijar... – A incentivo a continuar a frase.

- Medo de beijar o seu irmão e, de certa forma, não ter a mesma sensação que tive ao beijar você. Quando ele me seguiu, pensei que iria rolar nosso beijo, mas também tive medo de ser beijada por ele e não ser da mesma forma que foi com você. Digo, não sentir algo, sei lá, não sei explicar, Rafa. Não me entenda mal, eu não estava te comparando com ele. Assim como nunca comparei vocês dois. Não comparo, eu... eu...

-Ei, ei, calma. – Digo, segurando as laterais do seu rosto, a fazendo me encarar. – Isso não passou pela minha cabeça, estamos apenas conversando sobre uma lembrança maravilhosa do nosso passado. Eu sei que as vezes eu dou uma pirada em relação ao Tato, você, a nós. Mas eu entendo o que você quer me dizer, e não se sinta mal por me dizer. Éramos crianças, nem eu mesma entendia o que sentia por você.

- Eu amo tanto você, Rafaella...

- Rafaella? – A interrompo com a cara fechada, o que a faz cair em uma gargalhada.

E mesmo que eu odeio ser chamada pelo meu nome, quando é ela que faz me sinto como uma manteiga derretida, e fico ainda mais quando isso vem acompanhado do som maravilhoso da sua risada escandalosamente contagiante. E assim também estou rindo junto a ela.

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