No outro dia, acordei com uma senhora dor de cabeça. Na verdade, sentia o mesmo que alguém deve sentir ao ter o cérebro espancado por um martelo pesado de ferro.
Dormi na casa da Fabi, descobri ao olhar ao redor. Mais precisamente, na caminha precária de solteiro que a mãe dela deixou no segundo quarto do barraco que doou a filha.
Um sol mal educado me acordou, queimando meu rosto e me obrigando a apertar as pálpebras.
Minha boca tinha um gosto péssimo, e eu não me lembrava de como vim parar aqui.
Sentei, sentindo o estômago resmungar e a cabeça pegando fogo.
Olhei para o meu pé, então a camisa de qualidade amarrada nele me fez lembrar de tudo que aconteceu.
Simplesmente, bebi pra caraca, furei o pé num caco de vidro e, para finalizar a noite, fui chamada de cadela pela mulher do Alcaida. Ah, não poderia me esquecer de que quase lavei os tênis dele de vômito. Felizmente, descobri que amnésia não foi um dos sintomas da minha ressaca.
Empurrei o lençol que me cobria. Um ventilador pequeno assoprava fraco em mim, posicionado sobre uma cadeira em frente a cama.
A porta do quartinho, que era basicamente decorado com essa cama arcaica em que estou deitada e uma cômoda, foi fechada por alguém em algum momento.
Me sentei, enumerando meus problemas um a um:
1º - Meu pai deve estar puto.
2º Tenho que trabalhar de ressaca.
3º Tenho um grave ferimento que está doendo.
4º Fabi vai me enforcar.
Mas, antes de enfrentar tudo isso, preciso de água ou vou bater as botas.
Quando fico de pé, passando a mão no que um dia foi meu cabelo e agora está mais para fios de energia da favela, tudo embolado, me dou conta de que a Fabiana me vestiu com uma de suas largas camisas de banda de Rock. Ela é curta, e minha bunda está de fora.
Tenho uma vontade imensa de cair na cama de novo, e estou cheirando a álcool. O quarto todo está.
Meu celular toca em algum canto.
Sigo o som da voz da dupla Jorge e Matheus, que coloquei de toque de chamada, o encontrando sob o travesseiro ligado a um carregador de iphone que Fabi deveria ter sobrando em casa. Ela pensa em mim sempre!
Vendo o nome da minha mãe na tela, me preparei para disfarçar a voz de ressaca física e moral, recordando o drama de ontem à noite e as merdas que aconteceram.
Sorrio, como se minha mãe fosse me ver pela ligação, e atendo.
- Bom dia, mãe. – digo com todas as minhas últimas energias.
- Onde a bonita foi ontem, posso saber? Seu pai acabou de falar comigo, disse que a Fabi foi lá na casa da sua vó avisar que você passou a noite na casa dela e que machucou o pé. A gente já sabe que você não deve ter ido dormir no seu quarto por provavelmente estar bêbada e ter chegado tarde. – de mãe brigona, sua voz muda para voz de melhor amiga: - Me conta como foi! É a primeira vez que você tem um porre de verdade! Ai, estou tão orgulhosa!
Ela não estava orgulhosa, era uma brincadeira. Minha mãe era anos luz mais liberal que meu pai, queria que tivéssemos experiências, mas não aprovava falta de responsabilidade.
- Não vou te contar o que fiz, poxa, assim perde a graça. Tenho que ser uma jovem cheia de segredos, inimiga dos pais e tal, não sabia?
Ela gargalhou.
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Pique Al-Qaeda
DragosteEle é uma bomba, um perigo. Ela sabe que não deve se arriscar tão perto, que pode se ferir com uma iminente explosão. Lia tem 19 anos, e uma perda a levou para o morro do Sol. Ajudar a família vem em primeiro lugar, até mesmo antes de seus desejos...