Novamente com meu vestido rosa, meus brincos e meus destroços, passei a toalha nos cabelos, mas ouvi uma porta se abrindo lá longe.
- Lia? - era o Ninja entrando. Bem que escutei o som potente do motor de uma moto la na rua.
Nos encontramos na sala; eu, já sem a toalha nas mãos, e ele sem camisa e aparentemente bêbado.
- Bom dia, flor do dia! - sorriu, os olhos menores que já eram. - Bora? Vou te levar.
- Bêbado desse jeito? - pus a mão na cintura. Não parecia boa ideia.
- Vai me diminuindo, pô... Isso ai. Bora esculachar o Ninja. - fez um movimento dramático com a cabeça. - Tomei papo de uma ou duas doses, Lia. Qual foi da parada? Acha que o homem ia deixar tu subir na garupa de qualquer um com esse vestido curto ai? Designou quem pra missão? O mais braço. Toma teu rumo, passa na minha frente aqui, rapá! - ele fez cara ruim e apontou a porta, mas os olhos sorriam com travessura.
Eu não estava no clima, o que ele notou logo que abaixei a cabeça e caminhei para fora da casa sem nenhum comentário sarcástico ou brincalhão.
Dos homens anteriores, haviam somente dois nos aguardando numa moto.
Ninja me parou com a mão em meu ombro e perguntou se eu estava bem, no fundo, sabendo a resposta.
Não estava muito a fim de falar, sai andando e ele me seguiu. Montei em sua garupa e ele pilotou com cuidado, sempre me sondando preocupado pelo retrovisor.
Quando me deixou em frente a casa da Fabi, contou que foi lá conversar com ela e acabaram se beijando. Ele queria me causar alguma reação, acho, mas eu só dei um sorrisinho abatido e me despedi.
Ele saltou da moto, o que deveria me apavorar, porque logo algum vizinho acordaria ou minha própria avó — que no final de semana não levantava tão cedo, mas também não acordava tarde — e impediu de eu abrir o portão de grades, ao lado da casa da mãe da Fabi.
- Fica assim não, Lia... tudo vai se ajeitar, tu vai ver. - disse ele, tentando me estimular. - O mano só foi resolver uma situação inadiável. Aposto como a noite de vocês foi mídia, fala tu?
Eu apertei os lábios, murmurei um " foi, sim" e beijei o rosto dele antes de entrar.
A chave estava num buraco do muro, lugar que Fabi já tinha me mostrado uma vez.
Abri a casinha dela, arrumadinha e cheirando a limpeza. Ela era organizada, caprichosa.
Ouvi o motor da moto do Ninja subindo a rua e encostei a porta.
No quarto de visitas, tirei a roupa, os brincos, vesti uma blusa que Fabi havia deixado separada sobre a cama para isso mesmo, e cai de cabelo molhado e tudo no colchão.
***
Acordei naquela metade de domingo do mesmo jeito que fui me deitar: languida e sem vida.
Vi no relógio da cozinha que eram duas e meia da tarde. Tomei um copão de água e comi uma banana.
Abrindo um pouco a porta do quarto da Fabi, constatei que ela dormia só de calcinha e sutiã, as pernas e os braços tatuados para fora da manta, aparentemente exausta. Me martirizei por não ter ido ajudar ela varrer, mas isso teria dado certo ou só piorado tudo?
Nossos celulares estavam conectados na tomada ao lado de sua cama. Pensei em pegar o meu, no entanto, não queria acorda-la.
Ia fechando a porta de volta, saindo furtivamente, quando ouvi sua voz rouca chamar meu nome:
- Entra ai, Lia.
Voltei, passando para dentro.
Fabi se sentava com sua cara amarrotada e maquiagem mal tirada, os cabelos presos no alto de um modo que só ela saberia fazer.
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Pique Al-Qaeda
RomanceEle é uma bomba, um perigo. Ela sabe que não deve se arriscar tão perto, que pode se ferir com uma iminente explosão. Lia tem 19 anos, e uma perda a levou para o morro do Sol. Ajudar a família vem em primeiro lugar, até mesmo antes de seus desejos...