97 Lágrimas de sangue

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- Então, basicamente, é isso. – finalizo minha história com a boca na altura da orelha da Mel, explorando o limite da minha voz, já que o volume do som do dj é triplicado e o bar se converteu numa agitada boate escura, com feixes coloridos girando aqui e ali.

Devo mesmo estar num nível muito alto de embriaguez para ter essa conversa reveladora aqui, no centro da pista de dança que se formou em volta da nossa mesinha.

Demos conta de boa parte da garrafa de whisky. Bem, eu dei. Mel não consegue beber muito, não tem a tendência alcoólica dos Tonelli.

Se minha mãezinha estivesse aqui, creio que estaríamos na segunda garrafa e já teríamos saltado na piscina.

A qualidade do destilado apurado por quinze anos tomou o controle do meu corpo, mente e língua. E daí se a Mel souber? E daí se todos souberem?

Caramba, quem liga pro que os outros pensam?

As pessoas não deviam ser reais? Honestas?

Há muito desisti do canudo — agora viro a taça rosa, que tem a logo do bar — o nome em formato de canoa —, na boca, esperando a Mel absorver tudo que acabou de ouvir.

Ela vai ser do time da vovó ou da Fabi? Me entender ou criticar, eis a questão.

- Lia... eu... não sei o que te dizer. – finalmente molda as palavras em meu ouvido, certa fraqueza no tom.

Chego o rosto para trás uns centímetros. Esse rosto sem nenhuma sensibilidade, como se eu tivesse tomado uma boa dose de anestesia nos músculos faciais. Assumo que talvez eu tenha despejado muita bebida a cada meia hora em meio a uma piscina de gelo e algumas gotas dosadas de energético. Talvez eu esteja tentando esquecer que desobedeci uma ordem incisiva e me escondendo em meio a multidão festiva para não ser arrancada a força daqui.

Talvez, só talvez, eu queira beber até minha memória falhar.

Acredito que funcionou um pouco, visto que decidi me abrir com a Mel logo na hora do Dj. Não que ela tenha feito perguntas depois que voltei de lá... foi discreta, e sei que seu medo de tocar no assunto não se deve a mim.

Penso nas palavras que ouvi... Algo sobre ela querer sentar, eu estar coladona e ser trouxa.

Trouxa?

Novidade!

Conta outra!

Se eu já não soubesse por conta própria que Mel é mais uma das tantas...

Ele não vai me jogar contra todas as pessoas que se aproximarem de mim!

Primeiro a Fabi, agora a Mel?

Não, não, não, não!

Quando pisco, e percebo que estou no mundo real, faço o melhor para responder, como se eu me lembrasse precisamente da extensão do assunto.

- Pois é... eu também não. – puxo seu braço para que aproxime a cabeça da minha boca, todo aquele colorido passando pelos meus olhos e me deixando um pouco tonta. – Lembra que me perguntou da minha briga com a Fabiana e tal? Esse é o motivo. Quando descobriu, ela não entendeu muito bem.

Nos entreolhamos ao nos separarmos.

- Santo Deus, amiga... e eu falando várias porcarias pra você. Cara, me perdoa, eu nem imaginava... – ela parece consternada de fato.

Estralo a língua, batendo a mão no ar e fazendo um trejeito de " esquece isso".

Não sei que rumo Aron tomou, mas não está mais na área vip com sua amada Yara, e não usou seu poder arbitrário para me pôr para fora.

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