75 - Alta sociedade

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( Em certas ocasiões - como no caso do hotel - faço referência a lugares reais, mas oculto os nomes por uma questão burocrática. Personagens com cargos políticos relevantes certamente têm nomes fictícios neste livro.)

Fomos no carro do papai para o Leblon, algo que foi contra a vontade da minha avó. Para ela, não era ideal meu pai dirigir depois de beber. Para salvar o dia, eu prometi que não beberia para poder trazer o carro caso fosse necessário. Minha habilitação, tirada aos dezoito, tinha de valer de alguma coisa.

Mandei agradecimentos no watts do Ninja pelo presente. Em anexo, uma foto da Talia arrumada usando o vestido preto e a sandália branca trançada na canela. Eu era uma garota maquiada, totalmente diferente diante do espelho meio manchado de respingos do meu quarto. Ele não me respondeu ainda.

Eu tinha trocado contato com a Mel; está confirmado: amanhã ela vem almoçar conosco e passaremos a tarde na piscina. Também nos seguimos no Instagram. Pude constatar que ela é uma personalidade muito seguida, realmente. Seu perfil é impecável, sempre fotos com um fundo branco, mantendo ao pé da letra a harmonia do feed, coisa que no meu insta não se vê.

Era mesmo de se esperar. Um rosto como o dela foi feito para ser fotografado e apreciado. Como alguém pode acumular tanta beleza numa só vida?

Quem também me seguiu foi o @pittbul220, um perfil que não conheci no primeiro momento e quase, por muito pouco, recusei a solicitação. A foto era de um sujeito sentado de costas para a câmera numa moto, num ponto alto da favela, fazendo sinal de paz com os dedos. Na camisa do Flamengo que o carinha usava, escrito:

" Menor terrorista
tropa do Alcaida".

Após a análise, me dei conta de que era ele por trás daquele perfil falso.

Aceitei a solicitação, mas sou pirracenta e não pedi para seguir de volta.

Segurando o celular enquanto meu pai cantarola suas músicas do pen drive de MPB, contemplo a avenida diante de nós pelo para-brisa, meio que sorrindo com o que me ocorre: ele não está tão puto comigo ou não teria solicitado.

Ou, simplesmente, quer ver o que vou postar durante a noite.

Aceito outros homens que eu também não conheço, umas mulheres — pelas fotos de perfil deduzo que devem ser lá do morro — e o perfil da loja " Barbie Chique".

Confesso que estou maluquinha para mandar uma mensagem perguntando se ele ainda pretende ficar muito tempo boladão comigo. Gostaria de contar detalhes de onde estou, o que estou fazendo... Seria bom poder conversarmos como pessoas normais, compartilhar momentos, experiências. Mas esse não é o estilo do " frente do morro do Sol". Ele é do tipo que descobre sozinho o que quer saber.

Olho imediatamente pelo retrovisor, procurando uma moto ou carro suspeito que possa estar no seguindo, mas não encontro nada que desperte minha atenção.

Ele não faria isso... estou exagerando.

O coquetel era no terraço de um hotel/Resort prestigiado e famoso do Leblon. Seus acessos já evidenciavam a excelência do lugar. Sem contar que é a beira-mar, uma praia privativa para seus hóspedes. É famoso, já ouvi falar muito dele.

Papai deixou seu carro aos cuidados de um valet, vestindo um terno tão caro quanto devia ser o dono do hotel. Meu pai se viu no dever de deixar uma boa gorjeta nas mãos dele só pelo nível de suas roupas e sapatos.

Atravessamos o grande saguão e fomos conduzidos por um concierge ao elevador que nos deixaria no terraço, onde acontece o evento.

A viagem foi curta; as portas se abriram, e um lance de escadas depois, estávamos adentrando outra atmosfera.

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