36 Tudo é ele

708 46 1
                                    

No dia anterior...

Estava super desconfiada, trabalhei a manhã toda, e metade da tarde, tensa - os dois dias que ele prometeu, se passaram.

Não podia ser protagonista de um escândalo...

Cogitei todos os cenários: Yara aparecendo para me quebrar, os vizinhos filmando e mostrando pra geral depois; minha avó me expulsando de volta pra Macaé.

Só não cogitei que aconteceria exatamente como ele falou que seria.

- Chega ai, Lia! Chega ai, pô! - Ninja saltou do carro preto que parou cantando pneu. Atrás dele, mais homens abriram as portas, bandoleiras das longas penduradas nos ombros de todos. Menos no do Ninja, que arrastava a "Garota do banheiro" pelos cabelos, mirando um revólver na cabeça dela.

Não queria sair de trás do caixa. Cobri minha boca, transtornada.

- Chega ai, Lia! - mais ríspido, Ninja chamou outra vez, sacudindo a fulana. Ele não tinha mais aquele jeito moleque e imprudente, nem o sorriso leviano. Gritava, e sua expressão me fez ir até à porta sem tirar as mãos da boca.

Diferente do que pensei, mesmo sendo três da tarde e as ruas estando vazias, as poucas pessoas passando na rua, ou ali perto, vizinhos e tal, não pararam para xeretar. Ninguém interrompeu suas atividades, embora estivessem, obviamente, vendo o que ocorria na minha porta. A vizinha do lado, usando touca de cetim, entrou pra sua casa de cabeça baixa.

Tive muita sorte por justamente hoje minha avó ter consulta marcada. Meu pai a levou em seu carro. Eu estava sozinha em casa.

Assim que parei na passagem, Ninja arremessou a garota em frangalhos aos meus pés. Ela chorava sem fazer nenhum barulho; seu olho direito estava fechado por uma bolha roxa e sua boca sangrando. Como seus braços caíram estirados para frente, pude constatar que foram queimados por algo muito pequeno. As mini bolinhas se enfileiravam da parte interna do cotovelo ao pulso.

- Ninja... - balbuciei. Ele olhava para a menina, ofegante e com o rosto contorcido de odiosidade. O cabelo, liso e suado, grudava na testa. Ele respirava e soltava o ar como se tivesse acabado de subir uma ladeira.
Tive medo de ele ter um ataque cardíaco.

Os outros caras circularam nós três.
Moradores, que jogavam sinuca no seu Alcides, e o próprio, preferiram entrar pro bar, abandonado tacos e copos de cerveja.

Nunca vi nada parecido!

Sofri forte abalo emocional, meu sangue se acumulou no cérebro e olhos, eu acho...

- BORA, PORRA! GATO COMEU TUA LÍNGUA, FILHA DA PUTA?! TÁ ESPERANDO O QUÊ? - as gotinhas de saliva espirravam da boca dele, conforme rugia impetuosamente. Tomado de intolerância, estralou o cão da pistola.

Micaela - ou o que restava dela -, sem pensar em enrolar nem mais um segundo, se arrastou pelo chão até meus pés, soluçando.

- NÃO, NINJA! PARA COM ISSO! - chorando, tentei me afastar para que ela não precisasse se sujeitar a me implorar nada, mas ele juntou os dedos nos cabelos dela e a jogou em cima dos meus pés de novo.

- Pede perdão por machucar o braço dela, porra! AGORA! - mandou em berros coléricos, e ela fez.

- Perdão... pe-perdão... - degradada, olhou para cima em minha direção, o rosto, antes bonito, agora destruído.

Sacudi a cabeça num " sim" para o seu pedido tortuoso, esperando dar fim a sua punição humilhante. Minha garganta parecia entalada e lágrimas de compaixão deslizavam em meu rosto.

- Isso ai, deu sorte de não perder os cabelos! Agora levanta ai, piranha! - Ninja a içou novamente. Ela devia sentir muita dor.

Como descobriram que foi ela?

Pique Al-Qaeda Onde histórias criam vida. Descubra agora