Capítulo 85 - Amizade Crescente

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A caverna era escura e úmida, com apenas o som ocasional de gotas de água pingando das estalactites no teto, o chão estava coberto por uma fina camada de musgo, carregando o cheiro de terra molhada. O hipogrifo descansava ao fundo, suas penas acizentadas se misturando às sombras.
Ella, retornou a sua forma humana, e fitava Sirius com os olhos desconfiados.

Sirius, mesmo visivelmente abatido, ainda mantinha aquela chama característica em seus olhos, seu cabelo caía em mechas sujas e emaranhadas sobre os ombros, e a magreza extrema tornava seus ossos quase visíveis através da pele. Mas seu olhar confiante era um vestígio do homem que ele fora.

- Você... - murmurou Sirius, a voz rouca, como se tivesse esquecido como falar. - Mesmo como animaga, é... - ele hesitou, os olhos brilhando com um toque de admiração - linda.

Ella cruzou os braços, tentando não deixar transparecer a leve mudança em sua expressão.
- Vim te ajudar e a primeira coisa que você faz é tentar flertar? — respondeu ela com um tom afiado.

Sirius deu uma risada baixa, que se transformou em uma tosse seca.
- Velhos hábitos... - Ele deu de ombros, mas havia algo de doloroso no gesto - Não sou conhecido por minha sabedoria.

Ella manteve o olhar firme, sem ceder ao leve desconforto que sentia em vê-lo, a lembrança daquele beijo... Ela afastou esses pensamentos e ateou fogo aos gravetos que Sirius havia recolhido, a chama começou a aquecer a caverna fria.

- Dumbledore te mandou? - perguntou Sirius, sentando-se mais perto da fogueira. Ele estava tenso, e mesmo que tentasse esconder, havia um leve receio em seus olhos.

- Você estaria morto se fosse o contrário - respondeu Ella com a voz firme, conjurando uma poltrona acolchoada para se sentar, e conjurou comida: pão, carne assada, frutas frescas. Se exibindo um pouco para quebrar o gelo, o cheiro preencheu a caverna, e o estômago de Sirius roncou alto, traindo sua fome.

- Coma - ordenou ela, sem paciência para gentilezas.

Ele não precisou de mais incentivos, pegou o pão com as mãos trêmulas e começou a devorar com uma pressa que apenas aqueles que conhecem a fome verdadeira entendem. Enquanto comia, Ella o observava de canto de olho, sua expressão dura se suavizava a cada segundo.

- Ainda está com raiva de mim? - perguntou Sirius, com a boca meio cheia. Ele parecia genuinamente interessado na resposta, mas havia também um leve tom de ironia.

- Um pouco - respondeu Ella corando de leve.

- Faz sentido - murmurou Sirius. - Eu fui um imbecil. Você foi a única que me deu o benefício da dúvida mesmo quando tudo estava contra mim, e eu reagi como um animal. - Ele hesitou, os olhos se desviando para as chamas que dançavam à sua frente - me perdoe, não sou bom em confiar nas pessoas.

Ella cruzou as pernas e reclinou-se na poltrona, estudando-o.
- Não podemos mudar o passado - disse ela, sua voz mais suave. - Só podemos tentar não repetir os mesmos erros.

Sirius assentiu lentamente, absorvendo suas palavras. Ele afastou a comida por um momento, recostando-se contra a parede da caverna.
- Dumbledore confia muito em você - disse ele, mudando de assunto com um sorriso fraco. - Ele fala de você de uma maneira... incomum. Nunca o vi se referir a alguém com tanta lealdade.

- A lealdade é mútua - respondeu Ella, sem dar detalhes.

Sirius estremeceu ligeiramente quando um jato de ar frio entrou pela caverna, Ella conjurou um cobertor grosso e o entregou a ele.
- Aqui, pegue. - disse ela com um tom mandão.

Sirius hesitou por um momento, mas pegou o cobertor, surpreso pela gentileza, e envolveu-se nele.
- Obrigado - disse ele em um tom quase tímido, puxando o cobertor mais perto. A sensação de calor em sua pele parecia algo quase alienígena depois de tanto tempo em Azkaban.

Por alguns minutos, o silêncio reinou na caverna. As chamas crepitavam, o vento sussurrava lá fora, e o hipogrifo ressonava suavemente em um canto. Então, Sirius quebrou o silêncio, olhando para Ella com uma mistura de curiosidade e cautela.
- Vai continuar me tratando com frieza até quando?

Ella soltou um suspiro leve, um sorriso involuntário se formou em seus lábios.
- Até eu me ver livre de você - respondeu Ella, tentando manter o tom sério, mas havia um tom cômico disfarçado em suas palavras.

Sirius levantou uma sobrancelha, o sorriso brincando em seus lábios.
- Isso significa que ao menos você não me odeia a ponto de me querer morto.

- Não é tão simples assim - retrucou Ella se fingindo ameaçadora, era meio difícil manter a pose quando ele usava seu charme arrogante e, de certo modo, cativante.

- Sabe... - disse Sirius, pensativo -
Tem espaço para você aqui debaixo desse cobertor.

Ella lhe deu um olhar de desprezo.
- Calado, se quiser continuar vivo.

Ele riu deliciado com a irritação dela.
- Estou só brincando com você, mas agora falando sério, eu gostaria de agradecer a você por estar aqui, me dando uma segunda chance, mesmo depois de eu ter sido um imbecil.

Ella desviou o olhar, tentando ignorar a leve pontada de emoção que as palavras dele despertaram nela.
- Não é fácil para ninguém, senhor Black. Eu também já precisei de segundas chances, e só por isso consigo proporcionar o mesmo para outras pessoas. - respondeu ela, com um tom mais brando.

- Me chame de Sírius, senhor Black era meu pai, mas vamos, me conte sua história, então - pediu ele, inclinando-se para frente, genuinamente curioso. - Quero entender quem você é, e se é tão fantástica quanto Dumbledore pensa.

Ella o observou por um longo momento, considerando se devia ou não abrir-se para ele. Mas algo nos olhos de Sirius, aquele misto de dor e sinceridade, a fez ceder.
- Te conto minha história se você me contar a sua.

- O que quer saber? Me pergunte o que quiser, me peça o que for, até mais um beijo se quiser, eu aliás sonho com o último todos os dias...

Ella apontou a varinha transfigurando o braço dele num tentáculo, e ele olhou para a gosma escorrendo do tentáculo e deu uma gargalhada divertida, sua voz rouca ecoando pela caverna, Ella tentou mas não conseguiu esconder sua expressão cômica.

- Você sorriu de novo! Fica ainda mais linda quando sorri! - comentou ele ainda fascinado pelo seu braço tentáculo. - eu te conto o que quer saber se me devolver meu lindo braço. - negociou ele com uma piscadela.

Ella suspirou revirando os olhos, mas desfez o feitiço.

- Obrigado. - disse ele analisando seu braço fino e esquelético.
Ele então contou a ela sobre seu tempo de escola, como conheceu Tiago, como se tornaram animagos, contou sobre a escolha do fiel do segredo, e como Pettigrew conseguiu escapar o acusando como culpado, depois contou como fugiu de askaban, e sua relação com Harry, Ella ouviu tudo com uma expressão serena e atenta, que lembrava Sírius o jeito de Dumbledore lidar com as coisas.

- Entendo, finalmente as pelas se encaixam agora. Você sofreu bastante, é compreensível que tenha agido como um imbecil naquele dia - disse ela em provocação. Ele riu de leve, mas falou sério quando pediu.

- Agora me conte sobre você - disse ele genuinamente interessado.

Então, Ella começou a contar, não tudo, mas o suficiente para que ele visse que, apesar de toda a força e poder que demonstrava, ela também carregava seu próprio fardo, e que adquirira modos mais sábios, devido as suas muitas experiências anteriores.

Ao final, Sirius assentiu em silêncio, ela era diferente de qualquer outra bruxa que ele conhecera, e isso o fascinava.
- Você merece o respeito e prestígio que tem com Dumbledore, Ella - disse ele, após um longo silêncio. - Você passou tantos anos presa, sendo torturada, lidando com Voldemort e com o ex de sua mãe, sem descanso, sem entender quem realmente era, depois enfrentar as perdas que enfrentou... Você é extraordinária!

- E você não é tão patético quanto pensei. - respondeu ela dando risada.

- Isso é o mais próximo de um elogio que vou conseguir de você, não é?

Ella o encarou por um segundo antes de responder.
- Talvez.

Sirius riu, uma risada verdadeira, apesar de fraca. Ele não se lembrava da última vez que havia rido assim, e sentiu uma pontada de esperança. Talvez, só talvez, houvesse uma chance de que sua vida voltasse a ter algum sentido, mesmo que pequeno. E tudo começava ali, naquela caverna fria, com Ella ao seu lado.

A Princesa Mestiça e a Ordem da FênixOnde histórias criam vida. Descubra agora