(...)
Ela fitou a porta se fechando, ouviu a fechadura sendo trancada e encheu o peito, tentando tomar ar. O desespero cobriu suas feições, roubando-lhe o fôlego. Desespero por Ian e, sobretudo, por si mesma.
Anahi levantou, correndo até a janela. Ela afastou a cortina e se deparou, com um choque ainda maior, com Judith no encalço de Alfonso, parecendo encorajá-lo com suas palavras. Ela gesticulava, dando apoio a ele e aos seus planos, seja lá quais fossem. Os ouvidos de Anahi começaram a zunir.
Ela viu Alfonso entrar na carruagem que saiu em disparada. Judith ficou no meio do jardim de entrada, parecendo completamente satisfeita com o que causara. O pensamento de que algo terrível poderia acontecer - e provavelmente aconteceria - fez Anahi gemer, aflita. Queria ter tido tempo e meios de impedi-lo de sair; agora infelizmente não conseguiria alcançá-lo. Mas precisava confiar na capacidade de Ian de sair ileso daquilo. Quanto a ela... Bom, já não tinha tanta certeza assim, mas também não havia tempo para devanear.
– Dulce! – Anahi gritou tão alto que sua voz vacilou. Agarrou-se com a porta, batendo descontroladamente – Dulce, por favor, me tire daqui!
Ela gritou durante bons minutos. Por Dulce, Maite, Agnes, qualquer um. Sem resposta, porém. O quarto ficava no penúltimo andar, geralmente os empregados tinham horário marcado para estarem ali, ou subiam apenas quando eram solicitados; as habitações eram muito grandes e distantes umas das outras, seria difícil que alguém a escutasse por detrás daquela porta maciça de madeira mogno. Sua voz ficou falhada, ela cansou, perdeu o fôlego. Sentou-se na cama e segurou os próprios cabelos, cogitando realmente descer pela janela, sabia Deus como. Só precisava sair. Até que Agnes se aproximou, finalmente encontrando os gritos abafados da patroa. Ela estava atenta a tudo desde que Alfonso saíra. Pela forma que ele deixou a mansão, coisas ruins estavam por vir.
– Sra Herrera – ela chamou suavemente junto a porta – Está me ouvindo?
– Agnes! – Anahi correu – Graças a Deus! Abra essa porta! Preciso que me tire daqui.
A empregada sacudiu a maçaneta, frustrando-se logo depois.
– Está trancada e não tenho a chave.
– Deve haver uma chave reserva ou outra maneira. Faça qualquer coisa, dê um jeito. Preciso sair agora.
Mais alguns minutos de espera. Anahi era pura tensão. Então Agnes voltou com um capataz, que rompeu a fechadura e abriu a porta com um chute potente. A loira respirou aliviada, jurando que lhe devia a própria vida e que Alfonso nunca saberia daquilo. Além da criada, Dulce e Maite estavam do lado de fora, ambas com uma expressão angustiada, parecendo incapazes de dizer uma palavra sequer.
– Eu sinto muito – Dulce foi a primeira a tentar. Ela esticou a mão para acariciar o ombro de Anahi, mas o recolheu antes de tocá-la. Temia que a amiga explodisse em prantos a qualquer instante, como ela mesma parecia prestes a explodir, arrependida por tê-la algum dia incentivado.
Anahi balançou a cabeça, respirando profundamente. Uma vez do lado de fora, pareceu recobrar um pouco de sua sanidade mental.
– Tudo bem. Preciso que me ajudem com minhas coisas. Vou levar muito pouco. Não quero estar aqui quando ele voltar.
– Annie... – Maite tentou, insegura. Nunca havia presenciado algo parecido, não sabia como deveria agir.
– Não quero conversar. Não agora – ela dispensou com um aceno – Preciso que se movam.
Dulce assentiu. Algo a aliviava: pelo menos Anahi estava sendo prática, diferente da primeira vez em que entrara em colapso por Alfonso, incapaz de ao menos explicar o que havia acontecido. Ela se lembrava do estado em que Anahi chegou a sua casa na noite em que descobrira os planos do marido e lhe fechava a garganta pensar que isso poderia se repetir.
– Podemos ir para minha casa antes que você vá para a sua. Você sabe... Ter que lidar com Margareth... E tem Judith.
– Cuido dela depois. Ela vai se arrepender por isso – garantiu, fria.
– Certo. O que posso fazer? – Maite perguntou, solícita, finalmente despertando do seu transe de incredulidade – Não pretendo estar ao lado dele. Pelo menos não judicialmente.
Anahi lhe dirigiu um semisorriso conformado.
– Obrigada por isso, Mai, acho que vou precisar. Por enquanto simplesmente queria que fosse até a casinha do lago e recolhesse uma caixa de cartas e a capa de Arthur. Quero leva-los comigo.
– Claro – ela concordou, depressa, acatando o pedido. Anahi abraçou os próprios ombros, respirando fundo.
– Bom, a vida segue, não é? – perguntou, soando óbvia – Eu não tenho muito mais para perder. Acredito que uma guerra tenha se deflagrado. Vamos ver quem poderá descer mais baixo.
[...]
Enquanto isso...
Do outro lado da colina, Ian ouviu o trotado de cavalo e os pneus de carruagem arrastando-se na estrada até pararem. Ele se ergueu, sorrindo de expectativa. Agora que Anahi havia aceitado sua ajuda, não pretendia medir esforços para fazer o que ela precisava. Mas foi um choque ver que quem surgia no topo era Alfonso e não Anahi.
Ian deixou seu sorriso morrer, sendo lentamente substituído por uma expressão descrente, preocupada. Ele não tinha medo de estar frente a frente com Alfonso Herrera, de ter sido descoberto ou de ser ameaçado, mas lhe roubou o fôlego simplesmente pensar no que ele poderia ter feito a Anahi.
O rosto de Alfonso, naquele momento, era infinitamente mais macabro do que no dia em que se conheceram. Mesmo assim, Ian esperou, observando o outro se aproximar a passadas largas e pesadas, com os punhos torcidos pelo ódio. Ódio em sua forma mais bruta; correndo quente em suas veias.
– Que você nunca terá minhas terras já havia ficado claro. Mas quanto a minha mulher... – Alfonso disse, um sorriso sádico no rosto – Não sabe o que eu posso fazer para impedir que você se aproxime dela novamente.
Ian riu, abrindo os braços.
– Você está afastando-a e trazendo-a pra mim. Não foi necessariamente um esforço meu. Ela veio até mim por sua causa – disse, tranquilo. A cabeça de Alfonso já estava inundada de cenas que não queria imaginar. Ele sentiu o estômago se revirar ao pensar que estiveram se encontrando, que podiam ter se tocado... – Onde ela está?
A pergunta categórica fez Herrera cerrar ainda mais os punhos, o maxilar travado. Ian não tinha o menor direito de usar aquele tom possessivo. Ele se adiantou até o outro e o agarrou pelo colarinho da camisa com violência.
– Talvez ela não tenha lhe contado sobre o perigo que você corre ao fazer o que está fazendo.
Ian respirou com dificuldade, mas nem por isso se deteve, dizendo:
– Sei disso e assumo o risco.
Para Alfonso bastava. Ele acertou o rosto de Ian com um soco potente que o fez cambalear, tonto, batendo as costas contra a árvore logo atrás de si. Um fio de sangue imediatamente se projetou pelo nariz dele e Somerhalder o agarrou com uma mão, grunhindo. Provavelmente havia quebrado. Alfonso sorriu, totalmente satisfeito. Não por muito tempo, porém. Ian sacudiu a cabeça, recobrando o equilíbrio, tomou impulso e avançou sobre ele, devolvendo o golpe com força suficiente para fazer Alfonso cair.
Começou aí. A cena era estarrecedora. Os dois estavam aos socos. Ora no rosto, ora no abdômen, e os chutes poderiam acertar onde quer que fosse, era lucro. Somerhalder era bom com aquilo e agora parecia imbatível. Mas Alfonso estava determinado a sair dali apenas quando Ian estivesse inconsciente. Ou morto.

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Ruas de Outono
Fiksi Penggemar[CONCLUÍDA] *** Londres, 1874 Alfonso massageou a densa cascata de cabelos dourados que caía sobre o travesseiro ao seu lado. Anahi estava adormecida há algum tempo, imersa em um sono profundo, enroscada nos alvos lençóis de seda. Enquanto isso, el...