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Anahi segurou a saia de seu vestido e atravessou o salão. Quase corria, as pessoas se afastavam, davam-lhe passagem depressa. Então ela se jogou numa cadeira. Bufou.
– O que foi dessa vez? – Dulce perguntou, tocando seu ombro com uma mão.
– Homens! Eles não cansam!
– Anahi... – a ruiva suspirou – Calma. Tenha paciência. Você é uma Lady. E você é linda, todos aqui torcem o pescoço por você.
– Porque estão loucos para torcer meu corpo numa cama!
Dulce conteve uma risada ao observar o bico de frustração da amiga. A outra balançava a cabeça em negação, decepcionada com o comportamento do sexo oposto. Estava cansada daquilo.
Mas o fato de ser uma mulher romântica, não a tornava uma criatura santificada. Nem de longe Anahi era e nem sequer queria parecer uma. Sabia agir conforme seus desejos e também conforme o desejo dos demais. Sempre havia se sentido enojada com homens excessivamente tímidos, era verdade. Apreciava muito mais uma atitude inesperada, embora também acabasse por rejeitar os que eram abusados demais. Então ela lembrou daquele americano. Do quanto era forte, grande e atrevido. Estremeceu inteira. Não tinha certeza em qual classificação se encaixava Alfonso Herrera, por isso não conseguiu chegar a uma conclusão sobre ele.
Ela sabia o que um homem queria quando a abordava daquela maneira. Sobretudo quando se tratava de uma solteira recém-apresentada. Sonhava com seu casamento, mas não era deslumbrada, não aceitaria nada aquém do que merecia. Lady Anahi Portilla prezava por seus costumes, sua honra e seu nome, que é tudo que uma mulher tem e deve preservar. Já havia sido tentada a esquecê-los por algumas horas de prazer, mas não podia fazer isso. Afinal de contas, teria quantas horas desse tipo quisesse logo que desposasse.
Era nesse ponto que ela encontrava o seu problema. Tinha todos os atributos para ser a mais cobiçada daquela temporada. E o era, de fato. Não conseguia andar em paz entre as pessoas sem que olhares mal intencionados pousassem sobre si. Ela sabia que proporcionava doces sonhos a maioria dos rapazes, embora impossíveis. Mas, quando se tratava de casamento, a sua fila de pretendentes se esvaia em segundos.
Nenhum. Nenhum que se aventurasse a construir uma família com aquela que não lhe assegurava um bom dote e não vinha da melhor criação, segundo o povoado.
Sua mãe trabalhara como garçonete por noites a fio num dos poucos prostíbulos de Oxford, uma cidade que não oferecia grandes oportunidades a mulheres jovens e abandonadas cujos pais jaziam mortos por tuberculose. Aos demais não interessava que ela não vendesse seu corpo em troca de umas poucas moedas de prata, como diziam. Estar enfiada naquele local já era decadente por si só. Casas como aquela, seus assíduos frequentadores e também os que nelas trabalhavam, eram deliberadamente estigmatizados.
Com sua mãe não fora diferente. Sobretudo pelo fato de ela andar naturalmente pelas calçadas da cidade durante o dia, escondendo em seu rosto sorridente a mágoa que guardava por tal tratamento tão injusto. A vergonha e o asco estampavam o semblante dos transeuntes. Quando, não mais que de repente, surgira a gravidez, a notícia correra a cidade como um choque elétrico de horror.
Respirando fundo, Anahi passou a mão pelos cabelos, pondo de volta no lugar alguns fios, alongou os cílios com os polegares e passou a mão na longa saia de seu vestido. Um decote reto se abria discretamente sobre seu busto e o espartilho tornava sua silhueta irresistível aos olhos de quem a observava.
– Lord Jeffrey não para de olhar para você – anunciou Dulce em seu ouvido.
– Ele é pavoroso – a loira sussurrou, horrorizada.
– Talvez ele tente cortejá-la hoje.
– Pois eu quero que ele vá para o inferno!
– Meu Deus, Anahi, hoje você está impossível!!
Ela suspirou pesadamente, ajustando a máscara em seu rosto. De repente parecia tentador voltar para casa. Seus tios podiam se preocupar com sua volta, sendo já tão tarde. Ou pior, podiam pensar que algo maravilhoso tivesse acontecido, tal como ser cortejada. Detestava decepcioná-los.
– Culpa daquele estrangeiro... – praguejou.
– Estrangeiro? – Dulce arregalou os olhos, afobada – Não me diga... Não me diga! Aquele homem maravilhoso que ninguém sabe de onde surgiu?
– Dulce, ele tentou, deliberadamente, me...
– Com licença. Lady Saviñón – disse uma voz grave atrás da mesa das duas. Anahi se sobressaltou enquanto Dulce apenas sorriu. Não havia percebido a música que começara a tocar. Casais ao longo do salão uniam as mãos e aproximavam os corpos. Lord Smitt tomou a ruiva pela mão e a levou dali.
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Ruas de Outono
Fanfiction[CONCLUÍDA] *** Londres, 1874 Alfonso massageou a densa cascata de cabelos dourados que caía sobre o travesseiro ao seu lado. Anahi estava adormecida há algum tempo, imersa em um sono profundo, enroscada nos alvos lençóis de seda. Enquanto isso, el...