***
Cada segundo que passava, empurrava Anahi para a beira de um colapso nervoso. Já era quase meio dia e ela não estava aguentando sorrir para aqueles desconhecidos, apertar tantas mãos e distribuir tantos beijos. Depois disso, tinha de ficar em pé ao lado de Alfonso como uma coluna de concreto, ouvindo como aquela propriedade era maravilhosa e como todos estavam tão ansiosos para comprá-la. Mas aquilo era sua herança. E sua herança havia sido posta à venda pelo seu próprio marido, em exclusivo benefício próprio. Isso era torturante, era cruel. Anahi estava guardando tanto ressentimento e raiva que a próxima pessoa que sorrisse para ela, sem dúvidas, levaria um soco. Se tivesse sorte, essa pessoa seria Alfonso.
Mas não foi.
- Hey, Anahi!
Ela pulou no banco, sobressaltada. Jurava estar sozinha, isolada... E jurava ter realmente convencido Alfonso que não estava aguentando aquele sol escaldante em sua cabeça. Mas era de se esperar que ele colocasse um dos seus capachos para vigiá-la. Então Anahi olhou para o lado e Ian estava lá, sorrindo, fazendo uma moeda dançar pelos seus dedos com simples movimentos. E ela... Bem, estava desarmada.
- Deus, você está sempre me assustando! - soltou o ar com um riso aliviado, colocando a mão sobre o peito - Quem te contou o meu nome?
- Todos começaram a dizê-lo de orelha em orelha apontando sua chegada. A esposa do dono da festa não pode passar despercebida.
Então ele afastou uma aba do paletó e enfiou a mão, buscando algo. De lá, ele tirou outra rosa, jogando-a para Anahi que a agarrou antes que o vento levasse. Ela agradeceu e sorriu. Ian assentiu, satisfeito. A alegria enaltecia as feições daquela mulher, os olhos azuis, a boca delineada... Era bem melhor assim.
E com isso eles ficaram em silêncio. Anahi simplesmente fitava a moeda que ia e vinha entre os dedos de Ian. De um lado para o outro. Girando. Então ele fechou o objeto na palma da mão, roubando a atenção da loira. Ela ergueu os olhos para ele, encantada.
- Se você fizer alguma daquelas coisas de novo, vou prestar atenção e descobrir seu truque - ameaçou, divertida.
- Mesmo? - ele perguntou. Annie assentiu, orgulhosa - Certo. Proteja suas orelhas, mocinha.
Ele piscou e arremessou a moeda no ar. Anahi aguçou a visão, atenta. Então o pequeno objeto pousou de volta na mão de Ian. Ele fechou os dedos, balançou a mão em punho, assoprou, e abriu. E já não havia nada lá. Anahi arqueou as sobrancelhas, com um ar apatetado.
- Tem alguma coisa... Na sua... - Ian encenou, coçando a própria orelha com uma careta.
- O que... - ela tateou em si mesma, confusa. Havia algo estranho... Não podia ser! - Como?? Não é possível! - exclamou, fitando a moeda que tirara da orelha com incredulidade e espanto. Desconfiada, ela conferiu outra vez, para se certificar que nada estava errado, e Ian desatou a rir. Anahi mal percebeu mas, dois segundos depois, estava gargalhando também. Naturalmente. Havia esquecido de como isso era bom.
- Com quem você aprendeu tanta coisa?
- Meu avô - ele respondeu - Ele tinha um circo, viajava o tempo inteiro fazendo espetáculos. Era uma época divertida, mas infelizmente o tempo passa. Algumas coisas se perdem. Outras ficam - ele murmurou, pegando de volta a moeda que Anahi lhe oferecia. Ele a destacou com um sorriso, erguendo-a entre os dedos - Essa me dá sorte.
- E você sempre sai por aí apavorando as pessoas com suas mágicas?
Ele sacudiu a cabeça.
- Não. Isso é exclusivo para as que precisam.
Anahi corou e sorriu, porém sem humor algum, baixando os olhos.
- É evidente assim? - perguntou. Ian enfiou a mão nos bolsos e assentiu, com pesar. Anahi não disse mais nada. Não queria dizer. Não sentia necessidade. A companhia era agradável o suficiente.
- Seu marido é um homem difícil - ele ponderou, por fim.
- É - Anahi balbuciou simplesmente - Mas falávamos de você e eu diria que esse show não combina com um advogado.
- Ser advogado não combina comigo. Estou estudando para ser médico - Ian explicou - Isso combina com um médico?
- Acho que sim - ela riu - Alegria cura muita coisa.
Novamente, mais alguns minutos sem dizer nenhuma palavra. Anahi fechou os olhos e inclinou a cabeça, deixando o vento bagunçar seus cabelos e fazê-la se sentir em paz. Por um instante ela se permitiu fugir dali sem sequer sair do lugar. Até que um burburinho animado chegou a seus ouvidos, despertando-a. Certamente o almoço começava a ser servido e os convidados iriam até a mansão conhecê-la também. Isso implicava que Anahi deveria estar lá ou Alfonso derrubaria a cidade para encontrá-la. E encontrá-la com Ian seria estarrecedor.
- Bom, eu preciso voltar - ela anunciou, erguendo-se - Vou escondê-la dessa vez - disse com um sorriso, mostrando a rosa - Obrigada, Ian.
Ele acenou, solícito, vendo-a se afastar. Era uma pena que não pudesse fazê-la ficar.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Ruas de Outono
Fanfiction[CONCLUÍDA] *** Londres, 1874 Alfonso massageou a densa cascata de cabelos dourados que caía sobre o travesseiro ao seu lado. Anahi estava adormecida há algum tempo, imersa em um sono profundo, enroscada nos alvos lençóis de seda. Enquanto isso, el...