(...)
A expressão de Alfonso mudou enquanto ele a encarava. Anahi esperou que ele se revoltasse contra seu pedido e, se isso acontecesse, iria confrontá-lo. Havia se preparado todos os dias de seu repouso para esse momento e titubear agora não era uma opção.
Fora fácil encontrar distração quando estava acompanhada, no entanto ao ficar sozinha, quando já não tinha com o que se entreter, sua mente fugia de seu controle, trazendo sentimentos que a puxavam fundo para um poço de tristeza e medo e faziam seu peito doer. Mas Anahi não se deu o direito de fraquejar. Decidiu usar isso a seu favor. Retomou o sentimento de raiva que aprendeu a nutrir por Alfonso, gravou as sensações e ensaiou repetidamente, dia após dia, o que dizer.
Ela o viu baixar os olhos, parecendo pensar em uma resposta.
– Você me ouviu? – reiterou, fazendo-o voltar a olhá-la.
– Nós não tivemos tempo para conversar sobre isso – ele tentou, totalmente resistente ao que havia escutado – Estive esperando que você se recuperasse, que as coisas se assentassem.
– Quer que eu agradeça por isso? – ela interrompeu, sarcástica. Alfonso negou.
– Nós ainda temos que conversar. Apenas acho que você está se precipitando.
Anahi o encarou com tranquilidade, ao mesmo tempo que parecia severa como nunca antes. Sentiu ainda mais raiva da postura defensiva que ele tinha, afinal era uma mentira, uma reação falsa a um momento de puro desespero. Ele não era humano assim. E mesmo ao supor que poderia ser verdade, era simplesmente tarde demais para agir dessa forma, para demonstrar arrependimento com tanta naturalidade, como se o remorso pudesse mudar o que aconteceu a essa altura do jogo. Isso a impulsionou a disparar com rispidez:
– Você me enganou, me roubou, humilhou e subjugou, me afastou de Margot, magoou Maite, atirou em Ian e fez com que eu perdesse meu filho. Não estou me precipitando.
– Era meu filho também – Alfonso murmurou, derrotado. Sentia-se como se afundasse em uma areia movediça sufocante, com todas as suas expectativas sendo assoladas. Todas as tentativas de se livrar daquilo pareciam inúteis. A sensação de ter sido totalmente engolido por ela veio quando Anahi perguntou:
– E como você se sente agora que o matou?
Ele fechou os olhos, fraco, balançando a cabeça em negação, recusando-se a aceitar a acusação. Não havia sido assim... Mas quanto mais suave era o tom de Anahi, mais mordazes pareciam as palavras, mais feridas se abriam nele. Alfonso apoiou os cotovelos nos joelhos e cobriu o rosto com as mãos, ofegando.
– Por que veio naquela noite? – ela inquiriu antes mesmo que ele assimilasse o que havia escutado antes. Era como se houvesse caído por um golpe e recebesse outro antes de se erguer. A sua cabeça era pura confusão e angústia. Alfonso voltou a olhá-la como se implorasse para que ela baixasse a guarda por um mísero instante.
– Porque você precisava de mim.
– Eu precisei de você muitas vezes antes. O que mudou? – perguntou, fixando os olhos nos do marido. O rosto dele tensionou. Anahi ouviu o silêncio ecoar e voltou a perguntar: – O que foi que mudou dessa vez, Alfonso?
Ele sabia a resposta e sabia também da complexidade dela. Sentiu o ímpeto de dizer que foi até ela naquela noite porque queria que ela o perdoasse, porque estava arrependido e porque tinha medo de um futuro sem ela. Isso era o que havia mudado, e dizer tudo isso estava dentro do seu plano. Mas estava totalmente fora dele encontrar uma Anahi tão dura e ressentida. Alfonso sabia como era terrível expressar sentimento e ser correspondido com desprezo. Não sabia como reagiria quando ela o rejeitasse, já que acolhê-lo, definitivamente, parecia fora de cogitação. Portanto não disse nada, a insegurança o paralisou, deixando-o mudo.

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Ruas de Outono
Fanfiction[CONCLUÍDA] *** Londres, 1874 Alfonso massageou a densa cascata de cabelos dourados que caía sobre o travesseiro ao seu lado. Anahi estava adormecida há algum tempo, imersa em um sono profundo, enroscada nos alvos lençóis de seda. Enquanto isso, el...