Capítulo 076

528 53 21
                                    

***

O quarto estava excessivamente iluminado quando Anahi abriu os olhos, antes acostumados a escuridão, por isso ela demorou a identificar o vulto que surgiu acima do seu rosto. Ela piscou, sonolenta. Uma mão tocou sua bochecha com carinho e uma voz distante chamou seu nome, mas Anahi se sentia zonza demais para responder ou mesmo identificá-la.

– Annie? – repetiram, afagando sua testa – Sou eu, tia Margie.

Margareth.

Como...?

Dessa vez, os olhos de Anahi abriram-se de um susto. Ela quase não sentia dor física, mas mal conseguia se mover. Se sentia anestesiada, parecia haver perdido as forças. Ao tentar erguer o tronco para se sentar, alguém a deteve pelos ombros e este alguém não foi sua tia. Um homem, com mais idade e completamente desconhecido, estava ao seu lado, analisando-a com uma expressão preocupada. Anahi franziu o cenho, sentindo-se totalmente a parte daquela realidade. Então parecendo compreender a confusão da sobrinha, Margareth sentou-se ao seu lado.

– Querida, estamos em casa. Dulce e Maite estão aqui também, esperando fora. Este é o Dr. Billard, que nos ajudou quando você... – ela hesitou, observando a loira olhá-la de maneira aflita – Quando começou a sangrar e desmaiou.

Anahi começou a retomar a memória e o pavor voltou a encher sua cabeça. Ela olhou imediatamente para as próprias pernas, procurando, mas estavam cobertas por um lençol impecavelmente branco. Ergueu as mãos e as olhou também, inspecionando tantos detalhes quanto podia. Lembrava-se delas banhadas em sangue - seu próprio sangue -, era nítido... Mas agora estavam limpas.

– Foi um pesadelo? – perguntou com a voz fraca.

O médico baixou os olhos.

– Sinto muito, Sra Herrera – falou, tocando-a sobre um ombro – Foi um susto muito grande, mas fique tranquila. Precisamos que descanse, ficará bem.

Anahi não podia entender de que maneira ficaria bem. Não sabia como ocuparia sua cabeça em mais uma tentativa de vencer um sentimento tão violentamente doloroso. Estava despedaçada de tal forma que não conseguia reagir à altura daquela dor, nem para expressá-la e menos ainda para detê-la.

Um filho... Ela sabia que não estava preparada para tê-lo, mas perdê-lo era muito mais cruel; era uma dor simplesmente imbatível, irremediável.

– Acha que podemos conversar um pouco? – Dr. Billard perguntou.

– Posso tentar – ela consentiu, quieta. Ele puxou a poltrona para mais perto, atento.

– Sabia da gravidez? – Anahi negou abanando a cabeça, os olhos distantes fitando o chão – Notou mudanças em seu corpo?

– Não que houvesse me chamado a atenção. Não consigo lembrar agora.

– Sua regra atrasou? – ele inquiriu e ela deu de ombros, indiferente – Tinha algum controle sobre isso?

– Não. Não sabia como fazer – ela admitiu, constrangida. Normalmente, as mães preparavam as filhas para o casamento, durante o cortejo, explicando-lhe todas as trivialidades da vida a dois, incluindo maneiras de evitar que engravidasse se ainda não estivesse pronta. Com Anahi fora diferente. Não tivera uma mãe que lhe explicasse, nem cortejo para que pudesse se preparar. Era ingênua demais, não apenas nesse aspecto.

Além de tudo, achava completamente injusto que aquilo fosse responsabilidade apenas sua, principalmente se nunca havia tomado conhecimento do que precisava ou não fazer. Simplesmente não sabia. Mas agora era tarde demais.

– Enjôos, vômitos, aversões alimentares repentinas...? – ele continuou, determinado. Anahi começou a se sentir sufocada.

– Sim, mas...

Ruas de OutonoOnde histórias criam vida. Descubra agora