Capítulo 2

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Por causa da fisioterapia, tive que passar mais um mês naquele hospital. A Mônica me ajudou em todo o processo e eu estava muito grata a ela. Graças a ela, eu tinha um canto para ficar quando saísse dali. Nesse mês que passou, eu não conseguia me lembrar de nada do que tinha acontecido e isso me frustrava quase o tempo todo. Fora as dores de cabeça que eu sentia, mas que iriam sumir com o tempo, segundo o Dr. Paulo.

Falando nele, depois desse tempo, ele achou que eu poderia estar flertando com ele, porque todas as vezes eu o olhava intensamente nos olhos. O formato do rosto, o cabelo... Não vou dizer que não me atraiu, mas Deus me livre me envolver com alguém agora quando eu não sei nem quem sou de verdade. Pelo menos, ele me demonstrou ser compreensivo e disse que ia me ajudar no que fosse preciso para que eu pudesse recuperar a memória (depois que esclareci que estava longe de estar preparada para estar em algum relacionamento num futuro próximo) e ainda, que se eu quisesse, podia trabalhar no hospital, no andar onde era voltado para uma "creche", uma vez que os funcionários que não tinham com quem deixar suas crianças mais novas, as deixavam lá. Eu adorava crianças, então não seria tão ruim. Um trabalho me ajudaria muito financeiramente. Não poderia depender da Mônica para me sustentar.

Quando cheguei na casa dela, percebi ser uma casa simples. Não que isso importasse para mim. O que realmente valia era o que as pessoas eram por dentro e o que elas guardavam no coração e não o que elas tinham. A casa tinha um ar de aconchego, com um cheiro de lavanda por toda parte. Era como se fosse casa. Seria a minha casa a partir de então. – Aquí será seu quarto, Helena. Pode colocar suas coisas aquí nesse armário. – Ela disse e eu dei uma risada seca, mas agradeci a gentileza.

Coisas. Que coisas? Roupas velhas e rasgadas de quando eu cheguei no hospital. Alguns objetos que ela mesma me presenteou enquanto eu estava dormindo. E um colar que eu descobri, por acaso, mexendo nessa roupa rasgada. Um colar que tinha duas bonequinhas. Uma maior e uma menor. Eu não sabia o que era ou se era meu mesmo. Mas bem, se estava nas minhas coisas, então era meu. Certo?

– Eu juro, nem que passe a minha vida toda, mas eu juro que vou fazer o que for preciso para recobrar a memória e voltar para casa. – Sussurrei baixinho e passei o dedo com cuidado naquele colar. Era como se eu tivesse criando forças para seguir. Beijei as duas bonequinhas e enxuguei uma lágrima teimosa que caiu.

– Eu vou te ajudar. – Mônica falou baixinho da porta. Me virei e dei um sorriso aguado para ela.

– Eu não sei o que essa segunda boneca significa, Mônica. E se for uma criança? Uma filha? Eu tenho uma filha? – Sentei na cama de solteiro que tinha no quarto.

– Helena... Não se martirize assim. Não agora. Pode ser uma filha, pode ser uma irmã. Pode até ser você com sua mãe. – Ela passou a mão pelo meu cabelo e eu não consegui segurar outra lágrima que escapou.

– Por isso mesmo que eu preciso lutar, preciso recuperar minha memória, Mônica. Tem pessoas que devem estar sofrendo até hoje com o meu desaparecimento. A minha morte, mais provável. – Olhei para ela triste.

– Vamos fazer o seguinte: tome um banho, troque de roupa. Eu comprei algumas peças de roupas para você. – Ela tentou me animar.

– Não precisava. – Respondi agradecida.

– É claro que precisava! Você ia vestir o que? – Ela disse brava cruzando os braços.

– Eu vou arrumar um trabalho e te pago tudo o que você gastou comigo. – Era uma promessa.

– Bobagem, minha menina. Eu não estou te cobrando. Enfim, como eu ia dizendo, tome um banho, que eu vou preparar uma comida para gente e depois você descansa, tudo bem? Amanhã a gente pensa nisso com mais calma. – Ela me olhou e eu balancei a cabeça concordando. Não era como se eu pudesse negar qualquer coisa a Mônica. Essa senhora sabia como conseguir as coisas. Ela saiu do quarto indo em direção à cozinha e eu fui para o banheiro que tinha no pequeno corredor, do outro lado.

Os primeiros dias foram para me adaptar a essa vida nova. Andar um pouco pela cidade para eu conhecê-la e poder ir e vir sozinha. Mônica me disse que, em no máximo uma semana, eu já poderia começar a trabalhar no hospital.

– O Dr. Paulo já conseguiu ajeitar tudo para você começar a trabalhar lá, minha menina. – Mônica disse enquanto eu a ajudava a por a mesa do jantar.

– Graças a Deus. Não vejo a hora de começar a me mexer. – Sorri.

– Olha, queria dizer não, mas ele tá dando maior ajuda para você. – Olhei para ela e ela estava com um sorrisinho de canto.

– Mônica! – Um rubor passou pela minha bochecha. – Já falei que ele é só amigo. Para de querer me empurrar para ele. Não vai rolar nada entre a gente. – Exasperei.

– Tudo bem, minha menina, não está mais aquí quem falou. – Ela levantou os braços em sinal de rendição. – Mas você é jovem e tem muito o que viver. Não desperdice sua felicidade. – Olhei pra ela incrédula.

– Eu mal o conheço e você já está dizendo que minha felicidade está com ele. Inacreditável. – Balancei a cabeça negativamente.

– Só estou dizendo... – A interrompi.

– Não diga! O Paulo é meu amigo e assim vai ser. – Respondi séria e ela se calou.

– Você tem certeza que dá conta de um monte de criança? – Mônica disse depois de um momento em silêncio mudando de assunto.

– Eu amo crianças! Vou cuidar delas como se fossem minhas. – Sorri para ela.

Certo. Quando eu disse que gostava de criança, eu estava falando a verdade. Mas fiquei pasma quando vi tanta criança junta ao mesmo tempo. Elas tinham na faixa de 0-3 anos e bem, todas gordinhas e fofinhas que davam vontade de apertar. Assim que cheguei, uma menininha com cabelo loirinho e alguns cachos e olhos verdes agarrou imediatamente as minhas pernas me abraçando e sorriu para mim. Eu não sei o que deu em mim, mas tive uma sensação esmagadora no meu peito de abraçar aquela menina, então a coloquei meu colo e agarrei-a como se ela pudesse me passar forças. E parecia que estava.

– Tia, por que você está chorando? – A menininha me perguntou e só então percebi que minhas lágrimas raspavam minhas bochechas.

– Nada meu amor, são lágrimas de alegria. Qual é o seu nome? – Sorri para ela.

– Maria Clara. E o seu? – Ela perguntou limpando minhas bochechas.

– Eu me chamo Helena. Você é linda, sabia? – Sorri pelo seu gesto carinhoso e seus grandes olhos verdes me olhavam atentos.

– Você também é muito bonita, tia. E seu nome combina com você. – Eu já estava me acostumando a ser chamada assim. – E você é loira como eu. – Ela tocou o meu cabelo. Dei um beijo na bochecha dela e segui caminhando para onde estavam as outras meninas responsáveis por todos esses pinguinhos.

– Que tal você me apresentar todos os seus amiguinhos? – Perguntei a menina e ela foi me mostrando o lugar alegremente.

A volta de TeresaOnde histórias criam vida. Descubra agora